sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

DESABAFO NATALINO (SÓ PARA QUE NÃO ME DIGAM QUE SOU O CLICHÊ DE TODO ANO)

Pois é. Natal. Dia de festa. Famílias reunidas em todos os lugares. Meu irmão resolve se sentar sozinho em frente a nossa casa e começa a chorar copiosamente, dizendo que está sofrendo, que precisa de ajuda e que não é viado para se internar. “Quero me recuperar por mim mesmo”, repetia ele. E chorava e chorava e chorava. Fiquei ao seu lado, fazendo companhia, apenas assentindo com a cabeça a quase tudo o que ele falava. Não sabia o que fazer. De repente, ele começa a declarar o afeto por mim, que briga para me defender quando me chamam de viado na rua e coisas do gênero. E ele chorava. E eu pouco falava. E minha mãe se preocupava dentro de casa, achando que eu tomo o partido dele. E ele chorava mais e mais. E as pessoas nos interrompiam para desejar votos natalinos ou para sugerir que fossemos fotografados, já que não costumamos sentar juntos em público. Ok, bateu aquela tristeza. Puxa, como é difícil lidar com problemas familiares!

De repente, quando tudo parecia perdido, um carro desce em marcha ré na ladeira da rua em que moro e espreme um motoqueiro contra dois outros carros. O moço fica preso nas ferragens de um dos automóveis, clamando por socorro. Ambulâncias chegam e policiais tentam conter os ânimos exaltados dos parentes revoltados da vítima. São quase duas horas da manhã e os rádios são desligados para acompanhara melhor a confusão. Minha mãe interage com vizinhos com quem não fala cotidianamente para ter notícias. Meu irmão esquece tudo o que me falou aos prantos e se entrega ao consumo desenfreado de bebidas alcoólicas e ‘crack’, enquanto exclama: “isto só acontece na rua em que moro”! È natal, 25 de dezembro de 2009. E, por dentro, eu continuo rindo da mulher que se espantou quando eu disse que as pessoas não me confundem com o modelo Jesus Luz... Há que ser feliz – e meu irmão disse que era. Que bom (para ele)!

Wesley PC>

BEIJO NA LÁGRIMA (E PONTO RETICENTE)

Tenho uma amiga que amo chamada Juliana Aguiar. Conhecemo-nos num contexto de extremo frenesi e, como tal, imagino-a sempre agitada, dançante, imune a qualquer desesperança. Sempre que nos encontramos, dançamos exaustivamente, ao som do que quer que esteja tocando (mesmo que este som seja o puro silêncio). Divertimo-nos, em suma. Porém, mesmo e principalmente para pessoas como nós, o mundo se manifesta. E nem sempre o mundo é aquilo que estamos preparados para ver no intervalo entre um passo e outro. Na noite de ontem, Juliana estava chateada por perceber que as pessoas ao redor só conversavam sobre música. Tive certeza que o motivo de sua chateação não era este. Ela se ofereceu para me acompanhar até a praça do conjunto residencial em que moro, onde estava sendo montado o palco para um evento supostamente religioso. Enquanto o tal evento não começava, os bailarinos reproduziam coreografias vulgares na escadaria da igreja. Eu e Juliana abraçávamo-nos freneticamente. “Está vendo por que é importante estarmos juntos?”, perguntávamo-nos eu e ela, simultaneamente e de formas diferentes. Foi lindo. Quando eu e Juliana separamo-nos para ir para casa, encontrei alguns amigos de infância, que me perguntaram espantados como eu tinha coragem de deixar um amenina linda daquela sozinha. Ela não estava sozinha. Antes de dormir, havia uma mensagem dela esperando por mim no celular. Hoje, eu e ela estamos vivos – e em breve estaremos dançando novamente num palco perto de vocês!


Wesley PC>

“JESUS MORREU PELOS PECADOS DE ALGUÉM, MAS NÃO PELOS MEUS”...

Fotografada pelo genial Robert Mapplethorpe, esta capa de disco antecipa a audição de um dos álbuns mais seminais a que já tive acesso, o álbum que pariu nove décimos das minhas cantoras preferidas (de Fiona Apple e Tori Amos a Cat Power e Marianne Faithful, passando por PJ Harvey, Imogen Heap, Alanis Morissette e até mesmo Amy Winehouse). Quanto mais eu escuto “Horses” (1975), da onipresente Patti Smith, meu coração geme! A crueza de suas letras, a dureza e simplicidade de seus acordes, a pujança e coerência do álbum como um todo, tudo nele me obseda. Desde a manhã de ontem, inclusive, que repito insistentemente a faixa de abertura “Gloria”, que consola meus ouvidos e espírito quando relembro fatos recentes que podem me deprimir.

Oportunamente, a maior parte destes fatos aconteceu no meu local de trabalho, onde gasto a maior parte de minhas horas diárias. Na tarde de anteontem, estive a explicar para um rapaz cínico o motivo de estarmos com muitas pendências documentais em atraso, em decorrência de uma pane generalizada de uma pane no Sistema de Processamento de Dados da universidade. O rapaz interrompeu sem cerimônia o meu falatório dramático e apenas retrucou: “isto não me comove!”. Minutos depois, estava me desejando “um feliz natal e um próspero ano novo”. A resposta foi na lata: “isto não me comove”! Ave, Patti Smith:

“People say "beware!"
But i don't care
The words are just
Rules and regulations to me, me

I-i walk in a room, you know i look so proud
I'm movin' in this here atmosphere, well, anything's allowed
And i go to this here party and i just get bored
Until i look out the window, see a sweet young thing
Humpin' on the parking meter, leanin' on the parking meter
Oh, she looks so good, oh, she looks so fine
And i got this crazy feeling and then i'm gonna ah-ah make her mine
Ooh i'll put my spell on her
Here she comes”


Wesley PC>

QUEM DECIFRA O FIM DOS SONHOS?

Na noite de ontem, cochilei da hora em que cheguei do trabalho até as 23h. Coincidentemente, este era o horário em que iniciava a projeção do marcante filme “Pequena Miss Sunshine” (2006, de Jonathan Dayton & Valerie Faris). Aproveitei o pretexto e o fato de o portão de meu fornecedor habitual de sêmen ainda estar aberto para pedir que ele assistisse ao tal filme. “É muito bom, uma das estórias de minha vida. Te recomendo deveras”. Ele e a família toparam. Fiquei contente ao rever com eles aquele filme tão problemático mas que tanto me fez rir e chorar em igual medida. Ao fim da sessão, ingeri minha dose habitual de gala, direto da fonte. Fez-me bem.

Ao dormir, tive um pesadelo: o pai de minha sobrinha mais velha perseguia-me pelos telhados, pois não queria que eu a engordasse. Havia um juro altíssimo que separava o local em que eu e ele morávamos. Escondi-me na casa de uma vizinha com micose nas pernas. Quando descia do ônibus, um irmão falecido do meu cunhado assassino aguardava-me com um cutelo nas mãos. Um dos antigos amigos de consumo de maconha do meu irmão caçula me protege, pedindo que eu segurasse a sua faca e seu pênis magro em igual medida. Mas eu continuava com medo e sentindo-me desprotegido. Sabia que meu cunhado observava-me de cima do telhado de minha casa. Escondi-me debaixo da cama e, depois de muito tempo, acordei. O que teria sido isso? Algum aviso?

Na foto, uma das mais belas e surpreendentes cenas do filme. Os diretores do filme são especialistas em videoclipe e o roteiro do mesmo é repleto de odes familiares disfarçadas. Porém, a cena não é estragada. A pureza dos sentimentos demonstrados ali é feita em pleno silêncio. Sem musiquinhas ternas ou triunfalistas, sem frases de efeito clicheroso, sem estragos realistas. Apenas um abraço sincero e a reconciliação, num momento em que um dos poucos sonhos do personagem masculino (Paul Dano) estava estraçalhado para sempre. Maravilha de filme!

Wesley PC>

domingo, 20 de dezembro de 2009

DOSSIÊ (FINALMENTE) COMPLETO: DANNY BOYLE!

Nascido em 20 de outubro de 1956, o britânico Danny Boyle dirigiu oito longas-metragens até hoje. Destes, eu tinha visto sete até o início deste domingo e, para além da irregularidade qualitativa de suas produções, sou fã do diretor, em virtude de seu estilo ‘pop’ arrojado e do tema recorrente em suas produções: a premência da individualidade em meio à identidade grupal de alguém. Com exceção de “Quem Quer Ser um Milionário?” (2008), que aborda o tema de maneira um tanto escapista e popularesca, todos os filmes anteriores do diretor abordam este dilema de forma muito coerente e, visto que tive a honra de finalmente ter visto o elogiado “Sunshine – Alerta Solar” (2007) na tarde de hoje, cabe comentar cada filme, elogiosamente:

· “Cova Rasa” (1994): brilhante filme de estréia, em que três companheiros de quarto (um jornalista, um contador e uma médica) resolvem alugar um cômodo vago em sua residência a um estranho, que morre misteriosamente, deixando uma mala repleta de dinheiro da máfia sob a cama. As cenas repletas de violência e humor negro que acompanham os 89 minutos deste filme fazem com que repensemos extraordinariamente o que é amizade, conforme comentei noutra oportunidade, cheio de entusiasmo, aqui mesmo no ‘blog’;

· “Trainspotting – Sem Limites” (1996): um dos filmes mais seminais da década de 1990, este filme foi meu companheiro definitivo na época de ensino ginasial. Revia-o de mês em mês e não conseguia encontrar defeitos nesta obra eufórica sobre os prazeres e desprazeres da heroína (e do universo material psicodélico como um todo). O que torna este filme superior a quase qualquer outra obra que tenha abordado a complicada questão das drogas e/ou “expansores do músculo cerebral” é que ele não julga seus personagens. Estes o fazem por si mesmos, quando conveniente, seja numa conjunção de impotência sexual + diarréia, associada à bebedeira, seja no que diz respeito a quem seria amigo de verdade, levando à frente o tema do filme anterior, com o qual compartilha o excelente protagonista, Ewan McGregor;

· “Por Uma Vida Menos Ordinária” (1997): ainda com Ewan McGregor encabeçando o elenco, este filme recebeu críticas dos admiradores do cineasta, que temiam que ele tivesse se rendido a Hollywood, em virtude da leveza do tema, sobre um funcionário de banco que se apaixona pela filha (auto-)seqüestrada de seu chefe. Ainda que o susto inicial faça sentido, a bela trilha sonora do filme (encabeçada por R.E.M., Elvis Presley, Luscious Jackson, Ash, Underworld e Elastica), as ótimas interpretações do elenco e as situações inusitadas envolvendo luta de classes e anjos rebaixados dignificam o filme, fazendo com que percebamo-nos ainda bastante coerente em relação aos dois filmes anteriores;

· “A Praia” (2000): agora sim os temores dos fãs fazem sentido! Substituindo o companheiro habitual por Leonardo DiCaprio, o diretor se equivoca em muitas seqüências deste filme, que prega que a utopia à base de maconha e comida natural que os três mochileiros do filme encontram na Tailândia perdura até que a ambição livremente associada à vida em sociedade deslanche. Ou seja, se analisarmos o filme teoricamente, percebemos que ele é, sim, muito válido e interessante, merecendo revisões que fazem com que percebamos sua qualidade ao longo do tempo. No elenco, Virginie Ledoyen e Tilda Swinton brilham como interesses românticos diversificados do protagonista, que, em seqüências inspiradas, imagina-se como um herói de ‘videogame’, ao som de uma canção remixada do Blur;

· “Extermínio” (2002): protagonizado por um novo ator-fetiche do diretor, Cillian Murphy, este filme é um daqueles que considero um dos mais astutos olhares sobre o pós-modernismo (ou o que quer que estejamos vivendo agora). Mais do que ser uma ficção científica que mostre os efeitos destrutivos da ira, esta pungente obra pergunta-se como é possível que desejemos sobreviver num contexto em que “não há mais nenhum livro que não tenha sido escrito, nenhuma música que já não tenha sido composta, nenhum filme que já não tenha sido rodado”. Quanto mais o revejo, mais percebo o quanto ele é inteligente, inclusive, mais uma vez, em sua abordagem ambígua (leia-se: complexa) dos ônus e bônus do uso de drogas;

· “Caiu do Céu” (2004): talvez o melhor filme sobre catolicismo et alli. realizado em língua inglesa, este filme revive o pessimismo esperançoso de antes em duas crianças que encontram uma maleta repleta de libras, dinheiro que será inutilizado com a aplicação definitiva do Euro como moeda européia. A urgência dos garotos em gastarem o dinheiro entra em conflito com a fé extremamente hagiográfica de um deles, que anseia por utilizar a fortuna proibida e decadente da forma mais democrática possível, quiçá acabando com a fome na África. Na (como sempre) ótima trilha sonora, duas preciosidades: a amarga “Blackout”, do Muse, até hoje um das músicas ‘pop’ mais tristes que ouvi; e a idílica “Nirvana”, de El Bosco, que valida pro completo o mistério que circunda aquilo que parece (repito: parece) um final feliz;

· “Sunshine – Alerta Solar” (2007, vide foto); recém-assistido e ainda parcialmente digerido, este talvez seja o filme em que Danny Boyle menos exercita seus virtuosismos de câmera e montagem, mas o roteiro do colaborador habitual Alex Garland permanece brilhante. Em dado momento, estamos obrigados a responder, junto aos personagens, como “pesar a vida de alguém contra o destino de toda a humanidade”. No elenco, ótimas interpretações de Chris Evans, Cillian Murphy (novamente) e a especialista em ‘kung fu’ Michelle Yeoh, magnífica como a ecológica Corazón, responsável pela conservação do oxigênio necessário para que a nave Icarus II consiga alcançar o Sol, com o intuito de reanimar a estrela moribunda;

· E, por fim, “Quem Quer Ser um Milionário?” (2008, co-dirigido por Loveleen Tandan), decepcionante incursão pelo rentável circuito cinematográfico bollywoodiano, em que retrata a ascensão midiaticamente meteórica de um favelado, que sobrevive ao preconceito religioso, à prostituição e ao tráfico de drogas e se torna um astro televisivo, mesmo que seja parcialmente alfabetizado. Mesmo sendo um filme com uma ingenuidade atroz e quase imperdoável, ele recebeu inúmeros prêmios ao redor do mundo, o que fez (agora sim, logicamente) com que os fãs do diretor se preocupassem com a sua rendição a um sistema emburrecedor de produção fílmica. Os atributos técnicos do filme, entretanto, são excepcionais e, como tais, evitam que o filme seja um fracasso completo. Pode parecer que não, mas Danny Boyle ainda está lá...

E é isso: que venham os próximos filmes: o próximo título a ser confirmado é “127 Hours”, sobre a história real de um alpinista obrigado a amputar seu próprio braço para sobreviver a uma escalada calamitosa, previsto para ser filmado em 2010. Por enquanto, mantenho a minha crença: Danny Boyle é um gênio pós-moderno!

Wesley PC>

UM SÁBADO BOLLYWOODIANO

Fazia tempo que eu não via um daqueles filmes indianos tipicamente proveniente de Bollywood,estatisticamente divulgado como sendo o maior produtor de filmes por ano do mundo. Ontem, por uma casualidade qualquer, tive acesso a “Saawariya – Apaixonados” (2007), de alguém chamado Sanjay Leela Bhansali, um filme com quase 2h30’ de duração, com todos os vícios atrelados à tal Bollywood: músicas e dança de 10 em 10 minutos (o que, infelizmente, não foi legendado pela emissora que exibiu o filme), atores canastrões, tramas românticas e evasivas (ainda que esta aqui seja triste e baseada num romance dostoievskiano!) e cenários propositadamente artificiais. Porém, o que mais me chamou a atenção no filme foi uma cena estranhíssima, na qual o protagonista Ranbir Kapoor dança de toalha. Não que ele fosse alguém sensual, mas o uso adequado da dança do ventre (numa variação obviamente masculina) e uma tolha que era aberta e fechada sem motivo fez com que minha imaginação voasse. Fiquei imaginado, então, o que teria acontecido com os milhares de espectadores acima dos 10 anos de idade, que era a censura do filme (risos).

Falando sério: até que tive acesso a ótimos filmes indianos (sendo os do mestre Satyajit Ray os mais célebres destes), mas “Saawariya – Apaixonados” desaponta pela pretensa exportação forçada de seu conteúdo, desdenhando de todo o poderio cultural indiano e cedendo aos modismos exóticos que tornam cada vez mais vendáveis aquele tipo de dança e vestuário em que, não importa o contexto, “a barriga sempre está descoberta”, conforme bem percebeu minha mãe Rosane. Ainda assim, a sessão foi válida, não obstante sábado não ser um bom dia para se equiparar com amores não-correspondidos alheios! A propósito, que estranha tradição justifica que um homem soque o ar enquanto se declara apaixonado pro alguém? Só vendo o filme para saber...

Wesley PC>