sábado, 28 de setembro de 2013

UMA GENIAL MARMELADA DE PORRA!

Eu juro que tentei evitar a menção ao adjetivo genial em relação à minha apreciação de “48 Horas de Sexo Alucinante” (1986), a fim de que meu primeiro contato com uma imersão do diretor José Mojica Marins no cinema de sexo explícito não soasse perigosamente entusiástico, mas não pude evitar: a conversão de uma obra sacana num manual pedagógico de superação traumática das paranóias sexuais através do casamento me impressionou sobremaneira, de maneira que não consigo classificar este filme como inferior a “ótimo”.

No início do filme, vemos algumas imagens publicitárias que comprovam o sucesso de “24 Horas de Sexo Ardente” (1984), realizado anteriormente pelo mesmo diretor, com o intuito de enfrentar os modismos pornográficos através da introdução do bestialismo. Percebemos neste prólogo o interesse mui pessoal de uma mulher (Andréa Pucci), que logo saberemos ser uma sexóloga de nome Margareth. Esta procura o cineasta José Mojica Marins e o roteirista Mário Lima – interpretado pelos próprios artistas – para financiar a realização de um filme com sexo explícito, correspondendo à desafiante maratona erótica contida no título desta película. Um médico surge examinando os atores dispostos a se submeterem a tal desafio. Diga 69!”, diz ele a uma jovem, que logo corrige a fórmula médica embasada no número trinta e três. Na seqüência seguinte, diretor, roteirista e sexóloga explicam as regras do concurso de fodas, que durará exatas quarenta e oito horas e premiará aquele que mais gozar neste período. O juiz será um homossexual disfarçado de Calígula, que possui um escravo particular que segura um ventilador, mas que tem dificuldades para ter ereções. Um papagaio inconveniente também está no cenário entulhado de gente, gritando expressões de baixo calão. Mulheres (e travestis) portam-se como bandeirinhas de futebol, erguendo flâmulas verdes sempre que presenciam uma ejaculação, vermelhas quando alguém broxava, e eventualmente se dispondo a chupar os pênis cansados.  Um destes pertence a Sílvio Júnior, conhecido pelas obsessões glúteas que vivificou numa cinessérie dirigida (sob pseudônimo) por David Cardoso. A fim de ganhar o prêmio principal, ele está disposto até mesmo a se contaminar com o vírus da AIDS, disposto a meter em qualquer cu, inclusive de homens. E é justamente ele quem vence a competição (não vou mentir: eu estava torcendo por ele!), sintetizada em menos de uma hora, enquanto o papagaio reclamava: “faltou a punheta!”. De repente, o enredo detém-se numa memória traumática da infância da doutora Margareth, que fora espancada pela mãe quando observava os bovinos de sua fazenda em pleno coito. Ela cresce impedida de ter orgasmos, desejando ser penetrada por um touro. Reclama que sua vida não tem sentido e suplica ajuda aos técnicos cinematográficos, que a despem e a inserem numa aça embalsamada, com a promessa de que ela terá atendida a sua fantasia zoofílica. Quem aparece vestido de touro, entretanto, é o ex-noivo da sexóloga que, após penetrá-la e conseguir fazer com que ela goze, é rejeitado pela mesma quando ela descobre a farsa. Mais tarde, sozinha, ela percebe o que aconteceu e pede desculpas ao noivo, marcando encontro com ele num parque público, quase transando na relva, até que são expulsos por uma velha (na verdade, um home vestido de mulher) escandalizada com a imoralidade da situação. Corte para o interior do motel Bom Voyage, onde o casal trepa. Na seqüência seguinte, eles convidam o diretor e o roteirista do filme para serem os padrinhos de seu casamento, não sem antes de autorizar o que fora filmado anteriormente para exploração comercial. “Um dinheirinho não faz mal a ninguém, né?”, comemora Mário Lima. Segue-se uma cantoria num restaurante, em que, ao som de “El Dia que me Quieras”, Margareth dança com Mário, até que Mojica adverte seu noivo de que, se ele não se apressar, pode perder a mulher para outro. O noivo se levante, dança com sua esposa, eles cortam o bolo, uma marcha nupcial irrompe na banda sonora e a palavra “fim” irrompe, em sistema MS-DOS, na tela. Tem como não tachar este percurso fílmico-pornográfico de genial?

Peço perdão por sintetizar a trama integral do filme, mas não consegui me conter: o roteiro metalingüístico desta obra é tão surpreendente e impressionante que creio ter encontrado o projeto de meu futuro doutorado durante a sessão, na qual estive acompanhado por um amigo/vizinho recém-casado, que ficou tão contente quanto eu com a qualidade positiva do filme. Quem diria? Estou em estado de graça: a Boca do Lixo consegue me encantar, até mesmo quando estampava a sua própria decadência!


Wesley PC> 

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

UM PROFUNDO MAL-ESTAR SUPERFICIAL: A FELICIDADE!


Vi “As Praias de Agnès” (2008, de Agnès Varda) há algumas horas, mas continuo sob efeito do filme. Uma obra-prima de completa imersão especular no amor, nas memórias que lembram moscas confusas, nas ereções compartilhadas, no direito de protestar a favor do aborto mesmo quando se está plenamente satisfeita com a própria gravidez... Incrível o quanto este filme é genial e atesta a suprema genialidade de sua realizadora, cujos filmes são, sobretudo sobre si mesma, sobre a paixão perpétua pelo falecido marido Jacques Démy (1931-1990), sobre a “ilha de carinho” que é a família. Queria poder escrever muito mais sobre este filme, sobre o que ainda sinto após a sessão, mas estou encantado, assolado por uma leseira que se confunde com a suma felicidade, cotidiana e fugaz, perene e intangível. Se eu já era completamente apaixonado pela cineasta antes, agora, neste exato instante, eu sou devoto, admirador contumaz, vardiano, pura e simplesmente!


Wesley PC> 

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

EMOÇÕES QUE APENAS A POLÍTICA EXPLICA...


Já conhecia o cineasta Patricio Guzmán por causa de sua devoção incansável ao resgate da memória política chilena, a tudo aquilo que foi suplantado pelo golpe de estado de 11 de setembro de 1973. Por mais que seu documentário “Salvador Allende” (2004) tenha me incomodado um pouco no início pelo tom hagiográfico e pela reutilização insistente de imagens de outros filmes, a imersão cada vez maior do realizador em seu próprio percurso fílmico descarregava emoção: ao final da sessão, eu estava em transe, agradecido por ter amigos a quem eu pudesse destinar o encanto pela vida que me tomava de assalto naquele instante...

Dentre as cenas que mais me impressionaram, todos aqueles momentos de forte apoio popular, as perscrutações do cineasta nos locais que foram atacados pelos militares (que se tornaram “um museu secreto, um recanto de amnésia”) e a entrevista com um funcionário aposentado da companhia de inteligência norte-americana que, quando perguntado acerca do que sentira quando soube que Salvador Allende estava morto, respondeu cinicamente: ele colheu aquilo que plantou ao crer que a direita se suicidaria na alegria”. Incrível! Maravilhoso o filme: emoção em estado bruto!

Wesley PC>  

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

LOGO EM SEGUIDA, ACRESCENTEI NO FACEBOOK:


"Era jovem, desde muito cedo consagrado como alguém com idéias geniais... Tudo isso fazia com que ele se tornasse cada vez mais e mais exibicionista. Atraía as pessoas ao seu redor para uma constante exposição, exacerbada, exagerada... Em seu âmago, ele cria que compartilhar com outrem (quase) tudo aquilo que vivenciava, além de assegurar a manutenção de sua egolatria auto-indulgente, permitiria que seus admiradores o imitassem e, dentro de um prisma produtiva, quem sabe o superassem, num contexto em que toda e qualquer tentativa era válida enquanto incremento artístico. Suas intenções, no fundo, eram boas... Ele se preocupava com o próximo. Mas o que todos viam (e criticavam) era a sua vaidade, a sua irritabilidade, a sua constante imersão no ridículo! Era para ser um filme, pautado como um falso documentário. A câmera está na mão do protagonista, mas... Quem filma? Quem vê? A quem interessa? Nem tudo dá certo, mas a reflexão é válida! As interrogações (extra-)titulares também..."

O filme em pauta: "JC Como Jesus Cristo" (2011, de Jonathan Zaccaï). Nem é tão bom, mas, enquanto propulsor de autocríticas, funciona bastante! Fica a recomendação, portanto. E a declaração de princípios...

Wesley PC>

PARA PENSAR ENQUANTO SE DEFECA...

Volta e meia, minha mãe reclama que está com prisão de ventre. Por sorte, raramente este problema me acomete, ao contrário das dores de cabeça. Ontem à noite, depois de ver um ruidoso filme de terror no cinema, eu pensei que fosse vomitar ou desmaiar de tanta dor. De repente, a minha barriga começou a doer. Minha mãe, enquanto isso, ansiava por tomar sorvete de pavê. Há pouco, ela reclamou que sentia-se como se duas pedras de concreto tivessem saído de sua barriga. Ela levou os óculos para o banheiro e leu enquanto defecava. No sábado, eu e ela tínhamos visto juntos o filme "JC Como Jesus Cristo" (2011, de Jonathan Zaccaï), em que Vincent Lacoste interpreta um adolescente pedante que se acha melhor que os outros porque recebeu uma Palma de Ouro de Melhor Diretor de Curta-Metragem no Festival Internacional de Cinema de Cannes, aos 15 anos de idade. Ele se torna assunto de um documentário por causa disso. O filme é o resultado ficcional deste documentário. É divertidinho, e me fez rir no final, quando um suposto Jean-Luc Godard confessa ao protagonista que viu "Shrek 2" (2004, de Andrew Adamson, Kelly Asbury & Conrad Vernon) no cinema recentemente e gostou bastante. Empolgado, ele oferece o roteiro da continuação de seu primeiro filme ao protagonista. Engraçado, né?

Wesley PC>