sábado, 15 de novembro de 2008

EMULANDO VENTANIA


Há 3 anos, eu namorei uma garota 9 anos mais jovem que eu. Ela hoje é noviça numa congregação de fanáticos religiosos da seita neofascista que atende pelo nome de Canção Nova, mas, à época, ela pretendia ser ‘hippie’. Quando nos conhecemos, ela me deu uma carta perfumada e uma fita k-7 de um artista que eu não conhecia, um viajante movido a cogumelos psicodélicos de nome Ventania. Lembro que achei o som ingênuo, mas curti. Nunca mais tinha ouvido. Hoje descobri, por acidente, o álbum “Só Para Loucos” (2001) em meu computador. Foi curioso entrar em contato com estas canções tão importantes em meu passado...

Lembro que, numa das conversas proveitosas de Gomorra, meus amigos falaram que este tal de Ventania era muito popular nos encontros de estudantes ao longo do Brasil. Pelo que eu entendi, quem gostava muito dele era Anne Kelly Rodrigues, a jovem baiana que dilacerou a minha psiquê (risos). Fiquei ouvindo às tais canções do Ventania, depois de ter visto um longa-metragem de animação baseado nos personagens ‘hippies’ fracassados do cartunista Angeli, e, puxa, que sensação estranha, que desamparo, que sentimento de perda...

Liguei a televisão apenas para acompanhar a minha refeição (cuscuz com feijão, ovo e salada de cenoura) e deparei-me com um seriado brasileiro, exibido na HBO: “Alice”, roteirizado e dirigido pelo genial cineasta Karim Aïnouz. Gostei. É um retrato deveras apologético do universo ‘yuppie’ (geração que substituiu imediata e drasticamente o idealismo hiponga), mas me convenceu, me tocou, me fez sentir melancolia... Puxa, até músicas de Johann Sebastian Bach eles utilizaram durante uma luta livre. A mixórdia estilística dos ‘yuppies’ não tem limites! Voltei a pensar no Ventania, no quanto ele me parece ultrapassado pelo tempo (no bom sentido da palavra), no quanto ele se beneficia do anacronismo em suas canções auto-centradas... Parece legal ser assim, mas eu não consigo!

Quando saí de Gomorra, nesta noite de sexta-feira, fiquei pensando em quanto eu pareço “traidor de um certo movimento” ao ser tão burocrata, ao crer na noção de pontualidade, ao conservar um materialismo cultural, ao agir motivado pela carência e pela dependência de pessoas segundo a segundo... Ás vezes, penso que Rafael Torres sente raiva de mim por causa disso. Mas é um problema geracional: fui criado assim, me fizeram acreditar. “É mais fácil desintegrar um átomo que os preconceitos”, já dizia o Albert Einstein. Passa da meia-noite. Continuo a ouvir o Ventania, sentindo um pingo largo de tristeza:

“Louco, você lembra aquele trampo que eu usava pendurado no pescoço, dizendo que era o símbolo da paz? Você sabe quem me deu? Foi o ‘hippie’ que morreu. (...) Estou aqui sentado, na beira da estrada, fazendo uma fogueirinha, enrolando uma palhinha, escrevendo estas linhas, vendo o caminhão passar”...

Wesley PC>

4 comentários:

Unknown disse...

Nunca ouvi Ventania, só os caras cantando, e detestei, achei que ele faz um tremendo esforço para ser louco, descolado, algo do tipo, que eu não gosto quando algum dos meus amigos fazem.

Destesto quando os caras cantam:"isso é só para loucos, caretas não!" Aí eu fico fora da festa. Como diz Caetano em sua música, "Eu também sei ser careta." Gosta mais dessa.

Fábio Barros disse...

Concordo plena e veementemente com Leno. Vi esse feio uma vez no Jô e também achei mui sem graça.

Gomorra disse...

Não, eu não gosto do Ventania...
Não, eu não vou defendê-lo...

Sim, detestei o artifício recorrente de acusar os "caretas", de falar mal desses em várias músicas, como se fosse um pecado...

Nunca o vi no Jô, não sei quem é o tal Ovelha com quem ele parece, mas "Símbolo da paz" é uma canção fabulosa, insisto, que mostra muito bem o que é o FRACASSO que comanda o movimento 'hippie' atual... Involuntariamente, o tal ventania foi coerente... Por isso, eu ainda ecsutarei mais algumas vezes o que descobri aqui no computador (risos)

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Gomorra disse...

Ah, e eu concordo com o Charlisson também...

Mas tenho memórias afetivas... estas é que são terríveis...

E viva o caretismo! (risos)

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