sexta-feira, 25 de outubro de 2013

“NÃO SE DEIXE GUIAR PELA BELEZA: ELA SEMPRE NOS CONDUZ A UM DESTINO FATAL”...

No início da semana, tive o privilégio de ver o primeiro longa-metragem de Alfredo Sternheim como diretor, “Paixão na Praia” (1971), como parte de uma homenagem do Canal Brasil à atriz recém-falecida Norma Bengell. É um filme muito interessante, mas não se desenvolve muito bem, apesar do ótimo início, em que uma mulher insatisfeita com o egocentrismo empresarial de seu marido se permite apaixonar pelo bandido que invade a sua casa de praia...

No ótimo “Violência na Carne” (1981), que vi na manhã de hoje, a sinopse praticamente se repete, mas, aqui, o diretor já estava muito mais amadurecido, e corrige magistralmente o aspecto em que mais se equivocara no filme anterior: a pretensa inserção de um discurso idealista/socialista com o qual não tem muita afinidade. Afinal de contas, o que mais me impressiona na obra do Alfredo Sternheim é o seu classicismo. O modo como ele leva isso à frente na Boca do Lixo é genial!

No filme mais recente, quatro presidiários fogem da cadeia e planejam sair do País num barco. Um deles sofre um ataque cardíaco e é deixado pelo grupo. Os outros três invadem uma casa de praia onde um grupo de atores ensaia uma peça sobre a Morte: um dos presidiários (Zécarlos de Andrade, deveras tesudo) é um comunista entristecido, que se envolverá com a maravilhosa personagem depressiva (e potencialmente suicida) vivida por Helena Ramos; o segundo é um ladrão afoito que estupra mais de uma mulher (inclusive uma lésbica preocupada com as conseqüências cósmicas de sua opção sexual rejeitada pela família) e estrangula uma ‘hippie’ loira na praia; e o terceiro é um agente de lenocínio que, na cadeia, teve o seu paladar sexual alterado e, agora, interessa-se por sexo anal com homens, o que o leva a violentar o namorado do diretor da peça. O título do filme, portanto, é literal, mas isto não expurga a beleza clássica à qual o diretor nos acostumara: o desfecho trágico é musicado por Richard Wagner. Extraordinário filme!


Wesley PC> 

DEMONSTRAÇÃO DE UMA PORNOCHANCHADA CRÍTICA:

Apesar de adentrar com interesse renovado a filmografia do cineasta Fauzi Mansur (vide alguns exemplares de resenhas deslumbradas aqui), só soube da existência de “Me Deixa de Quatro” (1981) há algumas semanas. Na manhã de hoje, aproveitei a deixa para saber do que se tratava e fiquei contente ao saber que a musa Helena Ramos e o gracioso Arlindo Barreto eram os protagonistas. A abertura era ao som de “Fica Comigo Esta Noite”, na voz do saudoso Nelson Gonçalves. O problema era que o tom do filme era incomodamente pornochanchadesco, beirando os preconceitos chauvinistas...

Sendo este diretor um dos mais inventivos da Boca do Lixo paulistana, era óbvio que ele não se submeteria facilmente aos ditames hipócritas do subgênero ‘pornochanchada’. Dito e feito: por mais que o filme seja deveras problemático em sua aparente adesão discursiva à perspectiva homofóbica do adúltero protagonista Guido (Serafim Gonzales), gradualmente o seu filho com tendências homoeróticas Dirceu assume-se como protagonista. Objeto de desejo do obcecado Darci (Carlos Arena), Dirceu abdica de suas experiências pederásticas quando se apaixona pela deslumbrante Luci, amante de seu pai.

Inicialmente, o encontro entre Dirceu e Luci era decorrente de um plano de seu pai para demonstrar que o filho não era ‘bicha’, como todos os seus amigos espancadores de homossexuais insistiam em apregoar. Porém, ele se apaixona perdidamente por ela, a ponto de comemorar quando crê que ela esteja grávida dele. Porém, Dirceu não deixa de persegui-lo e, numa situação que permanece mal-explicada no desfecho conservador e extremamente machista (intradiegeticamente falando), o uranista apaixonado assassina a sua rival. E eu me identifiquei completamente com este personagem: ultimamente, percebo-me tão persecutoriamente apaixonado quanto ele, em relação a um fornecedor freqüente de sêmen que, por motivos alheios à nossa vontade, não consegue dispor de tempo e/ou espaço para gozar em minha boca. O que me fez experimentar a mais intensa crise de abstinência virginal dos últimos anos. Estou desesperado, mas o filme aplacou a minha angústia erotógena e espermofágica!


Wesley PC> 

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

UMA CONCLUSÃO SINTÉTICA, ANTES DE COMER CUSCUZ COM LEITE, PASTÉIS DE QUEIJO, BOLO DE MARACUJÁ E CAFÉ...



Quando acerta, Roberto Farias é um cineasta genial!

Palavras de um apaixonado estudante de Jornalismo.

Boa noite.

Wesley PC>

“PEÇO DESCULPAS AOS SENHORES POR TEREM TESTEMUNHADO A CARNIFICINA DE HÁ POUCO, MAS ELA É NECESSÁRIA PARA O DESENROLAR DE NOSSA HISTÓRIA”...

Neste exato momento, eu estou escandalizado: não sou fã dos filmes d’Os Trapalhões, nem devoto do Ariano Suassuna e tenho problemas com a irregularidade (eventualmente convertida em versatilidade) do Roberto Farias. A combinação de todos estes elementos em “Os Trapalhões no Auto da Compadecida” (1987) me deixou chocado: não apenas gostei muito do filme como tive o privilégio de ver o quarteto interpretando de verdade, não apenas despejando piadas...

Tudo bem que Renato Aragão como o esperto João Grilo e Dedé Santana como o pabuloso Chicó apenas concebem variações de seus próprios personagens, mas o hilário Zacarias como um padeiro traído e Mussum vivificando Jesus Cristo me surpreenderam bastante!

Muitíssimo bem dirigido, este filme utiliza-se de uma narrativa teatral metalingüística para apresentar a sua trama, tornada conhecida do público brasileiro por causa do filme advindo de uma produção televisiva “O Auto da Compadecida” (2000, de Guel Arraes). Se eu já tinha restrições – ideológicas, principalmente – a este (tele)filme recente, depois de constatar o brilhantismo técnico e popularesco deste clássico injustiçado de Os Trapalhões, eu dou a minha mão à palmatória risória mais uma vez. Os diálogos envolvendo a cristandade – seja no que se refere à sua cor, “que não é das melhores, apesar de [ele] falar bem”, à propaganda kardecista vinculada ao sobejo de ressurreições e ao chiste sobre protestantismo vinculado ao minucioso conhecimento do Evangelho por conta do personagem, sacro. Como o próprio Ariano Suassuna foi co-autor do roteiro, ao lado do diretor Roberto Farias, é difícil saber o que já estava na peça original, o que adveio exclusivamente da versão cinematográfica e o que foi imposto pela sanha controladora exacerbada do grupo cômico (de Renato Aragão, sobretudo), mas que eu gargalhei em mais de uma seqüência, ah, eu gargalhei!

Por conta de uma necessidade tangencial de minha pesquisa sobre pornochanchadas, tentarei ver a integralidade dos filmes protagonizados pelo grupo até o final do ano, mas, desde já, confesso-me absoluta e positivamente chocado com o que estou a descobrir em filmes que eu rejeitei tanto tempo por pré-conceito. Não era uma filtragem espectatorial equivocada (defendo os meus motivos, preconceituosos inclusive), mas dou a cara a tapa neste exato instante: achei o filme espetacular, primoroso e, acima de tudo, muito inteligente e divertido!


Wesley PC> 

SOBRE A INCAPACIDADE EMOCIONAL EM FALAR ALGO SOBRE UM FILME QUE MUITO ME EMOCIONOU... (EM 9 TÓPICOS):


1 - É um filme triste, mas as gargalhadas são abundantes;

2 - É um filme que cita imersão no cinema (apesar do preço caro dos ingressos), similaridades cotidianas com algum romance da Virginia Woolf, e uma viagem;

3 - É um filme sobre uma perdulária frugal (se é que a combinação faz sentido);

4 - É um filme que provoca a identificação, mesmo quando se parece o oposto da protagonista;

5 - É um filme que provoca a identificação, mesmo quando parece fazer o oposto do que a protagonista faz;

6 - É um filme dirigido por Noah Baumbach, protagonizado por Greta Gerwig e roteirizado por ambos. Precisa continuar?

7 - Caso seja preciso, continua-se: é um filme que nos atinge em cheio, um filme que tem a ver com o que sentimos!

8 - É um filme sensual e conservador ao mesmo tempo, não por acaso, destacando "Modern Love", do David Bowie, na trilha sonora;

9 - É um filme sobre amigos que se vão e amizades que ficam. E eu amei: pois eu sou destes que amam!

Wesley PC>


terça-feira, 22 de outubro de 2013

“- E O OURO? – OURO? QUE OURO? EU QUERO É SAIR DAQUIS!” (DANDO A MÃO À PALMATÓRIA CÔMICA)

Apesar de eu ter me decepcionado sobremaneira com o mais recente filme do Heitor Dhalia, não o achei tão ruim quanto os meus companheiros de sessão. Porém, tendo visto “Os Trapalhões na Serra Pelada” (1982, de J. B. Tanko) há pouco, careço fazer algumas considerações reavaliativas. O motivo: se, no filme mais recente, a localização geográfica titular é apenas fortuita, no filme mais antigo impressiona a sagacidade contextual do roteiro, que, infelizmente, deixa de ser cômico na metade final para filiar-se às convenções do cinema de aventura pró-intervenção governamental.

Na seqüência inicial do filme cujo argumento foi escrito pelo próprio Renato Aragão, acompanhamos uma prostituta dançar quase completamente despida, salvo pelas cédulas monetárias espalhadas sobre seu corpo. Seguem-se os créditos de abertura, onde sabemos que a trilha sonora fora composta por Sivuca, e impressionamo-nos com as imagens impactantes do entulhamento de trabalhadores, suados e sujos de terra. O grupo humorístico filmou no local onde se efetivava a “febre do ouro”, o que justifica a mistificação confessada pelo personagem de Dedé Santana [Boroca]. O personagem correspondente a Didi (oportunamente chamado Curió, sobrenome de um militar importantíssimo no controle estatal daquela região) logo se apressa em começar a ‘ouriçar’, sendo corrigido por Zacarias [Bateia], que alega que o verbo correto para a exploração de ouro é ‘ourinar’. Mussum [Melexete] corrige: “é garimparis!”. Mas eu e minha mãe ainda estávamos a gargalhar de um instante anterior, em que, quando perguntado por que cobria os olhos com as mãos, Zacarias responde: “é que eu nunca vi uma serra pelada. Estou com vergonha!” (risos).

Não obstante começar muito bem – e rapidamente superar em qualidade e relevância sociológica o filme mais recente – “Os Trapalhões na Serra Pelada” logo revela os seus problemas constitutivos: o enredo se perde em meio às ‘gags’ e cenas de ação; a ode aos militares é feita sem disfarces (vide o segmento iniciado com a palavra ‘manobras’ escrita na tela); e coadjuvantes de luxo como Louise Cardoso, Gracindo Júnior e Wilson Grey são desperdiçados. Mas, ao contrário do filme de Heitor Dhalia, o roteiro de Gilvan Pereira dá atenção às questões circunvizinhas ao garimpo, como os direitos indígenas, a expropriação das fazendas menos prósperas (e/ou alheias à obsessão aurífera) e os motéis populares que aceitam até mesmo casais a pé. As piadas do quarteto valorizam situações chistosas envolvendo transportes a jegue (um táxi, por exemplo, acopla o fundo de um fusca a um asinino) ou canções sobre garimpeiros que “perderam a mulher no forró”. É um filme extremamente defeituoso e que deixa de ser engraçado em seu quartel final, mas que, dada a ignorância até hoje levada a cabo sobre o importante êxodo destrutivo vinculado à região paraense do título, ganhou muitos pontos comigo, que, agora, reverei os filmes protagonizados por Os Trapalhões com muito mais cautela... A ambigüidade ideológico-dramática do desfecho desta obra é decisiva: Curió acredita que o amigo curumim Caú (interpretado pelo pequeno Nilson Silva) tinha sido morto num bombardeio e, entristecido, larga os seus amigos para ser pedreiro em São Paulo, alegando que “ouro só traz problemas”. Larga diversos objetos áureos fora até que encontra uma gigantesca pepita de ouro e clama desesperado por uma picareta. É para rir um troço destes?


Wesley PC> 

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

SOBRE AQUILO QUE TALVEZ (NÃO) SEJA ASSUNTO...

Comi macaxeira pela manhã. Tive uma madrugada complicada: levantei-me diversas vezes por causa do impacto emocional desencadeado pelo filme grego que vi antes de dormir, "O Passo Suspenso da Cegonha" (1991, de Theo Angelopoulos). Não seria inapropriado que eu ouvisse o disco "Me Dyo Papoutsia Panina" (2001), colaboração entre o grego George Dalaras e o sérvio Goran Bregovic, pela manhã. Estou repetindo o disco pela terceira vez. Muito bom!

Em verdade, o que ouvimos aqui são releituras de canções famosas de Goran Bregovic para o idioma natal do outro músico. Assim sendo, a minha favorita "Mesecina" transformou-se em "Nychta" (faixa 05), com uma letra visivelmente distinta, mais longa, inclusive. O mesmo acontecendo com diversas outras faixas. Ouço agora a penúltima faixa, "Pu Na'Sai Tora, Anna" (faixa 09), bastante dialogada. Um primor!

Daqui a pouco, planejo almoçar. Acho que irei ao cinema com amigos mais tarde. Algo a ser dito, mas talvez ainda seja cedo. Talvez... Gosto tanto desta palavra! E de música...

Wesley PC>