sábado, 27 de fevereiro de 2010

O CANTO DE UM CISNE

Antes de dormir, vi finalmente “O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus” (2009), último filme protagonizado por meu muso de celulóide Heath Ledger, dirigido pelo neo-surrealista psicodélico Terry Gilliam, que, aqui, volta aos bons tempos narrativos de “As Aventuras do barão de Münchausen” (1988), em que trocentas ações mágicas se acumulam em meio a uma estória de amor anacrônica. Na trama, o velho proprietário do mágico lugar-título deprime-se a cada dia com a proximidade do aniversário de 16 anos de sua filha Valentine (Lily Cole), prometida ao Diabo quando o Dr. Parnassus (Christopher Plummer) fez um acordo para dispor de vida terna ao lado de sua amada esposa, que morre no parto e transforma a eternidade num compêndio de lamentações. Valentina, por sua vez, é desejada por um companheiro de trupe, mas se entusiasma romanticamente quando conhece um desmemoriado à beira da forca (interpretado por Heath Ledger), que aos poucos vai se descobrindo como o fugitivo dono de uma instituição filantrópica suspeita. Ao final, tudo será explicado!

Para além de a confusão narrativa proposital do diretor e roteirista manipular à vontade as ínfimas imagens finais do extraordinário ator juvenil, foi uma opção genial utilizar os corpos de Johnny Depp, Jude Law e Collin Farrell para vivificar o mesmo personagem, quando imerso na situação mágica inebriantentemente fotografada por Nicola Pecorini, que já havia trabalho com o diretor nos igualmente alucinantes “Medo e Delírio” (1998) e “Tideland – O Mundo ao Contrário/ Contraponto” (2005), ambos falhos em seus roteiros sustentaculares. Não obstante este ser também um filme falho, a falha em si é mostrada como um problema inerente à contemporaneidade, que não mais respeita os loucos e visionários tão elogiados por Walter Benjamin, quando defende que nem sempre os surrealistas precisam consumir substâncias alucinógenas para serem geniais. A seqüência inicial, quando um arruaceiro britânico promete abandonar as bebidas alcoólicas depois que é cercado por águas-vivas animadas é bastante pontual enquanto discurso, no sentido de que Terry Gilliam, membro do egrégio grupo humorístico Monty Python, é um exímio defensor da imaginação a qualquer custo, dos mergulhos inconseqüentes no universo da fantasia, o que justifica a poluição visual de seus filmes, em especial os mais recentes.

Ao término da sessão, fiquei em transe, senti-me desmiolado novamente e guardei com carinho o sorriso de despedida de Heath Ledger (1979-2008), neste papel digno de seu talento. Foi uma vida interrompida, mas ele escolheu bem como gastá-la em seus decisivos momentos. Os viúvos do cinema têm ao menos isto como consolo!

Wesley PC>

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

E AÍ, ALINE, VAIS COMENTAR AGORA? ou OS ENFRENTAMENTOS DOMÉSTICOS DA VIDA COLETIVA

“Grande École” (2004, de Robert Salis) é um filme que fala sobre as agruras enfrentadas por um grupo de alunos que convivem juntos numa escola aburguesa. Dentre eles, há um homossexual enrustido que é desafiado pela namorada a dar em cima de seu melhor amigo. Porém, um imigrante de origem árabe se apaixona por ele e isto faz desencadear um trauma infantil, oriundo de quando seu pai impedia que ele brincasse com os pedreiros de uma firma. Pronto, está lançado o pretexto.

Vi o referido filme na tarde desta quinta-feira, quando estive de folga e visitei um amigo que estava recebendo outro amigo (só dele, não meu), que, por sua vez, estava interessado sexualmente nele, mas era rejeitado pelo mesmo em virtude de não atingir dois preceitos básicos de sua cadeia alimentar erótica (1- não fumar; 2- não ser gordo). Não sei que artifícios me tomaram num instante posterior à sessão do filme, mas forcei a retirada peniana de um deles e empurrei o órgão sexual na boca do outro. O esforço deu certo e, dentro em pouco, os dois estavam atracados sexualmente, enquanto eu estava na cozinha, bebendo guaraná com panetone. Na mente, a necessidade de comentar algo que me perturbou numa noite anterior: uma desagradável (para mim) reunião em Gomorra, onde o destino de dois novos moradores estava sendo decidido através de uma medida que um deles descreveu como “expulsão”. Fiquei tão amedrontado com a exaltação dos humores dos envolvidos na reunião que cheguei a esconder uma faca na geladeira, com medo de que algo de mais grave acontecesse. Tenho medo de brigas, por mais que eu já devesse estar acostumado a elas, de tanto que as mesmas me perseguem.

Minha querida amiga lúbrica Aline Aguiar alisava minha cabeça enquanto os moradores de Gomorra discutiam, e ela me perguntava se eu iria publicar algo sobre o assunto. Respondi a ela que sim, mas dentro de minha cautela diplomática recém-adquirida (a fórceps, diga-se de passagem), temo haver a necessidade de ser cauteloso. Não conhecia a razão enfurecida daqueles problemas amontoados, mas fiquei assustado. Apavorado, aliás. Tanto que são correndo no meio da reunião e corri para pegar um ônibus. Ao chegar em casa, visitei um vizinho que dormia e deitei-me aos seus pés. Precisava relaxar depois do ocorrido. Egolatria sensual resolve esse tipo de problemas? Queria que todos os meus amigos estivessem bem...

Quanto ao filme do Robert Salis, terminou me decepcionando com seu tom novelesco, com o excesso de tramas românticas ‘gays’ paralelas e com a forçação de barra sub-politizada, mas a beleza física e a nudez de Salim Kechiouche compensou!

Wesley PC>

SERÁ QUE EXISTE VIDA PARA ALÉM DAA?!?!?!





@line. bjossss

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

PAPEL HIGIÊNICO É MUITO POUCO HOJE EM DIA!

Sou da época em que os rolos de papel higiênico tinham 40 metros. Houve uma readaptação industrial do produto e hoje, os rolos têm 30 metros, disfarçados na embalagem e preço similar. Conclusão: o papel higiênico acaba cada vez mais rápido. Na manhã de hoje, por exemplo, limpei a bunda depois de defecar com tensão, visto que havia um pedreiro sobre a casa da vizinha, consertando um telhado e cantando músicas ruins sobre cachaça. Ao meio-dia, eu estava limpando a bunda novamente, antes de tomar banho, ouvindo um CD clássico do músico algeriano Khaled, datado de 1992, que contém as antológicas “Didi” e “El Arbi”. Foi um tanto consolador, dado que o pedreiro continuava reclamando em meu telhado.

Wesley PC>

A DIFERENÇA ENTRE RESPEITAR O PONTO DE VISTA ALHEIO E OUTRA COISA

Não responderei de imediato qual é esta outra coisa, mas sou agora pego de surpresa ao me perceber defendendo não somente um filme ruim ou um filme que não gostei, mas um filme que particularmente me enchia de repulsa comercial em virtude de tudo o que ele representa no plano capitalista. E, justamente por pensar nisso, é que eu sinto aqui a necessidade de defendê-lo: talvez ele seja mal-interpretado, talvez a sua culpa assumida pelos males do mundo atual impeça a dádiva da regeneração moral, a reabilitação significativa ou qualquer uma das impressões que tornem patente que estou aqui a tratar um filme como se fosse uma pessoa. Como um filme é o produto do trabalho de um conjunto de pessoas, talvez não seja uma prosopopéia crítica de todo negativa...

Vamos do começo: há alguns meses, atendi a um convite de minha mãe e vi os 5 filmes até então disponíveis da saga escrita pela J. K. Rowling. Detestei os filmes do Chris Columbus, abominei o capítulo conduzido pelo Mike Newell, fui seduzido pelo trabalho sensual de Alfonso Cuarón e, para minha própria surpresa, apreciei a segurança tramática no que se refere aos descaminhos da política corporativista no filme dirigido pelo até então desconhecido David Yates. Satisfeito que estava por descobrir seu talento recôndito, quis ver “Harry Potter e o Enigma do Príncipe” (2009), mesmo que minha mãe não mais insistisse para tal, e, vendo-o ontem à noite, decepcionei-me bastante com as ingenuidades proféticas do roteiro e com as indefinições tragicômicas de romances adolescentes, mas apreciei deveras a segura direção de David Yates (em quem, pelo visto, devo prestar mais atenção), a trilha sonora firme de Nicholas Hooper (que adolescentiza bem os temas de John Williams) e, principalmente, a ótima vivificação de Alan Rickman como Severus Snape, de longe o melhor personagem da série e que, conforme pude perceber através da fortuita leitura do último livro envolvendo o bruxinho-título, terá participação muito decisiva nos eventos narrativos que se seguirão ao fim anticlimático do filme ora resenhado.

Repetindo: “Harry Potter e o Enigma do Príncipe” é um filme modorrento, verborrágico e disrítmico, mas possui uma excelente equipe técnica sustentacular e, como tal, fez com que eu surpreendentemente abrandasse alguns dos conceitos negativos sobre ele impostos. O que mais me chocou, aliás, durante o acompanhamento espectatorial destes filmes e do livro que li, é que não é uma obra voltada para crianças, não obstante a autora investir em clichês tramáticos voltados a este público-alvo. Não que eu tenha me vendido à contemplação serial hollywoodiana, mas, de coração, enquanto filme, esta produção tem, para dizer o mínimo, um tantinho de alma aprisionada, conforme ficará mais patente para quem seguiu com bravura os longas-metragens antecedentes.

Em verdade, publiquei este texto noutro veículo cibernético, mas, ufa, precisava confessar. Algo está acontecendo comigo: estarei eu demasiadamente tolerante ao Capitalismo à medida que envelheço? Talvez seja tudo culpa dos sacanas que escrevem, produzem e lançam este tipo de filme e sabem que nós, eternamente atormentados por amores não-correspondidos nos identificamos com estes personagens identificados como vilões, mas que... Mas que... Temor, temor...

Wesley PC>

domingo, 21 de fevereiro de 2010

“PRAGA DE BAIANO” (1977) E NÃO SÓ!

“Tu és todo diferente: depois que acaba o carnaval é que tu pões isto!”. Isto foi o que comentou minha mãe quando eu comecei a ouvir o disco de Novos Baianos que se inicia com uma preciosa letra que diz: “Vamos bater os tambores, balançar as cadeiras, sacudir nossos pandeiros, que os dedos jamais foram feitos pra contar dinheiro, pra apertar gatilho”. Muito bom, não obstante causar estranhamento para quem nunca me percebeu ouvindo frevo instrumental em pleno domingo.

Em verdade, a necessidade de ouvir este álbum menos conhecido do excelente grupo baiano surgiu quando cheguei do cinema, onde estive vendo o novo filme da diretora paulista Anna Muylaert, “É Proibido Fumar” (2009), protagonizado pelos iluminados Glória Pires e Paulo Miklos. Fazia tempo que eu não via um filme tão simpático numa tela de cinema. É um filme inicialmente simples, sobre uma mulher e um homem que se conhecem, sendo quer ambos gostam de música. Ele reverencia Jorge Ben Jor. Ela reverencia Chico Buarque. Uma ex-amante dele se interporá no caminho romântico de ambos. Um atropelamento fatal diluirá o impacto naturalista/sentimental do filme, mas não diminuiu a minha empolgação evolvendo-o. São filmes como este que me fazem entender o porquê de esta “arte portátil” que atende pelo nome de Música ser tão essencial em nosso processo de sobrevivência no mundo. Recomendo!

PS: o filme está em exibição numa sala de cinema sergipana esta semana, em horário exclusivo das 14h. Vale a pena se programar para tal.

Wesley PC>