sábado, 12 de março de 2011

EU JÁ TIVE OPORTUNIDADE DE VIR AQUI DIZER O QUANTO GUY DE MAUPASSANT (1850-1893) É GENIAL?!

Pelo sim, pelo não, digo-o agora: li finalmente “O Horla” (1887) nesta última semana e ainda estou impressionado com o brilhantismo deste conto, tanto no que diz respeito ao conteúdo da escrita (o progressivo estado persecutório de loucura de um homem que se sente perseguido por uma entidade invisível e que se alimenta de leite) quanto na forma (crítica e minuciosa em cada palavra inserida no diário do protagonista). Mas nada se compara ao trecho abaixo:

14 de Julho: Festa da República. Passeei pelas ruas, entusiasmado com os fogos e as bandeiras, como uma criança. Ainda assim, é tolice ficar alegre em data marcada, obedecendo a um decreto do governo. O populacho é um imbecil rebanho de carneiros, de uma paciência estúpida ou com uma revolta feroz. Digam-lhe: ‘divirtam-se’, e o povo se diverte. Digam-lhe: ‘vão lutar com o vizinho’, e o povo vai e luta. Digam-lhe: ‘votem pelo imperador’, e o povo vota pelo imperador. Então digam-lhe: ‘votem pela República’, e o povo vota pela República. Os que dirigem o povo também são estúpidos, só que, ao invés de obedecer aos homens, obedecem aos princípios, que só podem ser estúpidos, estéreis e falsos, pela simples razão de serem princípios, isto é, idéias consideradas como certas e imutáveis, neste mundo, onde não se tem certeza de nada, já que a luz é uma ilusão, já que o barulho é uma ilusão.”

Salvo pelo comentário opositivo aos princípios enquanto princípios (algo que sou voluntariamente obrigado a discordar por ser religioso, logo seguidor de princípios por excelência!), fui pessoalmente tocado por cada linha deste conto magnífico e fantástico como se estivesse a ler meu próprio diário de angústias e inadequação mundana. Quando comecei a lê-lo, era carnaval. Nada mais conveniente. Entretanto, já conhecia a essência sinóptica deste conto desde bem antes, visto que ele foi a base enredística para o excelente curta-metragem sergipano “Diário de um Território Ocupado” (1993), do meu querido Caio Amado, que sucumbiu a um estado de desordem psicológica mui similar à do personagem principal do conto. Pena.

Um parêntese interpretativo adicional: antes, durante e depois de ler este conto, fui afligido por uma violenta vontade de ir à praia, mas especificamente, à Atalaia Nova, na zona fronteiriça com o município de Barra dos Coqueiros, uma vontade tão intensa que até parece regida por forças sobrenaturais. Tão intensa, aliás, que, apesar de me assustar, não mais resistirei: acordarei cedo amanhã, com gana de realizar esta vontade e, quem sabe, encontrar ‘in loco’ as belezas naturais vislumbradas nesta fotografia tão simples e bonita, que corresponde nada mais, nada menos a um teste de câmera de uma colega de trabalho, que estava a inaugurar o aparelho recém-comprado. Ela estava prestes a descartar esta imagem praiana randômica, quando eu a resgatei da lixeira do seu computador e a tomei como pessoal, como minha, como metonímia de um anseio a ser prontamente realizado. E, como diria o atormentado personagem-narrador do genial Guy de Maupassant, no dia 12 de julho de seu diário, “a solidão é perigosa para as mentes ativas. Precisamos de homens que saibam pensar e conversar. Quando ficamos sozinhos por muito tempo, povoamos o espaço com fantasmas. (...) Como nosso cérebro é fraco, como se assusta à toa e é induzido a erro por um pequeno fato incompreensível! Em vez de dizer apenas: ‘não entendo porque não conheço a causa’, imaginamos imediatamente mistérios terríveis e forças sobrenaturais”. E continuo a imaginar, mesmo assim...

Wesley PC>

sexta-feira, 11 de março de 2011

“ESTE FILME É RESPEITOSAMENTE DEDICADO À MEMÓRIA DO SR. ELIAS ELIAS HOWE, QUE, EM 1846, INVENTOU A MÁQUINA DE COSTURAR”

Apesar de ter sorrido com esta ótima piada de créditos finais e de ter gostado de ouvir “Ticket to Ride” com imagens sessentistas, “Socorro!” (1965, de Richard Lester) me causou um fastio atroz: quanto mais o filme demonstrava que ainda demorava em chegar ao seu desfecho, mais eu me agoniava com aquele roteiro pretensamente nonsense, mas idiotizado sob muitos aspectos. Não sou o maior fã de The Beatles, mas aprecio sobremaneira suas invencionices musicais engendradas pelo uso de substâncias lisérgicas. No plano cinematográfico, havia gostado dos outros filmes protagonizados pelo quarteto, mas este tal de “Socorro!” me deu nos nervos de tão enfadonho. A montagem é tão tresloucada, a direção é tão boa, o ponto de partida é tão divertido, mas... Em minha opinião, o filme não deu certo! Saí tão enfastiado da sessão que precisei dormir e ter pesadelos para voltar ao normal. Mas continuo enfastiado: dormirei sem assistir a nenhum outro filme por causa de John Lennon e Paul McCartney. Ringo Starr e George Harrison saem dessa lista de culpabilidade por dois motivos: o primeiro, porque está realmente engraçado no filme; e o segundo, porque é meu ‘beatle’ preferido, aquele com quem mais me identifico, cujas composições me parecem mais pessoais e originais, no que diz respeito à sua apreciação das sonoridades orientais, não sendo difícil pressupor que ele deva ter contribuído significativamente para a escritura do argumento deste filme. Aliás, devo confessar que sorri também na seqüência de créditos iniciais, em que os fanáticos religiosos sacrificiais que desejam o anel de rubi que ele carrega num dos dedos atiram dardos contra a tela está sendo projetada a imagem do grupo executando justamente a canção “Help!”. Enquanto isso, um sacerdote gritava: “chocante! Chocante!” (risos). E este foi, sem dúvida, um dos melhores momentos do filme...

Wesley PC>

POSSO TER PERDIDO O COMEÇO, MAS O FINAL TODO MUNDO SABE...

A maioria dos livros que li nos últimos meses reserva pelo menos um de seus capítulos a uma morte por amor (ou, melhor dizendo, morte por desgosto decorrente da falta de amor). Por mais que o tema central do livro em pauta fuja da pieguice tão cara às minhas escolhas românticas, chega o momento em que algum dos personagens sucumbe à tristeza desalmada que está relacionada à solidão. Com os filmes que vejo ultimamente, a situação não é diferente: personagens morrem de desolação afetiva o tempo inteira... Será que na vida real também é assim?!

Não lembro exatamente o contexto em que ouvi alguém comentar isto, mas perguntaram a um diretor de teatro local quais eram seus temas favoritos durante a escolha por uma peça a ser encenada e ele respondeu que não havia muita diversidade quando se admite que, no mundo, existem apenas dois temas entrelaçados: o encontro e o desencontro. E, de fato, não é difícil constatar que o supra-sumo dos livros, filmes e canções versam justamente sobre isso: a necessidade e/ou (im)possibilidade do reencontro.

Nesta tarde ensolarada de sexta-feira, fiquei com vontade de tirar folga no trabalho. Vim para casa e, ao chegar, percebi que um clássico filme de George Cukor, protagonizado pela diva Greta Garbo, havia acabado de começar a ser exibido na TV. Despi-me rapidamente e sentei-me numa cadeira plástica para assisti-lo. Minha mãe despertou e, ao reconhecer as imagens do filme, ficou logo empolgada para assisti-lo ao meu lado. Tratava-se de “A Dama das Camélias” (1936), um dos filmes mais marcantes de sua juventude, conforme ela já havia comentado comigo em muitas oportunidades. Fiquei contente em poder reviver aqueles momentos românticos ao lado dela.

A trama do filme, baseada num romance do francês Alexandre Dumas Filho, não poderia ser mais banal para os padrões hodiernos: uma cortesã tuberculosa apaixona-se pelo herdeiro de uma rica família. Ele está decidido a abdicar de sua fortuna por ela e ela não hesitaria em sacrificar seus vícios neo-burgueses para permanecer ao lado dele. Experimentam um alegre verão juntos, até que ela recebe a visita do pai dele, que exige que a mesma desista de seu amor, que ela não é digna dele, que ele jamais admitirá que seu filho se sacrifique por alguém como ela. O amor dela não é egoísta e ela consente em fingir que não mais o ama, causando ciúmes nele ao ser vista na companhia de um rival rico. O final do filme não é difícil de imaginar. E como é lindo, triste e bem-vindo mesmo assim!

Ao final da sessão, pedi que minha mãe abrisse uma lata de leite condensado. Disse-lhe que estava meio triste e ela brincou comigo: “o que foi? Estás ainda pensando na mulher das flores?”. Não é que eu (não) estivesse, mas um diálogo em particular me marcou: quando insistia em provar que seu amor pelo herdeiro era verdadeiro, a cortesã escuta da boca de seu potencial sogro que ela está sendo vitimada pela “melancolia da felicidade”, que corresponderia àquele paroxismo da alegria em que percebemos que os bons dias não vão durar, que o langor pode regressar a qualquer momento, que a morte é uma certeza reservada a todos os indivíduos, em especial àqueles que padecem de umas moléstia respiratória recorrente. E foi neste momento que eu lembrei que tenho sinusite, mas não disponho de alguém nos meus braços para lamentar. Menos mal? Quem viver, verá...

Wesley PC>

quinta-feira, 10 de março de 2011

“MY FIRST LOVE BROKE MY HEART FOR THE FIRST TIME” OU ERA SÓ O QUE ME FALTAVA...

No último dia 01 de março, o astro ‘pop’ Justin Bieber completou 17 anos de idade. A fim de comemorar esta data histórica, uma revista estadunidense dedicou 7 páginas de sua edição mensal a uma entrevista com ele, que responde o que pensa sobre questões polêmicas como sexo antes do casamento ou aborto. Virou notícia, um tipo de notícia que, apesar de obedecer a supostas exigências de noticiabilidade (o que há de interesse público nos pronunciamentos sub-responsivos deste guri?!), não me interessa profissionalmente. Dei de ombros e fui tomar banho. Aí liguei o rádio e o ator adolescente Chord Overstreet, de “Glee” (vide foto), estava cantando justamente “Baby”, ladainha chorosa do pseudo-cantor em pauta. Não tinha a obrigação de ouvir... Não tinha!

Talvez eu não devesse ter escrito o parágrafo acima. Faz parte de meu acordo tácito de assuntos prioritários desdenhar estas febres midiáticas emburrecedoras, mas fiquei tão chocado com os disparates proferidos pela jornalista, que não pude me esquivar aqui de anunciar que Justin Bieber só fará sexo depois que estiver muito apaixonado por alguém e que ele considera a interrupção voluntária de uma gravidez um assassinato. É o cúmulo! Enquanto isso, eu perguntava a mim mesmo qual romance do Jorge Amado tinha interesse em ler... E, tudo bem, admito: não é que eu esteja sem assunto, mas algo neste guri me perturba. E eu juro que não tem a ver com o que ele canta (ou pensa que canta): até hoje, por sorte, nunca ouvi “Baby” na íntegra – pelo menos, não na ridícula versão interpretada por ele...

Wesley PC>

DIRIGIDO PELO MESMO AUTOR DE “OH! REBUCETEIO” (1984)...

A atuação metalingüística do diretor Cláudio Cunha no ótimo filme citado no título desta postagem leva-nos a imaginá-lo como uma personalidade comumente debochada, que realmente se masturbava ao nosso lado naquela orgia teatral que faz a graça de seu canônico e derradeiro filme qualitativo. Qual não foi a minha surpresa, portanto, ao assistir ao pouco conhecido “Amada Amante” (1978) na noite de ontem e descobrir que Cláudio Cunha era muito inteligente, sim, antes de “Oh! Rebuceteio”. Ao contrário do desbunde marcante deste último filme, porém, “Amada Amante” é conduzido de forma dramática e mui verossímil, focando-se na estória de uma família interiorana e mui conservadora que, em razão de uma promoção profissional de que o pai se beneficia, vai morar num apartamento na praia de Ipanema, onde eles serão expostos aos novos valores da antiga capital praiana do País. Logo de início tentado sexualmente por uma secretária, o pai de família repete para si mesmo que é fiel, que ama a sua mulher e que não procrastinará, como nunca precisou fazer até então, mas a realidade é bem outra...

Roteirizado por Benedito Rui Barbosa, responsável por diversas telenovelas de sucesso da TV Globo, “Amada Amante” possui uma cena mui significativa em relação ao papel que este roteirista desempenharia na emissora supracitada, enquanto responsável pela “cara do Brasil”, que a TV Globo tanto se vangloria de espelhar: assim que conhecem duas garotinhas tipicamente cariocas, os filhos do pai interiorano comentam que elas “falam engraçado”, cheias de gírias. Eles comentam: “vocês falam que nem o povo da televisão”, ao que elas respondem: não, não, eles é que falam que nem a gente”... Ai, ai, se fosse assim...

Pelo sim, pelo não, fiquei encantado com a sinceridade dramática do filme, que segue numa linha de contestação do conservadorismo extremo num viés que muito se diferencia das tragédias anunciadas tipicamente escritas por Nelson Rodrigues (que era um conservador, sou destes que defendem esta tese – risos): à medida que o pai de família se deixa envolver pela secretária sensual, ele recrudesce o seu moralismo familiar, chegando ao ponto de espancar sua filha mais velha com um cinturão quando a flagra beijando-se com um malandro local. A filha mais nova aos poucos se apaixona por outra menina (vide foto), enquanto que o filho é tachado de “viado” pela namorada por que “a respeita demais”. A mãe de família, tentando ordenar todos estes pequenos conflitos, é criticada pelo marido por ser frígida e subserviente, a ponto de ser culpabilizada pela amante do marido, quando esta última é descoberta pela família: “a falta de tempero de seu macarrão foi o que fez com que seu marido quisesse comer na rua”, reclama a secretária. O desfecho do filme talvez não impacte tanto hoje em dia, mas ainda é surpreendente, dada a leveza e a majestade respeitosa com que o filme é conduzido no que tange à exposição do conservadorismo benfazejo dos personagens. E isso não somente porque o elenco é ótimo (Sandra Bréa, Neuza Amaral e Maurício Lessa mais do que me impressionaram!), mas porque Cláudio Cunha é sim, um ótimo diretor. Se antes, tendo visto apenas um de seus filmes, eu já era fã, agora, com dois, sou mais fã ainda!

Wesley PC>

quarta-feira, 9 de março de 2011

SALDO LITERÁRIO DE QUARTA-FEIRA DE CINZAS:


Aproveitei o meu jejum típico de Quarta-Feira de Cinzas para encerrar a leitura de um romance que me extenuava há vários dias. Não por ser ruim, mas por ser árduo, difícil, distante de meus anseios românticos mais pessoais, anunciadamente trágico, afetado, antiquado, arquitetônico em excesso. Não sei bem como explicar, mas não me identifiquei com a trama, me senti excluído das minuciosas descrições de classe que o livro efetiva. Apesar de ser fã do autor Johann Wolfgang Goethe, portanto, definitivamente não incluo “As Afinidades Eletivas” (1809) entre meus livros favoritos!

Por ocasião do jejum supracitado, pude ler em algumas horas da manhã de hoje um volume de páginas superior àquele em que me arrastei por mais de uma semana. E algo na tragicidade sobressalente do desfecho me fisgou, afinal, mais uma das frases repletas de consciência da personagem Ottilie, que se apaixona pelo marido da tia:

A solidão não é refúgio. (...) O refúgio mais precioso é aquele no qual podemos ser úteis. Todas as expiações, todas as renúncias não são de modo algum apropriadas para nos subtrair à sorte funesta, se ela está decidida a nos perseguir. Só se eu tiver de servir de espetáculo a este mundo indolente, isso sim me repugnaria e me amedrontaria. Mas, se me virem alegre no meu trabalho, incansável nos meus deveres, então resistirei a todos os olhares, porque os de Deus não me assustam (em algum momento do 15º capítulo da segunda parte).

Decididamente, os olhares de Deus não me assustam. São estes os que me fortalecem. E solidão não é refúgio, amanhã à tarde estarei de volta ao meu trabalho. Mesmo sem ter gostado adequadamente do livro, ele me perturbou. Vou ver se encontro a versão fílmica realizada pelos irmãos Paolo & Vittorio Taviani em 1996. Quem sabe ali não esteja o sentido que eu insista em procurar...

Wesley PC>

terça-feira, 8 de março de 2011

BOM, EU AINDA NÃO APRENDI A NADAR...

Pra começo de conversa, por que as pessoas vêem filmes? Não somente eu, mas “as pessoas”, por que elas vêem filmes? Obviamente, é coletivamente agradável assistir a filmes, visto que os pacotes de TV fechada mais caros são justamente aqueles que oferecem os canais de filmes. E, hoje, depois de passar mais de quatro dias assistindo ao máximo de bons filmes possíveis, precisei relaxar um pouco a minha mente e cedi a duas pretensamente leves produções hollywoodianas.

Coincidentemente, as duas produções escolhidas datam do mesmo ano e possuem um tema similar, a saber, viagens no tempo que visam a corrigir insatisfações vitalícias. Os filme que vi foram: a comédia adolescente “17 Outra Vez” (2009, de Burr Steers), que me surpreendeu por mostrar Zac Efron um tantinho mais dramático e/ou amadurecido do que estávamos acostumados; e a ficção científica para meninas “Te Amarei Para Sempre” (2009, de Robert Schwentke), que não me convenceu com sua trama sobre um homem que viaja no tempo em razão de uma disfunção genética e “treina” uma garotinha para ser sua esposa no futuro. No primeiro filme, o que está sendo remediado é o arrependimento de um homem adulto insatisfeito com sua vida desde que desistiu do basquetebol para se casar. Voltando a ter 17 anos por causa de um incidente mágico qualquer, ele percebe que sempre teve aquilo que quis. Não é um filme de todo conformista e, em mais de um sentido, me conquistou. No segundo filme, porém, a forçação de barra fantasiosa é mais difícil de fazer sentido, não obstante parecer mais elaborada enredisticamente. O protagonista tenta salvar a mãe que falece num acidente de carro, tenta impedir que uma descendente filial padeça do mesmo mal genético que ele, tenta tornar a sua inevitável morte mais cômoda, mas não consegue êxito em nenhuma destas empreitadas. Pelo menos, não do jeito que ele desejava. “A vida se ajusta sozinha”, parece pregar o roteiro do espiritualista Bruce Joel Rubin. Não me convenceu, apesar de ser um filme bonitinho.

Conforme pode se ver a partir das duas sinopses apresentadas, ambos os filmes estão comprometidos com a missão de conformar os espectadores com as vidas que eles levam. E quando já se é conformado, como esse tipo de filme pode ser funcional? Como este tipo de filme pode ajudar alguém que, não satisfeito em alimentar obsessões platônicas por outrem, ainda tem que lidar com os progressos românticos alheios sem sentir inveja ou ciúmes, extensões pecaminosas abomináveis para o estilo de vida religiosa que ele prega? Lembro do que disse uma amiga virtual evangélica: “as palavras de Jesus Cristo só se tornam doces quando o pecado se torna amargo em nossa vida”. E, definitivamente, em minha vida, o pecado amarga!

Fiquei imaginando-me no lugar dos protagonistas, viajando no tempo, sendo potencialmente capaz de corrigir mazelas de minha vida. Percebi – do jeitinho mesmo que os produtores dos filmes queriam que eu pensasse – que, sim, estou satisfeito com minha vida do jeito que está. Afinal de contas, é a única que tenho. Mas, se pudesse rejuvenescer, acho que eu gostaria de aprender a nadar...

Wesley PC>

A PERFEITA EPIFANIA ERÓTICA QUE UMA CANÇÃO NO BANHO DESENCADEIA...

Na madrugada de ontem para hoje, banhei-me ao som de “Teresinha”, canção do Chico Buarque eternizada na memória de muitos de minha geração por causa de um magistral quadro humorístico d’Os Trapalhões na TV. Porém, enquanto repetia e repetia aquela canção, permiti que ela impregnasse tanto as minhas sensações que o filme que vi em seguida a este banho fosse cotejado proveitosamente com a sua letra.

Tratava-se do clássico erótico em episódios “Pornô!” (1981), do qual não somente gostei bastante, como espero rever em breve e, se possível, apresentá-lo aos meus amigos como uma bem-sucedida tentativa de erotismo tupiniquim, demonstrando que o termo ‘pornochanchada’, atribuído a muitos filmes do início da década de 1980, é equivocado, dada a dramaticidade insuspeita do filme em pauta. Senão, vejamos:

“O primeiro me chegou como quem vem do florista:
Trouxe um bicho de pelúcia, trouxe um broche de ametista.
Me contou suas viagens e as vantagens que ele tinha.
Me mostrou o seu relógio, me chamava de rainha”


O primeiro dos episódios, “As Gazelas”, dirigiu por Luiz Castellini, é o menos interessante dos três, mas, ainda assim, muito bom. Aborda os jogos eróticos de duas colegas de escola tachadas de virgens. Uma por ter inclinações lésbicas, a outra por parecer puritana mesmo. Reúnem-se na casa de uma delas com o pretexto de estudaram para uma prova, mas, aos poucos, estarão estudando os seus próprios corpos, com conclusões agradáveis não somente para elas, como também para o público, em especial, o ginecofílico.

“O segundo me chegou como quem chega do bar:
Trouxe um litro de aguardente, tão amarga de tragar.
Indagou o meu passado e cheirou minha comida.
Vasculhou minha gaveta, me chamava de perdida”


O segundo episódio, “O Prazer da Virtude” (mostrado em foto), meu preferido por motivos óbvios, é dirigido por David Cardoso, que se revela mais e mais talentoso a cada novo filme dele que vejo. Neste, a trama é quase óbvia em seu simbolismo sexual: um rico ‘flanêur’ que se vê atraído por uma bela mulher que encontra na rua (a diva sensual Matilde Mastrangi), uma mulher que “já deu mais do que arroz no brejo”, mas com a qual ele só consegue fazer sexo depois que a veste de freira. As cenas de banho solitário (masculino e feminino) deste filme entraram, com louvor, para o panteão das cenas cinematográficas mais excitantes que já vi em vida!

“O terceiro me chegou como quem chega do nada:
Ele não me trouxe nada, também nada perguntou.
Mal sei como ele se chama, mas entendo o que ele quer!
Se deitou na minha cama e me chama de mulher”


O terceiro e último episódio, “O Gafanhoto”, é dirigido pelo sino-brasileiro John Doo e difere bastante dos anteriores: é muito mais dramático, difícil, estendido e denso. Na trama, um rapaz tenta fugir da opressão sobrenatural perpetrada por uma moça cega que enxerga tudo o que ele faz através dos vários espelhos que abundam pela casa. Até que ele descobre que os cobrindo com lençóis, ela fica incapaz de exercer seu poderio sobre ele. “No escuro, todos os espelhos ficam cegos”, repete ela, que mais tarde descobrirá um intenso orgasmo quando o rapaz depositar o inseto titular sobre sua vagina. Absolutamente impressionante!

Pelos motivos relatados na postagem paralela entre descrição do filme e letra da canção, ambas foram favoritadas em meu gosto artístico particular. Recomendo, no sentido mais emocionado que este verbo possa comportar!

Wesley PC>

segunda-feira, 7 de março de 2011

“...E É TUDO POR CAUSA DOS HOMENS”!

Se o machismo proveniente dos homens me azoreta em excesso, o que dizer do machismo que vem das mulheres? Pois, definitivamente, ele existe – e um dos cineastas mais afetados de Hollywood fez questão de demonstrar isso muito bem no filme “As Mulheres” (1939), cujo jargão publicitário é justamente a frase que intitula esta postagem. Trata-se do homossexual George Cukor que, com este filme, parece pôr em prática um plano secreto de fazer com que os possíveis espectadores masculinos convertam-se à misoginia de tão irritantes que as mesmas são. Acabo de assistir ao filme e, por mais que eventualmente eu concordasse com alguma frase comprobatória do aforismo de que “no amor, não se deve ter vergonha de nada”, não pude conter meu entojo diante daquelas mulheres fúteis e divorciadas, que se amontoam como um bando de gralhas chocas.

Definitivamente, eu não sei se, quando foi vendido em sua época, este filme era recebido com simpatia pelas espectadoras femininas, mas, visto hoje, 72 anos após a sua realização, o mesmo parece um retrocesso em relação aos direitos femininos, ostensivamente renegados pela mãe da protagonista, que lamenta que a sua filha não disponha da capacidade de auto-humilhação cara às mulheres que sacrificam seu próprio bem-estar em prol de um casamento falido, cujas aparências devem ser mantidas nas mais altas rodas sociais. No filme, diversas divas hollywoodianas da época digladiam-se e/ou cooperam entre si na trama de uma jovem mãe de família que descobre que seu marido está lhe traindo com uma vendedora de perfumes. Num hotel para divorciadas, ela conhece outras mulheres recém-desiludidas com o casamento e, aos poucos, estas a convencem de que ela ainda ama o seu (ex-)marido e, como tal, deve lutar por ele. Numa cena decisiva, quando ela corre para os braços dele, alguém lhe pergunta: “tu não tens amor próprio?!”, ao que ela responde: amor próprio? Este é um luxo ao qual uma mulher apaixonada não pode se permitir!”. OK, a ideologia machista venceu mais uma vez! Detalhe positivo: não aparece sequer um homem em toda a extensão de 133 minutos do filme! (risos) Pós-detalhe negativo (o qual acabo de descobrir): o filme foi regravado recentemente sob o título “Mulheres – O Sexo Forte” (2008, de Diane English). Definitivamente, o que sobra ali é a defesa de um sexismo socialmente conveniente, em que a “força” das mulheres está justamente em fingirem ser fracas quando melhor lhes convêm. Definitivamente, isto não me convence. Humpf!

Na verdade, o filme não é de todo malfazejo: é bem-humorado, aparentemente é financiado por mulheres que realmente financiam o estereotipo de fuxiqueiras dependentes de salões de beleza (uma das coadjuvantes é a famosa colunista Hedda Hopper) e aborda o tema do divórcio com uma desenvoltura elogiável para a época, mas a impressão que dominante é que o filme é mesmo uma versão trintista para o seriado de TV “Sex and the City”. Tudo bem que minha irritação com o filme deve-se ao fato de eu não ser fã do melindroso George Cukor, mas a vilania defensável de Joan Crawford e a beleza e o talento de Paulette Goddard, Joan Fontaine e Rosalind Russell, para ficar em apenas três nomes, equilibram bem a reputação clássica do filme, que, definitivamente, não está entre os meus favoritos. E a imagem que encerra o ‘trailer’ do filme (esta mostrada na fotografia) só corrobora a minha insatisfação. Ou alguma mulher ousaria me dizer o contrário?

Wesley PC>

MACHISMO ME AZORETA!

Por causa de seu valor clássico, por causa da presença fugaz da bela Leila Diniz, por causa dos talentos direta ou indiretamente envolvidos nessa estréia do galã Reginaldo Farias na direção, fiquei ansioso para ver “Os Paqueras” (1969), exibido na manhã de hoje. Acordei cedo para assisti-lo e gostei de imediato do bom uso de canções de Roberto Carlos e Os Mutantes na trilha sonora, mas peguei um entojo tão grande pelo protagonista que foi difícil suportar o filme até o final.

O roteiro é o mais básico possível: Nonô (o próprio Reginaldo Farias) e Toledo (Walter Forster) são dois garanhões que passam o dia inteiro à procura de mulher. Fodem o dia todo e nunca estão satisfeito. Preferem mulheres casadas, pois estas são mais fáceis de serem descartadas e, para o meu choque, 100% das mulheres casadas que cruzam com os protagonistas no filme rendem-se ao adultério. Mas isso eu até tentei relevar. O que me incomodou mesmo foi a péssima defesa enredística do mau-caráter Nonô, filho de pai aquisitivamente remediado, excedente no vestibular para Medicina, irresponsável e metido a besta, atolado nas praias da hora que acorda até a hora em que chega em casa para dormir e se irrita quando o seu pai ralha com ele.

Tudo bem que, numa ou duas cenas (a imagem mostrada em foto entre elas, ainda nos créditos iniciais), eu até que esbocei um sorrisinho amarelado em relação ao filme, mas, levando-se em consideração que ele foi realizado num momento histórico do Brasil em que a política urgia nas ruas, senti-me traído por um roteiro tão escapista e promíscuo. Tudo bem que o diretor até tenta fingir consciência da conscientização alheia quando a personagem juvenil de Irene Stefânia pergunta por que ele não reivindica os seus diretos de estudante, mas o final conciliador e chauvinista enervou-me deveras. Definitivamente, eu não consigo imaginar o que as mulheres de 1969 experimentaram durante as exibições cinematográficas deste filme. Um retrocesso consciencioso, em muitos aspectos, apesar de ser um filme relevante de nossa filmografia nacional. Dolorosa necessidade de capitulação artística esta: se me perguntarem, terei que fingir que gostei do filme? Pelo menos “Fuga nº II”, na voz doce da Rita Lee, é executada mais de uma vez!

Wesley PC>

domingo, 6 de março de 2011

JÁ NÃO SE FAZ MAIS TV ABERTA COMO ANTIGAMENTE (POST-SCRIPTUM)


Esta era a abertura da telenovela “Brega & Chique” (1987), repudiada pela censura, quando de sua exibição original, mas liberada no horário vespertino, dois anos depois. A canção-tema era “Pelado”, do grupo de ‘rock’ Ultraje a Rigor. Eu, hoje, não lembro nada desta telenovela, mas esta abertura deixou marcas indeléveis em minha sexualidade infantil! (risos). Detalhe: a bunda do modelo Vinicius Manne também era exibida a torto e a direito na capa do LP com a trilha sonora internacional da telenovela. Dentre os destaques: “Everything I Own”, na voz de Boy George; “Now and Forever”, na voz de Jimmy Cliff; e “I Want Your Sex”, óbvia interpretação do polemista George Michael. Ah, se eu tivesse esse disco em casa (risos)...

Wesley PC>

JÁ NÃO SE FAZ MAIS TV (ABERTA) COMO ANTIGAMENTE...

Dia desses, eu assisti a um filme cômico divertidíssimo, chamado “As Amazonas na Lua” (1987, dirigido por John Landis, Carl Gottlieb, Peter Horton, Robert K. Weiss & Joe Dante). Composto por diversas sátiras e paródias de filmes antigos e da própria TV norte-americana, este filme me fez lembrar bastante de um famoso programa televisivo brasileiro, obviamente inspirado nele, cuja reprise eu vi recentemente na TV Viva. Tratava-se do elogiado “TV Pirata”, criado e aperfeiçoado por Guel Arraes e Cláudio Paiva, entre outros inovadores da linguagem cômica na tela pequena do vídeo. Digo mais: quando eu via trechos do referido programa na época em que ele foi originalmente exibido (entre os anos de 1988 e 1992), eu tinha medo: “TV Pirata” era anárquico demais para uma criança.

Revendo o programa recentemente, conforme comentado, entendi de pronto por que ele me assustava: a linguagem visual é exagerada, entrecortada em excesso, ruidosa, e, em muitos sentidos, genial. Ainda que algumas piadas tenham obviamente envelhecido, era no mínimo inovador pôr um homem completamente nu na abertura, realizada na época em que Hans Donner ainda era um técnico deveras inovador. E, dentre os quadros do programa que revi, um deles me fez gargalhar: em frente a um cinema, um lanterninha vendia e coletava os ingressos para um filme pornográfico cuja sinopse indicava que as mulheres relinchavam como éguas quando atingiam o orgasmo. As pessoas não paravam de entrar na sessão e, quando a lotação da sala foi esgotada, o lanterninha tranca o portão de acesso e troca o cartaz do filme, indicando que o que será exibido ali é, na verdade, uma obra de Glauber Rocha. As pessoas começam a se debater na sala, implorando para sair, enquanto o lanterninha olha para a câmera, com olhar malévolo, encerrando o esquete. E eu não conseguia parar de rir. Muito engraçado!

Ainda não sei bem em quais dias a TV Viva reprisa este programa (parece que o horário regular é à meia-noite de sábado para domingo), mas o que vi naquele dia comprova quão inspirados eram os roteiristas televisivos de antigamente: a TV Globo já se preocupou mais com a qualidade de suas produções, seja no que diz respeito à forma (anárquica, como já disse) quanto aos conteúdos das piadas (que são infinitamente mais divertidas que os quadros auto-condescendentes de hoje em dia), sem contar que Louise Cardoso, Diogo Vilela, Regina Casé, Ney Latorraca, Cláudia Raia, Guilherme Karan, Débora Bloch, Luiz Fernando Guimarães e Cristina Pereira eram muitíssimo engraçados quando jovens. Definitivamente, não se faz mais TV (aberta) como antigamente (risos)...

Wesley PC>

MEU ESTEREÓTIPO DESPORTIVO FAVORITO:

Em várias oportunidades praianas, deparei-me com surfistas que nadavam completamente nus em áreas que eles consideravam inóspitas no que tange à apreciação dos banhistas. Geralmente, eu estava nestes locais por acaso e, depois que os via se despindo, não conseguia sair de lá, ficava admirando-os à distância, usando seus corpos como ferramentas de comunhão com a água e não como receptáculos de sensualidade comercializada. Em outras palavras: impressiona-me o modo como a maioria dos surfistas com que me deparei até então não faz exibição gratuita de seus corpos sarados. Sabem que são bonitos, sabem que chamam a atenção, mas não se rendem à competitividade sobressalente de outros esportes. Surfe é uma atividade que tem muito a ver com a entrega do surfista ao mar, com uma relação espiritual com o ato de cavalgar as ondas. Se eu ainda tivesse tempo de aprender um esporte, este, definitivamente, estaria entre minhas opções mais consideráveis. Estaria não. Está ainda!

Pois bem, por gostar tanto deste estereótipo desportivo, gosto de assistir a filmes sobre surfistas, desde clássicos recentes como “Caçadores de Emoção” (1991, de Kathryn Bigelow) até produções independentes que mereciam melhor sucesso de público como o documentário brasileiro “Fábio Fabuloso” (2004, de Pedro Cezar, Ricardo Bocão & Antonio Ricardo). Foi neste embalo, inclusive, que assisti, há pouco, a “Nas Mãos de Deus” (1998), filme que tinha tudo para dar errado, visto que é dirigido por um cineasta com pecha de publicitário chamado Zalman King, responsável por filmes insossos de erotismo ‘softcore’. A trama do filme, por sua vez, também era pouco interessante (“três amigos viajam pelas praias de Madagascar, Bali, Havaí e Cidade do México, em busca da onda perfeita”), mas o diretor conduz suas imagens com tamanha erotização que foi difícil eu não me sentir atraído pelo filme, em mais de um sentido.

Não obstante ter desgostado das composições personalísticas – os três protagonistas são ruins: um é arrogante demais, o outro é expressivamente nulo, e o terceiro, Matty Liu (mostrado em esplendor fotográfico) força a imaturidade etária de seu personagem – a direção de fotografia aquática é tão caprichada, a montagem é tão esquisita, a diluição narrativa é tão contemporânea, que resolvi enfrentar as críticas negativas comumente destinadas ao filme e dizer que, não somente gostei muito dele, como este seria um dos filmes ideais para se assistir em 3D. Por mais que, ao assumir isto, eu incorra numa contradição discursiva com o aspecto do roteiro que mais me chateou: uma subtrama envolvendo a defesa dos incrementos tecnológicos em algumas modalidades do esporte. Mas, deixa quieto: é um mau menor. Ver Matty Liu correndo pelas praias africanas, asiáticas e da Oceania ou ser criticamente concessivo em relação às cenas em que seu personagem delira em razão de um ataque de malária são compensações que fazem o filme valer muito a pena. Deu até vontade de ir numa praia agora mesmo!

Wesley PC>