sexta-feira, 9 de outubro de 2009

“ONDE ESTÃO OS SONHOS DA JUVENTUDE?”

Aviso logo: vou contar o final!

“Onde Estão os Sonhos da Juventude?” (1932) é o nome de um belo filme de Yasujiro Ozu. Um filme belo e triste. Um filme triste e feliz. Um filme sobre a vida.

Resumo: numa das primeiras cenas do filme (mudo), algumas pessoas olham para um rapaz que caminha segurando um livro e tropeçando nas pessoas. “Ele estuda demais”, comentam. “Faz Economia na Universidade”. Logo em seguida um intertítulo diz que “por mais que ele se esforce, não consegue ser um bom aluno. Suas notas são as piores da turma”. O contraponto a este rapaz estudioso são seus amigos boêmios, que trapaceiam nas provas o tempo inteiro (inclusive no que diz respeito às teorias de Max Weber). Um destes boêmios, porém, é obrigado a abandonar a universidade, em virtude da morte de seu pai, dono de uma importante empresa. Anos depois, todos os seus colegas de classe se formam, inclusive o esforçado rapaz com péssimas notas, que casou com a moça por quem o órfão era apaixonado, por quem o órfão é apaixonado, aquela que o órfão ama. Numa cena fortíssima e dramática, o órfão presidente de empresa espanca o marido da moça que ama. Ao final, se arrepende. Chora, fica triste, se lamenta. Arrepende-se de toda a violência e pede desculpas ao espancado, que viaja em lua-de-mel com sua amada esposa. O órfão rico e apaixonado acenará ao longe, quando percebe que seu colega de classe está viajando num trem. Ele sorri. Ela sorri. Todos sorriem. De que adianta?

Vi o filme de manhã. Vi mais que o filme à tarde. Ganhei amendoins de minha chefa. Quando pensei que nada poderia (me) ser pior, encontrei 7 gotas de sangue no chão do banheiro, quando fui mijar. Seria algum homem com diarréia? Alguma menina que menstruou no banheiro errado? Uma hemorragia genital qualquer? Que seja! Talvez alguém esteja em situação pior do que a minha...

Wesley PC>

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

“ALONE I BREAK”, DO KORN:

Um menino apaixonado falou pro outro: “sem tu, eu não sei viver. Eu morro”. O outro, indiferente, apenas olhou em seu rosto e disse: “tu consegues”. Talvez tenha conseguido mesmo. Um correspondente do primeiro deixa um recado para um correspondente do outro. E espera qualquer resposta, qualquer resposta. “Queria te passar algumas coisas (o seriado "Twin Peaks", um filme masoquista francês contemporâneo, as músicas do Andrew Bird, a ratificação de minha disponibilidade irrestrita em fazer qualquer coisa que tu peças, etc.), mas... Não te encontrei. Fazer o quê? Minha sina (risos)”. Qualquer resposta! Enquanto isso, minha mãe avisa que tem sopa pronta na geladeira. Eu quero ver um filme hollywoodiano sobre injustiças sociais no Velho Oeste. E Jonathan Davis usa sua voz esganiçada para dizer que sozinho, ele se rompe. Bem-vindo ao clube!

Wesley PC>

MINHA VIDA REAL AO LADO DO SOLDADO

“Homens mortos deitados no fundo da cova imaginando quando o Salvador virá
Eles serão salvos?
Talvez tu sejas um pecador em sua vida alternativa
Talvez tu sejas um piadista, talvez tu mereças morrer
Eles choram quando seus filhos partem
Deus está vestindo preto
Ele nunca conseguirá encontrar esperança
Ele nunca mais voltará!”


Muita gente reclama de quem se serve de letras de canções alheias para registrar estados de espírito pessoais, mas... Eu não consigo evitar! Conheci esta canção hoje [“Soldier Side”, última faixa do álbum “Hypnotize” (2005), do System of a Down] e me senti lá, ao lado dos narradores atônitos da canção. Linda, linda.

Na foto, a personagem de Bette Davis espiando as conversas de seu amado e descobrindo mais do que gostaria, em “Jezebel” (1938), obra-prima do permissivo William Wyler. Como sempre, a culpa é minha. Tenho que providenciar um vestido vemrelho?

“All young men must go
He's come so far to find the truth
He's never going home”

Wesley PC>

DEVE SER PORQUE EU NÃO SOU ‘GAY’...

Um dos 7 filmes a que os passageiros do ônibus que voltava para Sergipe depois do Encontro Universitário Nacional de Diversidade Sexual assistiram chamava-se “Comendo Pelas Bordas” (2004, de Allan Q. Brocka). Trata-se de uma amorfa produção semi-televisiva, com impressão de campanha publicitária, em que um rapazola homossexual apaixona-se compulsivamente por um heterossexual que, pro sua vez, está obcecado por uma rapariga desiludida com os homens que a usam para revelarem-se ao mundo como homossexuais. Nesse entretempo, o rapazola inicial não percebe que o melhor amigo ‘gay’ da rapariga está interessado nele.

Pela sinopse do filme, não é preciso dizer que ele assimila o que de pior uma telenovela pode apresentar e que as conduções directiva, actancial e musical são muito ruins, e que desagradou deveras os passageiros dos ônibus. Porém, uma cena específica e solitária me despertou a atenção no filme: quando o rapazola homossexual consegue fazer sexo oral no seu objeto de desejo heterossexual quando este último compartilhava um telefonema com a rapariga heterossexual (a amiga de muitos ‘gays’) por quem alega estar apaixonado. Já fiz algo semelhante (com intenções melhores, confesso) e me senti alobiograficamente contemplado por alguns minutos. Mas, no geral, o filme é horrendo. Tudo o que não deve ser realizado em matéria de possível militância ‘gay’!

Achava, até então, que este filme era o pior que poderia ser realizado em relação ao tema. De repente, um amigo europeu me recomenda o filme “Were the World Mine” (2008, de Tom Gustafson), musical ‘gay’ adolescente sobre um garoto que é chamado de “fada” até pela mãe. Sofrendo agressões contínuas na escola em que estuda, ele tem a chance de brilhar quando é convocado para uma versão da peça “Sonho de uma Noite de Verão”, de William Shakespeare. Num passe de mágica, ele consegue uma flor aquosa que tem o poder de transformar outras pessoas em ‘gay’. Em dado momento, 90% dos habitantes da cidade em que ele vive está sob hipnose sexual. Isto resolve o seu problema? Isto resolve o meu problema? Isto resolve os problemas dos ‘gays’ do mundo? Fiquei irritadíssimo com o tom apolítico do filme, que ainda chega ao cúmulo de isentar o rapaz de qualquer culpa pela manipulação das mentes alheias. Por mais que eu esteja gradativamente invejoso e ciumento (e confesso: a ciência de que outras pessoas não compartilham dos mesmos desejos sexualistas que eu é uma das causas disto!), fui terminantemente contra a abordagem do filme. Péssimo filme, horrível filme, abominável filme! E o pior é que os ‘gays’ do mundo inteiro estão abarrotando filas de cinema para vê-lo...

Wesley PC>

RAPIDINHA SOBRE “WEATHERED” (2001), DO CREED:

O leitor de CDs de meu aparelho de som periga ficar deficitário novamente. Porém, ainda assim, insisti em ouvir este álbum, que me foi dado de presente por um amigo que se casou muito jovem, em virtude de a família de sua namorada ter descoberto que eles faziam sexo há um bom tempo. Repito: em pleno século XXI, na periferia do conjunto Eduardo Gomes (São Cristóvão – SE), a mãe da garota, que engravidara ilegitimamente e fugira de casa ainda adolescente, obrigou o casal a consumar uma união institucional por descobrir que ambos levavam o amor que sentiam um pelo outro ao que se convencionou chamar de “as vias de fato”. Conclusão: o casal agora possui uma filha graciosíssima, a garota enfurna-se em casa o dia quase inteiro, meu amigo enfrenta brigas por causa de ciúme crônico quase todos os dias e é obrigado a passar dias, tardes e noites trancado num escritório de advocacia para pagar as dívidas familiares precocemente adquiridas. Se eu acho que ele age certo ou errado? Repito o que disse antes: quem sou eu pata julgar?

Quanto ao CD que ele me deu, um dos álbuns que eles mais ouviam no tempo de namoro, destaco clássicos românticos como “Don’t Stop Dancing” (que é a faixa que ouço agora), “My Sacrifice”, “One Last Breath” (todas temas de novelas adolescentes da TV Globo) e a longa e quase antropológica “Who’s Got My Back?”. Sempre achei o vocalista Scott Stapp um semi-plágio do Eddie Vedder (do Pearl Jam), mas admito que suas composições já encantaram bons momentos de minha vida passional. Pós-conclusão: estou tendo ótimas lembranças enquanto reouço este mal-falado CD.

“When you are with meI'm free...
I'm careless...I believe
Above all the others we'll fly
This brings tears to my eyes
My sacrifice”

Não tenho medo de admitir meu ‘popismo’ de vez em quando (risos)…

Wesley PC>

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

“ÀS VEZES, A GENTE SE RESERVA, NÉ?”

Então, numa daquelas madrugadas bêbadas de Gomorra, Eliane Charnoski sentou ao meu lado e explicou o porquê de ela tomar algumas das atitudes que estava tomando no que diz respeito ao clamor por organização “convencional” na casa. Confessou-me que sabia que zombavam dela por detrás, frisou algumas de suas diferenças comportamentais em relação aos outros moradores e pronunciou a frase que intitula esta postagem, logo escrita na parede de Gomorra, em letras vermelhas. Em suma, conversamos carinhosamente por um bom tempo e ela me mostrou que é uma ótima pessoa. Temos diferenças, claro, mas somos pessoas com direitos. O tempo passou, ela engravidou, foi morar noutro lugar e passou um tempo sem me ver...

Até que, ontem à noite, ela aparece em meu local de trabalho para resolver alguns problemas universitários e puxa, percebo sua barriga saliente, seus óculos característicos, sua voz ainda frenética e, puxa, quantas saudades. Admito que ela mudou bastante desde que a conheci, mas... Quem sou eu para julgá-la? Encontrei-a ontem e fiquei feliz por gostar dela, beijei a sua barriga proeminente como nunca fiz antes em relação a mulher grávida nenhuma. Espero que ela não se chateie por eu expor aqui algumas de minhas opiniões e fatos sobre ela, mas... Publicizar o amor que sinto por meus amigos é quase uma obrigação. E esta menina já compartilhou momentos muito bonitos comigo: tomara que dê tudo certo na vida materna dela.

Beijo grande, Eliane!

Wesley PC>

PRECISO DE UMA ARMA PARA SAIR DO CAIXÃO!

Uma de minhas grandes pendengas contra os socialistas defensores da luta armada é que, em minha opinião, reivindicar direitos – ainda que defensivos – através do uso de ferramentas criadas para matar o homem (e impedir a sua potencial reabilitação ideológica) corresponde a um atestado de igualdade em relação ao suposto inimigo, igualdade esta que me faz perguntar: não seria melhor lutar juntos por uma mesma causa?

Este intróito seve apenas para eu explicar o porquê de, não obstante eu detestar armas, estar supostamente precisando da imagem de uma delas no presente instante: espetacularização. Pura espetacularização! Preciso sair daquele caixão...

Na manhã de hoje, deliciei-me com dois álbuns da extraordinária banda melancólica Nick Cave and the Bad Seeds: “Henry’s Dream” (1992) e “The Lyre of Orpheus” (2004). Pude perceber, ao longo dos 12 anos que separam ambos os álbuns, que a banda passou por diversas mudanças sutis em seu estilo, mas os traços registrados da narração percuciente da maravilhosa dor de viver estão lá. Se no primeiro álbum, os personagens/narradores das canções reclamam que seus copos estão vazios e descrevem as amarguras de ser um estranho numa cidade nova e excludente, no segundo (maravilhoso! Maravilhoso!), os artistas falam sobre vozes que emanam das catacumbas, confessam que estão sem fôlego, apelam para a brandura no entendimento as criancinhas, e descrevem carícias capilares que, “supernaturalmente”, se assemelham à penetração de inúmeras facas no corpo de quem ama.

Eis também para que serve a música: para demonstrar que qualquer coisa pode ser uma arma, que qualquer coisa pode fazer o bem, que qualquer coisa pode matar!

Wesley PC>

terça-feira, 6 de outubro de 2009

O QUE SERÁ QUE ACONTECE DEPOIS?

“Trash” (1970, de Paul Morrissey) é um daqueles polêmicos filmes produzidos pelo gênio Andy Warhol. Na trama, Joe (vivido pelo muso da Factory, Joe D’Alessandro) é uma espécie de michê que prostitui seu corpo para conseguir heroína, que, por sua vez, causa-lhe uma impotência crescente, que impede que ele consiga dinheiro com seu corpo. Sei que o filme tem muito mais do que isso (o título, aliás, não é nada casual), mas eu dormi nos minutos iniciais. Estava com sono. Estava preso a um abraço de sonho. Mas há quem o tenha visto – e estes sabem o que acontece depois – e estes entendem o drama – e, sinceramente, para mim é demais esperar por uma ereção – pinto mole na cabeça!

PS: tudo isso deu origem à canção "Walk on the Wild Side", clássico do Lou Reed:
"Little Joe never once gave it away
Everybody had to pay and pay
A hussle here and a hussle there
New York City's the place where they said,
Hey babe, take a walk on the wild sideI said,
Hey Joe, take a walk on the wild side"

Wesley PC>

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

9 FATOS NUMÉRICOS DE UMA SÚPLICA À AMIZADE:

Fato 1: hoje é aniversário da tia Débora Cruz.
Fato 2: estou com “Zorba, o Grego” (1964), de Michael Cacoyannis, na bolsa.
Fato 3: o livro original foi escrito por Nikos Kazantzakis, autor grego admirado por nosso amigo Rafael Coelho.
Fato 4: não sei o que fazer com a minha noite ainda.
Fato 5: a música-tema ‘in crescendo’ de Mikis Theodorakis faz a gente esquecer que é triste.
Fato 6 (interrogativo): cu de bêbado tem dono? Bens de prostituta morta são públicos?
Fato 7 (citação do livro que eu não lembro se consta do filme):

“- Qual o seu prato favorito, vovô?
- Todos eles, meu neto. É um pecado dizer o que é bom e o que é ruim.
- Por quê? Nós não podemos escolher?
- É claro que não!
- Por que não?
- Porque existem pessoas que sentem fome!


Fato 8:
amo a tia.

Wesley PC>

“OH, EU. OH, MEU... O JEITO QUE O DIA VAI PELO SOL ESTÁ SE ACOMODANDO E CACHORROS ESTÃO SONHANDO COM CANÇÕES DE AMOR NO ESPÍRITO NATALINO” OU...

...ADMITO QUE EU NÃO CONSIGO TRADUZIR O NOME DO SEGUNDO ÁLBUM DO DEVENDRA BANHART!


Meu Deus, o que quer dizer aquilo?! Lançado em 2002, o segundo álbum deste gênio do movimento ‘folk-psicodélico’ que está sendo divulgado como “New Weird America” não deixou de ser executado entre a noite de ontem e a manhã de hoje. Minha mãe, meu irmão e meus cachorros parecem ter detestado os grunhidos de “Nice People” que, não por coincidência, é a minha faixa preferida do disco e a que eu mais repito antes de tomar banho. Que criatura estranha é esta, meu Deus?! Faz tempo que leio críticas positivas sobre o trabalho deste artista, mas somente agora tive a oportunidade adequada para ouvi-lo. Tornei-me fã de imediato, obviamente e recomendo-o violentamente: ouçam Devendra Banhart, esquisitíssima criatura que eventualmente participa de duetos com meu muso Antony Hegarty. Ouçam-no! E, como diria a letra de “Cosmos and Demos”: “No dia em que tu caíres, que nome tu irás chamar? A única coisa que tu me ensinaste é a única coisa que tu sabes”. Sou bem-vindo ao estágio da pós-dependência – e, olha só, a cruzadinha de braço do artista se parece com a minha!

Wesley PC>

A SÍNDROME DA AUSÊNCIA (PROPOSITAL) DO PAI?

Por mais que eu tenha tentado, até então, minha mãe se recusa a ver “Tudo Sobre Minha Mãe” (1999), novo clássico de Pedro Almodóvar. Por mais que tivéssemos um cachorro amado que homenageava o nome do diretor, por mais que eu lhe diga que a história é terna, por mais que o filme tenha feito sucesso e, num ano qualquer, tenha integrado o pacote de filmes da TV Globo (este tipo de publicidade conta na periferia!), por mais que eu prometa que não vou fazer nenhuma cobrança a ela no que diz respeito a saber pelo menos o nome do bendito do homem que ejaculou na vagina dela e me fecundou, ela não quer ver o filme, se recusa, acho que tem medo. Pena!

Lembro que, da primeira vez que vi o filme, masturbei-me na sala da casa de um vizinho (em plena manhã de quarta-feira!) porque este ficava desfilando pela casa de cueca. Na época, quando o filme foi lançado em VHS, apreciei a mesma citação que hoje me amortece: o momento em que, ao ser presenteado com um livro do Truman Capote, o belíssimo personagem do Eloy Azarín lê: “cada pessoa que recebe um dom, recebe também um chicote, e este é destinado somente à autoflagelação”. Por algum tempo, eu cri que tivesse alguns dons. Ainda hoje uso o tal chicote para a flagelação, que, infelizmente, não fica somente a cargo de mim!

Quando eu voltar para casa, na terça-feira pela manhã, insistirei novamente para que minha mãe me acompanhe numa sessão desta obra-prima. Ela precisa, eu preciso! Renovarei as mesmas promessas de outrora. Tomara que ela acredite neste filho que a ama, mesmo desrespeitando noções tradicionalmente hierárquicas de respeito familiar, mesmo preferindo chamá-la pelo nome do que pelo título, mesmo que a sexualidade abrangente do filme nos leve a uma daquelas patenteadas conversas de mãe e filho sobre o que eu faço publicamente com meu corpo, mesmo que chova ou faça sol, mesmo que eu já tenha mais de 17 anos, mesmo que o teatro não seja valorizado na minha vizinhança, mesmo que não hajam vizinhos passeando de cueca, mesmo que eu jamais saiba sequer o nome de meu pai!

Wesley PC>

domingo, 4 de outubro de 2009

LEMBRANÇA DA “SANTA RAIVA”:

Pessoas diferentes fazem coisas diferentes quando ficam sozinhas em casa. Algumas aproveitam a oportunidade para consumirem material pornográfico, outras para professarem em voz alta orações proibidas. Eu fiquei sozinho em casa na manhã de hoje e aproveitei p ensejo para varrer a casa, talvez a atividade doméstica que mais me desagrada, não obstante reconhecer o quanto é necessária, em especial quando se tem dois cachorros em casa. No aparelho de som, em volume altissonante, “St. Anger” (2003), álbum do Metallica que tanto desagradou seus fãs longevos e que me foi a porta de entrada para o conhecimento respeitoso da banda e para a apresentação de uma mor em forma de rapaz. Escutei muito este CD por algum tempo e hoje ele estava guardado, inane. Resolvi dar uma nova chance e, puxa, quantas lembranças foram desencadeadas!

Lembro que, à época, falava tão bem deste álbum que um amigo de trabalho me presenteou com um documentário sobre a turnê do disco, “Metallica: Some Kind of Monster” (2004, de Joe Berlinger & Bruce Sinofsky), muito bom por sinal. Foi através deste documentário que eu pude perceber o quanto o dono do vozeirão de James Hetfield é um ser humano, como foi o processo de contratação do baixista Robert Trujillo, o quanto o baterista Lars Ulrich é idiota e como os integrantes da banda reagiram à má recepção do disco. É um documentário muito específico (agrada mais a fãs da banda que a apreciadores gerais de cinema), mas possui valor. Gosto dele. Vou propor para revê-lo em Gomorra.

Admito que não gosto do CD por completo. Poucas vezes cheguei a ouvi-lo na íntegra, dado que costumo repetir indefinidamente as duas primeiras canções: a empolgante “Frantic”, que serviu de fundo sonoro ao primeiro encontro entre eu e Ramon, avatar de minha primeira paixão definitiva da “era moderna”; e a extraordinária faixa-título, cujo ótimo videoclipe foi filmado numa prisão californiana, ambiente ideal para o tom de protestos irrestrito da canção, que, para mim, soam mais dolorosos e pessoais do que deveriam: foram palavras que o mesmo Ramon utilizou para se livrar de mim, configurando-se num daqueles caras “que não falam comigo nem com a peste”. Trocamos algumas palavras numa madrugada deste ano, mas acho que ele ainda me teme e odeia. Pena. Ficam as boas lembranças musicais:

“Fuck it all and fuckin' no regrets,
I hit the lights on these dark sets.
Medallion noose, I hang myself.
Saint Anger 'round my neck

I feel my world shake like an earthquake
Hard to see clear. Is it me? Is it fear?

I'm madly in anger with you!
I'm madly in anger with you!
I'm madly in anger with you!
I'm madly in anger with you!


...and I want my anger to be healthy

...and I want my anger just for me
...and I need my anger not to control
...and I want my anger to be me
...and I need to set my anger free”


Sim, ele está puto de raiva comigo - e não só ele!

Wesley PC>

PARA QUE O DOMINGO NÃO SEJA PERDIDO POR COMPLETO...

Desde quando eu me iludia com o mundo por não trabalhar ainda, detestava o domingo. Odiava aquele dia concessivo em que todas as pessoas ao meu redor achavam que tinham direito de se divertir. Detestava tanto que, mesmo fazendo parte agora do rol que depende deste dia para folgar, não consigo superar o trauma: domingo rima com impotência para mim!

A fim de lidar um pouquinho melhor com este trauma diário, decidi que não sairia de casa aos domingos e tiraria boa parte das 24 horas deste dia para tirar o atraso dos inúmeros VHS que gravo durante os demais seis dias. No dia de hoje, porém, fui tomado por duas demoradas quedas de energia elétrica. Tive que realizar outros compromissos emergenciais, dada a indefinida supressão energética. Conclusão: em dado momento de minha tarde, estive a dormir.

Ao acordar, depois de mais um típico pesadelo sexual sobre abandono de parceiros, vi um docudrama sul-africano no mínimo curioso em sua perspectiva histórica enviesada: “No Futebol, Nasce uma Esperança” (2007, de Junaid Ahmed). A história (real) fala sobre um grupo de adolescentes que foram presos por motivos políticos na década de 1960. Enviados à Ilha de Robben, onde Nelson Mandela estava preso, eles reivindicam o direito de jogar futebol aos fins de semana, quando obtinham folga do trabalho forçado numa pedreira e podiam reler as edições dos livros de Karl Marx disponíveis na prisão. Em pouco tempo, levando-se em consideração todo o condicionamento burocrático socialista de que dispunham, formam uma organização futebolística no interior do cárcere, que chama a atenção dos guardas preconceituosos e instaura a competitividade e a legislação interna entre as grades oceânicas da prisão insular. Os personagens reais da saga comentam os fatos, enquanto atores representam suas ações do passado. A cena final é uma imagem documental em que o verdadeiro Nelson Mandela segura a taça da Copa do Mundo, em Zurique, Suíça, após o anúncio do País em que vive como sede dos jogos programados para 2010. mais três câmeras mostravam pessoas comemorando em outras cidades da África do Sul. O que isso representa politicamente? Creio que não disponha de argumentos suficientes para responder.

Pronto. Um filme parco de um País não necessariamente consagrado enquanto produtor cinematográfico havia salvo o meu domingo de um imaginário desperdício de tempo, em virtude da ocorrência cada vez mais repetitiva das quedas de energia elétrica! Fiquei irritado (ou enfadado, melhor dizendo) com a progressiva sujeição do roteiro do filme ao esquematismo burocrático atribuído aos comunistas, de maneira que a trama do filme deixa de ser narrativa ou rememorativa lá pelos 50 minutos de projeção para se tornar uma prancheta administrativa forçada, em que hierarquia e fidedignidade aos princípios da FIFA eram defendidas. Não gosto de futebol. Não gosto da competitividade atrelada ao esporte, que foi justamente a arma de que os presos políticos se serviram para conseguirem o respeito dos guardas e certa visibilidade mundial. Talvez eu esteja cada vez mais descolado deste mundo. Talvez...

Wesley PC>