sábado, 10 de julho de 2010

UMA MÃO EM PRIMEIRO PLANO E DEPOIS DUAS E DEPOIS A COMPARAÇÃO ENTRE O TAI-CHI-CHUAN E O CASAMENTO...

No Brasil, o título do primeiro longa-metragem do diretor formosino Ang Lee, “Pushing Hands” (“Mãos que Empurram”, em tradução literal), foi lançado como “A Arte de Viver” (1992). É uma péssima transmutação idiomática, mas diz muito sobre o que o filme nos causa: um estalo ativo que intersecciona a arte marcial levada a cabo pelo protagonista (o Tai-Chi-Chuan, descrita por alguns como “uma forma de meditação em movimento”) e o modo como conduzimos as nossas vidas pessoais, em relação aos problemas de convivência que volta e meia se manifestam em relação a outrem. Nem é um filme tão bom, acrescento, mas, puxa, como fez sentido adormecer após a sessão desta singela produção cinematográfica num dia em que tive que chamar um funcionário da UFS de demente por causa do modo como este me tratou no trabalho.

Explico o contexto: como nós trabalhamos até as 23h na quarta-feira, tivemos direito a um dia de folga. Minhas companheiras de serviço optaram pela sexta-feira, mas eu preferi folgar no primeiro dia útil da semana que vem. Conclusão: trabalhei sobremaneira neste dia 9 de julho de 2010, a fim de compensar os atrasos no serviço que se acumularam no DAA. Pois bem, estava lá eu, diante de uma fila considerável de pessoas para serem atendidas, quando um afetado de quinta categoria, daqueles que maculam qualquer luta por direitos homossexuais, pede que eu interrompa o que estou fazendo para procurar um processo seu. Disse para ele esperar, ao que ouvi em retorno: “se fosse para esperar, eu não teria falado contigo”. Subiu-me uma raiva tão grande neste momento, que não me contive. Levantei-me e gritei: “não é assim que se fala com as pessoas não, seu demente!”. No minuto posterior, outra pessoa estava atendendo-o fora da fila. Grrrrrrrr! Ah, se eu tivesse visto o filme de Ang Lee antes...

Como só tive acesso ao VHS que continha “A Arte de Viver” por volta das 20h, só pude relaxar diante deste filme gracioso em que quase nada acontece na superfície às 23h, quando jantava depois de ter visto um vizinho apaixonante jazer no sofá de sua casa, destroçado pelo excesso de trabalho. No filme, uma cena curiosa: em dado momento, uma amiga da nora irritada do protagonista (vivido maravilhosamente bem por Sihung Lung) pede para falar com ele, visto que o acha simpático, mas ele se recusa terminantemente a vê-la. Mais tarde, descobrimos o porquê: ela fora uma militante maoísta em sua época de universidade e agora trabalha como corretora de imóveis, ao que julga o filho do protagonista, irritado ao constatar que “pior do que um ex-comunista é uma comunista transformada em capitalista”. E, à medida que o filem avançada, o título internacional do filme fazia mais e mais sentido: mãos se imbricavam, se tocavam, curavam, massageavam, empurravam... E, ao final, como sói acontecer, sentia-me apaixonado!

Wesley PC>

quinta-feira, 8 de julho de 2010

NO MEIO DO DESENHO, HAVIA UMA FRASE AO LADO DE UMA FIGURA FEMININA: “SINTO MUITO”

“Cismei outro dia e quis me suicidar
Fui me atirar do Viaduto do Chá
A turma que passava não queria deixar
A vida pro meu lado estava má

Consciência pesada me mandava pular
Consciência pesada me mandava pular

Resolvi então saltei
O carro que passava eu achatei
Minha cabeça se esfacelou
E o chofer lá de dentro gritou:
- O viaduto quebrou
Ou alguém louco ficou”


Esta é a letra de “Suicida”, faixa 1 do compacto “O’Seis” (1966), banda da qual os três abilolados mais geniais da música brasileira participaram antes de formar Os Mutantes. É ou não é algo suficientemente premonitório para quem sabe o que aconteceu com Arnaldo Baptista em 1982?

Digamos que eu finalmente consegui ver “Lóki – Arnaldo Baptista” (2008, de Paulo Henrique Fontenelle) na íntegra e, insisto acerca do que disse antes: não obstante ser convencional enquanto documentário, é um ótimo filme. Merece ser visto por qualquer um que se interesse pela indistinção determinante que existe entre vida pessoal e vida artística quando se biografa o gênio que intitula o filme. Se eu já era antes, agora me tornei devoto. Se já considerava “Lóki?” (1974) uma obra-prima – mesmo sem gostar muito de “Honky Tonky (Patrulha Espacial), a faixa instrumental número 05 – agora tenho este disco como uma verdadeira bíblia musical. Divino, literalmente!

De resto, os minutos que me faltavam ver do filme só confirmavam o que já sabia, conforme intitulei na postagem anterior: a devoção romântica da fã Lucinha Barbosa, com quem ele se casaria, é realçada; Zélia Duncan e o espetáculo londrino de 2006 é mostrado; e outros famosos fãs da banda (Sean Lennon, Kurt Cobain, John Ulhoa) dão valiosas contribuições ao rico material coletado pelo filme. Só faltou a Rita Lee, mas todos sabem o porquê de sua sentida ausência, afinal compensada pela metonímia de tinta que o compositor pinta ao longo dos 120 minutos de projeção do filme: ela esteve lá, do começo ao fim, ela esteve lá!

Wesley PC>

NÃO BASTA SABER COMO TERMINA, EU QUERO VER! (OU DE COMO ARNALDO BAPTISTA ABRIR A BOCA PARA DIZER QUE A TRISTEZA COLORIU SUA VIDA MEXEU COMIGO!)

Acordei cedo hoje para ver “Lóki – Arnaldo Baptista” (2008, de Paulo Henrique Fontenelle), documentário que eu havia gravado faz um tempo, mas que, até então, não havia encontrado a oportunidade ideal para assisti-lo. Hoje seria esta oportunidade, mas o meu videocassete aparentemente degringolou de vez. Pior: ele estragou quando a fita VHS ainda estava na metade do filme, de maneira que só assisti a cerca de 1 hora do mesmo. Vi os depoimentos de Rogério Duprat e Devendra Banhart, entre outros, tive a impressão de que Rita Lee não será entrevistada pela equipe, pude conferir fotos de infância e adolescência dos irmãos Sérgio e Arnaldo e conheci preciosidades musicais de artistas diretamente relacionados ao grupo, incluindo-se aí o primeiro álbum solo da Rita Lee (“Build Up”, de 1970) e de O’Seis, agrupamento pré-Os Mutantes, com três integrantes a mais. Já me predispus a ouvir as canções mencionadas nas entrevistas e imagens ainda hoje, mas... E o restante do filme? E a continuidade da trajetória singular deste gênio que intitula o filme? Quando verei? Chuif, chuif...

Que seja, enquanto providencio alguma maneira desesperada para limpar o cabeçote derradeiro de meu videocassete, conformo-me em ter visto pelo menos a metade inicial do filme, em que soube o que precisava saber sobre a origem, desenvolvimento e ruptura d’Os Mutantes. Digo mais: para além de toda a genialidade do grupo, de ter sabido que o Sérgio Dias era um virtuose ou ter conhecido um pouco mais sobre os demais integrantes da banda, sou um romântico inveterado e, como tal, o que me fisgou mesmo foi a descrição dos prolongamentos depressivos do término do relacionamento entre o protagonista do filme e sua amada Rita Lee. Companheiros de trabalho e convívio comentam que flagraram o artista chorando e/ou lamentando-se várias vezes a perda de sua esposa e, apesar de conhecermos duas de suas mulheres posteriores – incluindo Lucinha Barbosa, atual e abnegada – é o espectro da saudade afetiva de sua musa que permanecerá afligindo Arnaldo Baptista, conforme detectamos nas entrelinhas do que ele pinta, atividade artística esta que desenvolve terapeuticamente desde que se recuperou do coma decorrente de sua tentativa de suicídio no começo da década de 1980, quando pulou do quarto andar de um hospital. Será que acontecerá algo parecido comigo um dia? Tomara que não...

Esteticamente, poder-se-ia reclamar que o trabalho de Paulo Henrique Fontenelle é trivial, que o modo como ele aglutina as entrevistas não supera o tradicionalismo desse tipo de abordagem e que o que chama a atenção mesmo é a riqueza conteudística do biografado, mas não ousarei dizer isso: até onde eu vi o filme, posso considerá-lo ótimo sem qualquer despudor. Ótimo mesmo! Não obstante a ausência de Rita Lee ser crucial, até mesmo por vias involuntárias, isto funciona como incremento discursivo-sentimental. Estou gostando mesmo. Se eu conseguir ver o restante, prometo que venho aqui comentar...

Wesley PC>

quarta-feira, 7 de julho de 2010

...OU DE COMO CHUPAR UM PAU EQUIVALE EM PRAZER À AUDIÊNCIA DE UM FILME IMPRESSIONISTA

Capítulo Ia: depois de muito esperar, a visitante indesejada (não sempre, mas naquele momento em pauta) dirige-se a sua residência. Terreno livre para uma troca assimétrica de experiências sexuais: um fica deitado fingindo que presta atenção à TV, o outro cheira os pés de seu interlocutor carnal, lambe seus testículos e cada centímetro de seu pênis, que triplica de tamanho em sua boca. Detalhe: numa imaginária taxonomia de papéis eróticos, quem mais exerce esforço físico é aqui tachado de “passivo”, mas, levando-se em consideração que quem chupa e quem é chupado sente prazer, importa o nome?


Capítulo Ib:
23h45’: “êtcha péla, quase meia-noite já. Daqui a pouco, minha mãe me telefona!”. Silêncio no cômodo ao lado: “hora de agir”. Ereção de um lado, ereção do outro. Ereção controlada e disfarçada, em virtude da (in)conveniência de um lado. O mesmo acontece do outro. Esfregar um órgão sexual, por cima do calção, com o nariz já era suficiente para validar a noite erótica, mas o tempo reservava mais. E mais. 10 minutos depois, um saudável gargarejo de sêmen escorria pela garganta daquele que escreve. E foi bom. E pouco importa que o sexo seja considerado uma coisa suja. Escrevi na agenda: “estou contente”!

Capítulo II (passado): revi “O Fazedor de Tempestades” (1947), de Jean Epstein. Temia uma prova intimidadora no dia seguinte. Estava cansado. Escolhi este filme por causa de sua curta duração, mas ele é lindo, ele dói, mesmo sendo afagador de nossos sentimentos. Sentir e estudar são coisas diferentes? Amar e memorizar um texto imenso são atitudes concorrentes? Preocupar-me, em primeira pessoa, com a mocinha que espera o retorno de seu amado lançado ao mar num dia de tempestade e decorar os princípios da objetividade jornalística diferem em princípio? Pelo sim, pelo não, deu certo: cochilei enquanto via o filme (que dura somente 22 minutos, mas, puxa, como eu estava cansado!), mas despertei a tempo de rebobiná-lo e consumir toda aquela poesia como se fosse a primeira vez!

Wesley PC>

terça-feira, 6 de julho de 2010

SEGUNDA POSTAGEM MUSICAL DO DIA: PODE SER QUE SEJA CARÊNCIA, MAS É PROTESTO PASSIONAL!

Sei que esse texto vai parecer um fac-símile do anterior, mas descobrir a banda paulista Ludovic neste último fim de semana é lago que fez bem não somente aos meus sentidos, mas também ao meu ego.

“Meu coração é oco, eu já não tenho dúvidas
Um detalhe importantissimo provado por a mais b
Meu coração é oco, mais meu coração é seu
E o motivo do meu choro é saber que meu coração é pouco pra você”


Tais versos correspondem à abertura de “Vane, Vane, Vane”, faixa 04 do excelente álbum “Servil” (2004), que, apesar de ser imediatamente categorizada por alguns ouvintes como sendo correspondente ao subgênero “emo”, mais parece um complemento hodierno do ‘punk’, tamanha a crueza do som, em correspondência com a virulência sadomasoquista da letra apaixonada. Não preciso nem dizer que a identificação foi total e que gemi – literalmente! – de gozo na estrofe seguinte, quando esta introdução sussurrada é substituída por gritos repetidos e quase violentos: “azar o seu, querida!”

“De que vale tanto esforço?
Afinal a quem devo impressionar?
A quem devo impressionar?
Constrangedor é pouco, meu coração é seu
É realmente doloroso saber que isso soa tão cafona pra você”


Quanto mais eu repetia a canção e ia aprendendo a letra da canção, vinha-me a dúvida platônica: “será que eu compus isto e não sabia?”. A resposta veio através do compositor Jair Neves: eu não consigo evitar!”. Conclusão: Ludovic entrou para o panteão de minhas bandas brasileiras contemporâneas favoritas, certeza esta que se confirma de todo na última faixa do disco, apropriadamente intitulada “Mais um Vexame Para a Minha Coleção”. Segue letra na íntegra:

“Outra das minhas recaídas exemplifica idiotia
Exemplifica com tanta perfeição
Os pés pelas mãos
E então eu insisto no bordão
Obrigado pela atenção
Meu segredo, minha única diversão
Me perdoe sem que eu tenha que pedir perdão
E o criado cai em si”


É ou não é uma letra que merece o apelido de “história da minha vida”?

Wesley PC>

CIÚME NÃO! O TEMA NÃO É ESTE!

Nos últimos dias, “Rid of Me” (faixa inicial e disco homônimo da PJ Harvey) tornou-se minha companheira musical dominante. Vários de meus dias começaram e se encerraram ao som desta canção, que oscila entre o sussurro e o grito, entre a revolta e a lamentação, entre a ameaça e a automutilação. Fabulosa!

“I beg you my darling
Don't leave me
I'm hurting”


Ora a compositora ameaça torcer a cabeça de seu amado, ora ela suplica que alguém lamba as suas pernas, pois ela está em chama. No geral, ela grita que está sofrendo, que etsá angustiada e que o homem que ama não conseguirá se livrar dela, generalidades estas que tornam a canção tao genial na forma quanto no conteúdo. Obra-prima!

Para meu desconforto, porém, estou com um leve entojo anglofílico, que me impede de consumir com mais vigor o restante do disco, mas é uma obra essencial do ‘rock’ contemporâneo e está servindo muito bem como trilha sonora de meus dias hodiernos, marcados pelo sobejo de trabalho, pelas exigências universitárias de final de semestre, pelas dificuldades de obtenção espermática decorrentes dos avanços de uma vizinha espevitada e pela vontade – sempre ela, vontade que jamais se afasta de mim!

De resto, “Rid of Me” é um disco que ainda contém petardos soberbos como “Man-Size Sextet” e “Dry”. Recomendo, portanto!

Wesley PC>

domingo, 4 de julho de 2010

“PARA MIM, SÓ EXISTE SALVAÇÃO NA BOCETA E NA CANNABIS: PODE ESCREVER ISSO NO MEU TÚMULO!”

Logo no começo, esta frase, algumas comparações entre a programação do Cinemark em Aracaju e Cinemark em São Paulo ou Belo Horizonte, e o meu próprio estado de espírito confuso por causa do modo hostil como fui tratado quando fui pedir a um vizinho que assistisse a este filme comigo, tendiam a fazer com que o meu parecer sobre o mesmo fosse demasiado espalhafatoso. Mas o filme me surpreendeu. E eu precisei de alguns minutos de silêncio para me sentir apto a falar qualquer coisa sobre ele...

(...) – SILÊNCIO

No viés publicitário, este filme é vendido como um triângulo amoroso que se forma entre três estudantes universitários: um é estudante de Medicina (Caio Blat), usuário de várias drogas e despolitizado, não obstante repetir com insistência o jargão que intitula o filme; o outro (Alexandre Rodrigues) é estudante de Ciências Sociais, melhor aluno da classe, crente de que precisa sempre “provar que é o melhor” porque é negro e apaixonado por sua namorada; que é a outra, aquela que se interpõe bem-intencionadamente entre os dois amigos (Maria Flor), que é estudante de Arquitetura, que se dá bem com os pais e que entra em contato com um choque de classes e injustiças sociais que, até então, não atrapalhava o seu embasbacamento diante de algumas construções arquitetônicas do Rio de Janeiro. Para mim, era suficiente!

Para além deste triângulo amoroso sutil, o filme é vendido como um despertar consciencioso por parte dos três protagonistas, visto que um deles, o que estuda Medicina, afeiçoa-se a uma paciente leucêmica com quem divide cigarros de maconha e promete ajudá-la a rever os filhos, sem saber que um deles foi morto e que o outro está sendo procurado pela Polícia. Para mim, isto não era suficiente!

Entre o triângulo amoroso que se instaura e a consciência social forçosa dos protagonistas, que também serve como uma válida crítica à falibilidade prática do que é ensinado nas universidades (e que seria o ponto que eu abordaria com mais ênfase, se não fosse surpreendido por outros aspectos qualitativos do mesmo), o filme prova-se como um inteligente petardo contra a decadência institucional que faz chafurdar os projetos de assistência social não somente no país em que vivemos, mas no mundo capitalista como um todo. Digo mais: antes de o filme começar (foi exibido na TV Brasil, às 23h41’ deste sábado), foi exibida uma entrevista com o presidente Luís Inácio Lula da Silva, que explicava o quanto é importante transformar os habitantes de países pobres como Guiné-Equatorial ou Angola em consumidores. “Os empreendedores não percebem que, ao fazer com que os habitantes destes países possam circular num ‘shopping center’, isto fará muito bem aos países ricos”, disse o presidente. E eu quedei espantado com a crueldade da lógica mercadológica que ele apregoava como positiva...

“Proibido Proibir” (2006, de Jorge Durán) é um filme impressionante! Não parecia, mas é. E, como tal, faria muito bem se fosse exibido no mesmo ambiente universitário que fustiga. Mas, como o roteiro pessimista/realista do mesmo ensina-nos que “pedir demais do Governo” pode ser tão ou mais insensato que se esbaldar com LSD durante uma aula de Anatomia, consolo-me ouvindo a música que tão bem metonimiza as esperanças naufragadas dos protagonistas em pontos cruciais do filme, “Juízo Final”, de Élcio Soares e Nelson Cavaquinho:

“O sol há de brilhar mais uma vez
A luz há de chegar aos corações
Do mal, será queimada a semente
O amor será eterno novamente

É o Juízo Final, a história do bem e do mal
Quero ter olhos pra ver, a maldade desaparecer”


Quem me dera ter estes olhos...!

Wesley PC>