sábado, 6 de abril de 2013

quinta-feira, 4 de abril de 2013

“DIANTE DE TODA BANALIDADE, AJA SEMPRE COM CAUTELA!”

Continuando o meu acompanhamento particular do III Festival Sergipano de Teatro, dispus-me hoje a ver a peça “A Água Dividida”, encenada pelo extraordinário grupo Raízes Nordestinas (na foto, posando durante a apresentação de “Os Corumbas”, de Armando Fontes). A ausência de sinopses na programação do evento me fez especular que o enredo deste espetáculo tivesse a ver com alguma forçação de barra demagógico-pedagógica sobre a transposição do Rio São Francisco, por exemplo, mas, para a minha surpresa e satisfação, a peça era uma adaptação brechtiana, muitíssimo antenada à frase “estranhe o que não é estranho”, em destaque numa faixa disposta sobre o cenário da mesma.  

Conduzida por excelentes canções compostas, executadas e interpretadas por Rafaela Alves e uma banda situada no palco, a peça contava uma impressionante estória de injustiça, envolvendo um asqueroso comerciante, que maltratava um guia e um carregador enquanto se embrenhava por um deserto, em busca de um local onde pudesse explorar o petróleo. Como ele era seguido por um concorrente, ele tratava os seus empregados com uma violência descomunal, despedindo um deles quando percebe uma possibilidade de aliança entre as classes menos desenvolvidas. Depois de assassinar o seu carregador quando confunde o cantil que ele oferecia com uma pedra, o comerciante é julgado, mas absolvido por ter “o direito de ter medo de quem pode lhe destruir”. Lema ensinado na peça: “nós é uma coisa; outra é você e eu”!

Para o meu descontentamento, nenhum de meus amigos pôde comparecer a este espetáculo, muitíssimo bem encenado por um grupo formado a partir de uma oficina teatral bem-desenvolvida no sertão sergipano, mais precisamente na cidade de Poço Redondo. Nem todos os atores estavam bem em cena (o protagonista que vivia o comerciante era ruim), mas os coadjuvantes eram ótimos, um deles era particularmente muito bonito e as canções eram absolutamente extraordinárias, tanto em conteúdo libertário-aconselhador quanto em melodia. Infelizmente, a platéia insistia em rir em momentos que deveriam ser apreendidos dramaticamente em sua demonstração ostensiva de quão cruel pode ser os maus tratos de um homem contra outro homem, a partir da justificativa ideológica de que “quem tem uma vida boa é o homem bom; quem tem uma vida má é o homem mau – e, assim, tudo segue bem...”. O modo solene com que os atores recebiam, deslocavam e utilizavam os objetos cênicos era magistral, de modo que eu saí do teatro encantado. Sozinho, porém encantado. E, no ônibus, transferi este encanto para os braços venosos de um belíssimo surdo-mudo. Mas essa é outra história de opressão imaginária...

Wesley PC> 

RADU MIHAILEANU NÃO ME REPRESENTA! (SÓ PARA TENTAR MUDAR DE ASSUNTO...)

Um sociólogo hipócrita que conheço talvez encontre na figura do demagogo cineasta romeno Radu Mihaileanu o seu modelo político ideal: acostumado a resolver as suas crises enredísticas a partir de uma adesão positiva à "mentira piedosa", este diretor atingiu o píncaro de sua criatividade em "A Fonte das Mulheres" (2011).

Se, nos filmes anteriores deste cineasta que, até então, eu tive acesso ["Trem da Vida" (1998); "Um Herói do Nosso Tempo" (2005); e "O Concerto" (2009)], o fingimento é elogiado como estratagema de salvação, no filme mais recente o foco parece muito mais "nobre": a tomada de partido em prol de mulheres exploradas e espancadas por seus maridos, que decidem fazer greve de sexo a fim de interromper uma tradição que as convence a percorrer longas distâncias para buscar água, mesmo quando grávidas e sujeitas a abortos infertilizantes. Até aí, tudo bem. O problema é que a perspectiva política do filme é simplista e enviesada (visivelmente estrangeirizada em seu cosmopolitismo capitalista), defendendo a irrupção do "islamismo esclarecido", desde que este não se oponha que mocinhas de vilarejo iludam-se com o amor diante de telenovelas mexicanas. Não que o filme seja ruim, mas que este discurso possui intenções vendáveis bastante convergentes, ah, tem!

Meu intuito ao falar sobre este filme era expurgar os maus sentimentos que me tomam de assalto depois das manifestações deletérias da má personalidade do sociólogo vilanaz citado no início, mas, a fim de evitar conflitos desnecessários com pessoas que amo mas que insistem em defender a perfídia enfeitiçadora desta criatura, interrompo este arremedo de resenha com um pedido: vejam os filmes do Radu Mihaileanu e depois me digam se estou errado em ter medo de seu projeto de enganação pseudo-conclamante!

Wesley PC>

“ARACAJU NÃO É VILA NEM É POVOAÇÃO! É UMAS CASINHA DE PALHA COBERTINHA DE MELÃO...”

Na noite de ontem, uma desavença pessoal violenta atravessava a minha empolgação em comparecer ao III Festival Sergipano de Teatro, atualmente em voga no Estado. Ainda assim, resolvi conferir uma peça anunciada como “Praia, 1985” no panfleto informativo com a programação do evento. Convidei vários de meus amigos, mas, por motivos diversos, apenas um esteve ao meu lado.

Ao chegar ao local do evento – o Teatro Lourival Baptista – percebi que, na verdade, o nome da peça era “Na Praia, 1855”, baseada num texto de Lina Regina Nunes, encenada pelo Grupo História EnCena e protagonizada por um amigo conhecido por suas opiniões polêmicas. Perguntei-lhe por que ele não me avisara que estaria atuando. Ele deu uma resposta evasiva, mas simpática. Aguardei que o meu companheiro chegasse e, com quase meia-hora de atraso em relação ao horário agendado,  a peça iniciou...

Dirigida por Gustavo Floriano, que adentrou o teatro de forma impressionante, gritando os versos contidos no título desta postagem da platéia, antes de subir no palco e conclamar os seus companheiros de cena a hastearem bandeiras e cantarem um hino emancipatório. Duas personagens supostamente adolescentes, Cléo e Zoé, entravam em cena, com o intuito de realizarem uma pesquisa escolar sobre os motivos que justificaram a mudança da capital sergipana de São Cristóvão para Aracaju, em 17 de março de 1855. Daí para a frente, os demais integrantes do elenco representavam figuras marcantes da História do Estado em que nasci, como o mártir João Bebe Água e o estrategista Barão de Maruim, respectivamente, opositor e entusiasta da mudança da capital.

Apesar de a peça merecer elogios pela audácia musical (os integrantes da banda que executava os temas da peça estavam situados na platéia), ela pecou pela falta de entrosamento de alguns atores com os seus personagens (o intérprete de um padre são-cristovense incomodava pelo sobejo de afetação), pelas coreografadas desengonçadas e efetuadas sem vivacidade, pela obviedade de algumas referências legitimadoras a ícones da Indústria Cultural contemporânea (no caso, a enjoativa Verônica Voz e um pseudo-‘funk’ repetitivamente insuportável), pela sobrepujação dos efeitos de sonoplastia às vozes dos atores, pelos equívocos evidentes de iluminação e pela forçação de barra no tom didático do enredo, que, ao mesmo tempo em que evidenciava os aspectos encomendados da peça, indicavam que ela talvez fosse mais bem-sucedida se tivesse sido exibida à tarde, para uma platéia infanto-juvenil. No ponto de ônibus, inclusive, ouvi de uma desconhecida: “amei a idéia de ensinar sobre a História de Sergipe com tanto humor”. Eu concordei, mas nem todas as boas idéias da peça funcionaram, ao passo em que outras ficaram incompreendidas: qual o motivo de associar o mordomo da casa onde as duas adolescentes estudavam a uma combinação fantasmática (realçada pela trilha sonora) entre o corcunda Quasímodo, o mordomo Tropeço e zumbis andantes de um seriado norte-americano recente? Por mais que eu tenha desgostado desta opção tramática, quem estava ao meu lado na platéia foi taxativo ao indicar que o intérprete deste problemático personagem humorístico era o melhor ator em cena (o que ele se apressou em destacar que não era necessariamente um elogio – risos). Assim sendo, Joel Costa, sou obrigado a concordar com ele: tu foste bravio em sua entrega caricata ao personagem!

Terminada a peça, que parecia muito ruim no começo – em especial por causa dos desempenhos fracos do elenco, que bocejavam em cena e erravam os seus movimentos – “Na Praia, 1855” destacou-se positivamente pela quantidade valorizada de boas intenções e opções audaciosas de encenação (as cenas musicais, por exemplo, eram potencialmente ótimas!). O público pareceu apreciar o resultado, ao passo em que eu insisti em apregoar que, numa encenação mais cuidadosa e ensaiada, talvez a peça atinja com mais precisão os seus intentos. Mas, de antemão, a capacidade de divertir utilizando fatos poucos destacados de nossa História já é digna de aplausos. Parabéns para o grupo História EnCena, portanto!

Wesley PC> 

terça-feira, 2 de abril de 2013

PARA ALÉM (OU AQUÉM?) DO "DANONINHO DE MACHO"...

Apesar de bastante consagrada em alguns nucléolos alternativos, a cantora paulistana Ana Cañas ainda não conseguiu me atingir. Recentemente, passei a ouvir com atenção o disco "Hein?" (2009), apreciado por um rapaz que, surpreendentemente, é oscularmente interessado em mim. Por ora, a única canção que me flagrou  emocionalmente desnudado neste álbum foi justamente a mais famosa, a faixa 04, "Esconderijo":

"Procuro a solidão como o ar procura o chão
 Como a chuva só desmancha, pensamento sem razão 
Procuro esconderijo, encontro um novo abrigo 
Como a arte do seu jeito e tudo faz sentido
 Calma pra contar nos dedos, beijo pra ficar aqui 
Teto para desabar, você para construir"

Mais ou menos assim! Não duvido que, a partir de futuras audições do álbum, ele me fisgue um tantinho mais (um tantinho mesmo), mas, por ora, achei-o insípido, indigno de todo auê em torno da cantora!

Mudando de assunto, portanto, confessarei que, quando o ouvi pela pela primeira vez, eu havia acabado de levar a cabo uma pesquisa que tinha o intuito de descobrir de onde provinha o "Danoninho masculino" (risos). Era um chiste interrogativo, mas recebi respostas inspiradas de meus amigos: "da pinta", "do coração", "da cabeça"... E se este manjar de macho provier de todas estas partes ao mesmo tempo, hein?

Depois de realizar algumas atividades trabalhistas esporádicas, passei diante da casa de um amante regular. Perguntei à sua mãe onde ele estava, e ela me respondeu: "dormindo". "Faz tempo?", insisti. Ela disse: "ele dormiu agora!". Resolvi arriscar e adentrei a residência do mesmo, que mudava os canais de TV na escuridão. Ele jazia no sofá, de modo que não perdi tempo em alisá-lo, tão logo percebei que ele arreganhou as pernas para mim quando eu me sentei perto dele. De repente, o seu telefone toca. Era uma garota apaixonada por ele, com quem ele não falava há umas duas semanas. Fiquei contente que eles tivessem feito as pazes, mas, mesmo assim, não me esquivei de lambê-lo, de sugar com avidez o seu pênis. Iluminava o órgão com a lanterninha de meu celular, para ver melhor a beleza grossa daquela parte egrégia da anatomia masculina. Ele gemia e ofegava ao telefone. De repente, enquanto chamava a sua interlocutora de "meu amor", ele gozou abundantemente em minha mão, em minha boca... Não me senti culpado: ele se aliviou, ela se encantou, eu fui enfeitiçado! 

Ao chegar em casa, pus a Ana Cañas para tocar. Era a oportunidade ideal. Acabou de tocar a 'rocker' "Chuck Berry Fields Forever" (faixa 06, que emula Gilberto Gil, autor da letra original) e inicia-se agora "Gira" (faixa 07), que mais parece canção do Paulinho Moska. Tudo muito mediano, ao contrário do gozo noturno: além de sentir muito prazer em chupar o pau daquele menino, eu o amo ("o sexo é um efeito colateral do amor" - e vice-versa, intercederia em minha defesa o Domingos Oliveira). Está tudo em casa, portanto!

Wesley PC>

domingo, 31 de março de 2013

“O AMOR MATA! O AMOR MATA! O AMOR MATA!”

Faz muito tempo que li o conto “Dama da Noite”, do renomado escritor Caio Fernando Abreu (1948-1996). Apesar de me identificar bastante com o seu universo, este escritor não é dos meus favoritos. A estória citada é uma exceção nobiliárquica: emociona-me deveras!

Quando soube que a peça “Cabaré da Dama”, representada pelo Grupo Parque de Teatro, do Ceará, dirigido por um tal de Silvero Pereira, era baseada neste conto, ansiei para que meus amigos aceitassem o convite (feito às cegas) para estarmos no teatro nesta noite de Páscoa. Felizmente, eles aceitaram...

Quando entramos no teatro, música ‘tecno’ era executada altissonantemente. O tipo de música que embala baladas ‘gay’, aliás. Ficamos desconfiados: “será que isso vai prestar?”. Uma de minhas amigas quase desiste de entrar no teatro por causa disso. Mas ela insistiu: ela acreditou em nós. Porém, até mesmo nós ficamos relativamente desiludidos quando um mestre-de-cerimônias absolutamente afetado, intitulado Gisele Almodóvar, entrou no palco, começou a brincar com a platéia, fez piadas de gosto indústria-culturalmente duvidoso e apresentou diversos ‘shows’ de travestis, que ia de uma hilária paródia de “Holding Out for a Hero”, da Bonnie Tyler, até uma emocionada execução à ‘capella’ de “Non, Je ne Regrette Rien”, passando por várias canções tipicamente dubladas por ‘drag queens’, como a clássica “I’ve Never Been to Me”, da Charlene. Gargalhamos nalguns momentos, mas logo estávamos interrogativos: “onde é que o Caio Fernando Abreu entra nisso tudo?”.

Foi quando a luz se apagou, e apenas um ator sentou numa mesa improvisada no palco, com uma garrafa de cerveja, um interlocutor imaginário e muita, muita emoção. À medida que o monólogo se desenrolava, mais nos emocionávamos: parecia que trechos de nossas vidas eram encenados no palco (no meu caso pessoal, a descrição de um assédio sofrido na infância foi certeira!). Em mais de um momento, contive-me para não chorar, enquanto que, na platéia, pessoas sorriam fora de contexto. Talvez por – como bem interpretou uma amiga minha, a partir de uma fala muito repetida no texto do monólogo – estarem “dentro da roda”. Riam porque nunca haviam sofrido aquilo que era narrado...

Eu poderia me demorar aqui, citando trechos e mais trechos emocionantes da peça (quando, por exemplo, o solitário protagonista compara a morte a um copo vazio, que até o instante anterior possuía algo em seu interior), mas prefiro indicar o conto original. O que eu presenciei neste Domingo de Páscoa – “dia em que Cristo reviveu, linda a biba!”, como acrescentou o ator-personagem – deve ser experimentado em sua integridade, como eu e meus amigos experimentamos diante daquele palco molhado de cerveja, preenchido por rapazes zombeteiros que vestiam “calça ‘jeans’, camiseta preta e cabelo arrepiadinho”, exatamente como eu, em que, no momento derradeiro, o travesti se despe, mostra-se completamente nu, com o pênis escondido em suas pernas, formando uma vagina “sem essência”, enquanto outro travesti canta uma dessas canções ‘pop’ estadunidenses, cuja letra falava justamente em “deixar o melhor para o final”. Foi uma experiência emocionante: ainda estou sob efeito! Magnífica interpretação, belíssima atualização do texto original e encenação surpreendente, com uma construção impagável do clima cômico antes de a dramaticidade ser literalmente derramada. Uma das melhores peças teatrais que já experimentei na vida! Parabéns para quem esteve lá, viu, sofreu, se emocionou, gargalhou e, principalmente, sentiu... Sentiu na própria pele, como eu e meus amigos sentimos!

Wesley PC> 

“A RIQUEZA PRODUZIDA NAS MÃOS DE POUCOS EQUIVALE A MISÉRIA, ENQUANTO QUE A RIQUEZA PRODUZIDA NAS MÃOS DE MUITOS EQUIVALE A DISTRIBUIÇÃO DE RENDA”

Assim conclui o ex-presidente brasileiro Luís Inácio Lula da Silva no documentário canadense “O Mundo Segundo Lula” (2007, de German Gutiérrez), que vi há pouco. Assisti ao filme por acaso, para ganhar tempo enquanto comia panetone com café e me decidia acerca do que fazer à noite, mas apreciei a investigação do mesmo acerca das tentativas de intervenção internacional da política interna do ex-presidente, ainda em seu primeiro mandato, que, em mais de uma oportunidade, tentou se alinhar politicamente com países em desenvolvimento no afã por enfrentar as imposições hegemônicas do conchavo entre Estados Unidos da América e União Européia.

Paralelamente à exposição informativa, que também se vale de depoimentos filmados de Evo Morales, Jacques Chirac, Hugo Chávez e George W. Bush, entre ministros e outros políticos que eu não consegui identificar, o filme também entrevista transeuntes cariocas, que respondem o que acham sobre a tal participação lulista em eventos políticos internacionais. Uma das transeuntes reclama que ele viaja demais. Outra diz que não se sente representada por um presidente que sequer sabe falar inglês. Uma terceira diz que o apoio que o ex-presidente ofereceu ao Haiti, diante de uma tragédia, era demagógico, visto que, na opinião dela, “enquanto o muro de sua própria casa está caindo, a gente não pode ficar prestando atenção à casa do vizinho”. Ao final, tudo se encerra muito rápido (o filme tem apenas 52 minutos de duração), mas conseguiu passar o seu recado, ativar o meu interesse, emular um afeto renegado...

Wesley PC>