sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

NÃO FOI POR ACASO QUE MEU MELHOR AMIGO SONHOU COM CABEÇAS EXPLODINDO ANTES DE EU OUVIR UM DISCO CONTEMPORÂNEO DO WALTER FRANCO E FOI AINDA MENOS POR ACASO QUE, TENDO FALTADO AULA DA GRADUAÇÃO NA MANHÃ DE HOJE, LI UMA ENTREVISTA COM SHINYA TSUKAMOTO...

Um DVD em que estava contido “Tetsuo, o Homem de Ferro” (1989, de Shinya Tsukamoto), que ganhei de presente de uma grande amiga, estava acondicionado em minha casa faz tempo, mas, apesar de sua empolgação ‘cult’ diante do filme, ao qual ela me recomendava como fetichistamente homossexual, nunca havia me disposto a conferi-lo. Na manhã de hoje, um mal-estar súbito me impediu de acordar a tempo para uma aula enfadonha (não por seu conteúdo, mas pelo tom expositivo monocórdio do professor) de História do Jornalismo Brasileiro, de modo que, ao folhear uma revista ‘pop’ sobre cinema, me deparo com uma entrevista sobre alguém que era antonomasiado como “o samurai trash do cyberpunk”. Tratava-se justamente de Shinya Tsukamoto. Conclusão: tinha que ver “Tetsuo, o Homem de Ferro” ainda hoje!

Para além de uma ou outra pendência, a curta duração (apenas 67 minutos) do filme permitiu que eu o visse antes de realizar alguns pagamentos bancários literários, de maneira que, tendo visto o filme há mais de uma hora, ainda estou me digladiando internamente comigo mesmo acerca de qual nota atribuí-lo: com certeza, será superior a 8,0, não obstante eu admitir e insistir que o roteiro incoeso do filme surge como leve empecilho para que eu me demonstre passionalmente arriado pelo que vi na tela. As influências de David Cronenberg são absolutamente perceptíveis, bem como as de Katsuhiro Otomo [cuja obra-prima “Akira” (1988), possui também um protagonista chamado Tetsuo, muito assemelhado a este]. Se eu pudesse resumir o filme em apenas uma linha, diria que se tratava de um videoclipe estendido e instrumental de bandas como Laibach ou Rammstein, dirigido por cineastas como Andrzej Zulawski ou Jörg Buttgereit, além dos dois já citados. Mas o filme, felizmente, não se resume a isto!

Magnificamente fotografado em preto-e-branco granulado, o arremedo de trama de “Tetsuo, O Homem de Ferro” acompanha o desespero de Tomorowo Taguchi, que, depois que é atropelado e abandonado na rua, tem partes metálicas (enferrujadas) inseridas em seu corpo, num contexto que não é muito bem explicado, mas que rende conseqüências infecciosamente bélicas ao final. Perseguido por alucinações pavorosas, este ‘cyborg’ cotidiano japonês estupra a sua namorada com a broca que sai de sua zona genital e, completamente transmutado em máquina bizarra e oxidada, confronta o seu (re)criador, num desfecho que visa “enferrujar todo o mundo, até que este seja reduzido a poeira”. Durante e após a projeção, meu segundo impulso foi expor as muitas falhas do filme, mas, deslumbrado que eu sou, cedi ao primeiro impacto e me encantei com a beleza suja das imagens e com a excelente trilha sonora de Chu Ishikawa. Definitivamente, não foi por acaso que conheci o Shinya Tsukamoto. Aliás, quero mais!

Wesley PC> 

APRESENTAÇÃO DO LUIS ESPINAL:

Biografia do autor que encontrei na Internet: "Luis Espinal foi um padre jesuíta boliviano-catalão, jornalista, cineasta e critico de cinema, liderança social ativa da Teologia da Libertação na luta pela justiça social e pelos direitos humanos. No decorrer da década de 1970, Luis Espinal escreveu na Bolívia vários livros tratando da utilização do cinema como instrumento de conscientização popular. É de sua autoria os livros 'Cinema e seu processo Psicológico', 'Consciência critica diante do cinema' e 'Sociologia do Cinema'. Ele destacava a importância de preparar o espectador para que seja crítico diante do cinema e para que possa reagir positivamente diante dele. Em 21 de março de 1980, Luis Espinal foi seqüestrado e brutalmente torturado até a morte. O assassinato do padre Espinal se inscreveu nos fatos do 'terrorismo preparatório' do golpe de Estado de Garcia Meza, ocorrido em 17 de julho de 1980 na Bolívia".

Comecei a ler um desses livros na tarde de ontem e intuo que me tornarei brevemente um admirador respeitoso deste jesuíta. Diz ele que "ao cinema não-doutrinador não podemos opor uma crítica não-doutrinadora". OK, que venha: estás vivo!

Wesley PC>

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

“EU ESCREVO PORQUE SOU JOVEM E, COMO MUITOS DE MINHA GERAÇÃO, SOU ROMÂNTICO”...

Para além da flexão de gênero no adjetivo, esta confissão é o que a personagem-narradora de Lúcia Veríssimo pronuncia na cena inicial de “Filhos e Amantes” (1981, de Francisco Ramalho Jr.), filme produzido por um dos principais arregimentadores da Boca do Lixo, Antônio Polo Galante, que vi na madrugada de hoje pensando ser superficialmente erótico, mas que me surpreendeu pela pretensa contundência geracional, pelas frases de efeito envolvendo jovens endinheirados e constantemente angustiados diante das drogas, de ameaças e necessidades de aborto, diante das agruras da vida adulta, enfim. No filme, a protagonista descobre que está grávida de seu namorado (André de Biase), mas não está segura se deseja interromper a gestação. Viaja com ele para a casa de campo de uma amiga (Denise Dumont), que vive com uma linda moça que gosta de ficar enclausurada (Nicole Puzzi, que protagoniza uma fantástica cena de masturbação) e, antigamente, desejava que os homens sofressem violentas dores no saco (um jovem e muito bonito Paulo Gorgulho é alvo de uma de suas traquinagens sensuais interrompidas, largado nu no meio do mato). Lá, o ex-namorado da amiga (Hugo Della Santa) aparece acompanhado de uma moça histérica (Rosina Malbousian) e, depois que esta tem uma overdose, eles redescobrem a beleza da vida [“confesso que vivi. Ou melhor, confesso que quero viver” é o lema final] depois que conhecem um casal (Walmor Chagas e Renée de Vielmond) que se ama, não obstante a esposa ter se assustado deveras quando o senhor fora esfaqueado durante um assalto, em relação ao qual não guarda rancor dos bandidos. Tudo isso ao som da trilha sonora sintetizada de Rogério Duprat! 



 Não é um filme muito bem-resolvido, mas me deixou pensativo, me fez repensar meu moralismo sobrevivencial, minha relação ruim com a idéia do aborto (não obstante eu admitir que não cabe a mim julgar ninguém por isso), meus pré-conceitos em relação às substâncias lisérgicas, meus receios sexuais, meus desejos prementes, minha vontade de viver... Não é um filme muito bom, mas que, visto numa madrugada de leve crise, me fez sentir contente por possuir os melhores amigos do mundo. E, quando alguém se pergunta “as nossas angústias são crônicas, não é?”, a resposta não poderia ser melhor e mais efetiva: “o que é isso?! Se a gente se ajudar, a gente pode enfrentá-las!”. Oh! Fiquei contente com o filme, não obstante seu clima um tanto melancólico, apesar da belíssima direção de fotografia de Antônio Luiz Mendes, que aproveita muito bem as belezas naturais do Parque Nacional de Itatiaia e de Agulhas Negras, no Rio de Janeiro. Viver é maravilhoso!

 Wesley PC>

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

“DEPOIS DO NADA, TUDO VEM DE MÃO BEIJADA!”

Depois de um plano erótico chafurdado – mas não necessariamente enxergado como um problema – sentei-me diante da TV e vi um filme sobre o qual nada sabia: “Harmada” (2003, de Maurice Capovilla). Na trama, Paulo César Pereio interpreta um ator que toma banho completamente despido, num rio, ao lado de um amigo idoso na primeira cena do filme. Ao sair da água, ele não encontra o amigo. Caminha, vai assistir a uma peça teatral na qual duas mulheres acariciam-se sexualmente entre si, envolve-se afetivamente com uma delas, pede para que as duas beijem-se lesbianamente e, numa seqüência posterior, são presos por atentado ao pudor ao encenarem uma peça teatral imoral. Depois que saem do cárcere, fazem teatro ao ar livre. Nos dois momentos de homenagem vivaz ao teatro, lembrei de filmes bergmanianos: primeiramente, “O Rito” (1969); em seguida, “O Sétimo Selo” (1957). Porém, a maior influência directorial estrangeira no filme parecia ser o lusitano João Cesar Monteiro, ao quem o protagonista se assemelha, aliás. Depois que arranja emprego como datilógrafo, o ator conhece a sobrinha do seu patrão, por quem se apaixona. Como ele não pode ter filhos (descobre isso durante um espermograma, em que exclama “Deus existe, porra!” quando finalmente ejacula!), ela se envolve com outro homem, e ele vai para um asilo [“Recordações da Casa Amarela” (1989) é o filme que me veio imediatamente à mente!], onde reestrutura a banda de música do local e encena Bertolt Brecht entre os internos. O reencontro com uma moçoila que ele conheceu quando ela ainda era bebê o faz querer lançá-la no mundo teatral – e, mais uma vez, Ingmar Bergman reaparece como influência, precisamente em “Depois do Ensaio” (1984) – mas a má interpretação de Patrícia Libardi fez o filme perder um pouco de seu ritmo libertino e elogioso, recuperado humoristicamente ao final, quando o protagonista insiste para que um garoto surdo-mudo lhe diga alguma coisa e este o conduz à apresentação mambembe de uma trupe teatral, onde reencontra um velho amigo e o prazer pela dança, pela atuação, pela alegria de viver... Um filme irregular, circular, mas belíssimo, que me encantou com os dizeres “mesmo que digam que a fome compartilhada entre muitos toca a poucos, vocês estão morrendo – e nós não temos nem mesmo onde cair mortos!”. Ainda que, em minha opinião, o filme tenha funcionado muito mais na teoria que na prática, preciso ver “O Profeta da Fome” (1970), do mesmo diretor – e, se for caso, ler o romance no qual “Harmada” foi baseado – o quanto antes! E me sinto bem melhor agora...

 Wesley PC>

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O TÍTULO NACIONAL É MELHOR?

De “O Sol é Para Todos” para “To Kill a Mockingbird”, a diferença é grande. Porém, ambos os títulos referem-se ao filme do Robert Mulligan, realizado em 1962, que vi na tarde de ontem e que, ainda agora, de algum modo, me perturba. Meu primeiro impulso é de dizer que o filme me decepcionou visto que a trama sobre racismo é secundária diante do deslumbramento da garotinha Scout (Mary Badham) sobre o idealismo de seu pai advogado (Gregory Peck), ao qual ela chamava pelo primeiro nome, para que rimasse na dublagem a sinonímia entre a pronúncia do prenome Atticus e o adjetivo ético, que se adéqua muito bem às posturas públicas e privadas do Sr. Finch. O filme é bom, não discordo, mas não tanto quanto sua publicidade entusiástica tentou me vender enquanto cânone, desde que eu me entendo por espectador hollywoodiano. Aliás, a cena que mais me perturbou (e encantou, por extensão inversa) foi uma das que mais se relacionam ao título original, sobre (não) matar um tordo, explicação conferida pelo protagonista quando seus filhos questionam porque ele não proclama a habilidade de ser um ótimo atirador. A cena em pauta: o instante em que Atticus Finch é chamado para atirar em um cão hidrofóbico que ameaçava se aproximar de sua propriedade residencial. Sua empregada negra ficou assustadíssima, mas, afinal, o cão é morto com apenas um só tiro. Cães raivosos não são como pássaros! Pensando no filme ainda...

 Wesley PC>

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

QUATRO QUADRADOS APRISIONAM MUITO MAIS DO QUE APENAS UM!


Na madrugada de hoje, fui afligido por algo que os meus amigos definem como “insônia improdutiva”. Depois de ter estudado bastante sobre deliberação midiática e de ter assistido à interessantíssima cerimônia de entrega dos prêmios dos sindicatos de atores hollywoodianos, não consegui dormir nem tampouco me concentrar nalgum filme exibido na TV, por mais leve que este fosse. Desesperado, deixei a televisão ligada por mais ou menos meia-hora num canal provisoriamente liberado, que registra, através de pretensas quatro câmeras simultâneas, os eventos ocorridos no interior da residência de luxo onde se desenrola o atroz ‘reality show’ Big Brother Brasil!

Não obstante ser obviamente contrário a este abominável programa, todos sabem o quanto sou culpado no que tange a uma legitimação basilar e prototípica do fundamento publicitário do programa: “dar uma espiadinha”. Sou um voyeur compulsivo: eu gosto de olhar! Pior: nutro uma vergonhosa tara (física, unicamente carnal, epidérmica e exterior) por um dos personagens do programa, o idiotizado Eliéser, engenheiro agrônomo goiano que, numa edição anterior do programa, confessou ter se masturbado por debaixo dos lençóis, numa descrição que inevitavelmente me excita até hoje.

Enquanto me esforçava para não prestar atenção ao que se desenrolava nas telas quadriculadas, torcia para que Eliéser fosse o primeiro a ir para o quarto. Dito e feito: ele despe-se vagarosamente e sensualmente, mas as câmeras vetaram o meu deleite doloso e focalizaram discussões insuportáveis e desnecessárias sobre os esquemas competitivos do jogo. Mais de uma câmera, aliás, focalizavam os mesmos personagens, enquanto Eliéser talvez estivesse punhetando novamente em seu leito. Fiquei irritado, desliguei a TV com raiva, mas, ainda assim, o sono não veio. Despertei chateado: culpa de minha submissão ao que de mais execrável existe na TV brasileira. Eu assumo!

Wesley PC>