sábado, 23 de outubro de 2010

E, EM BREVE, ELES TERÃO QUE IR EMBORA...

Os filhotes caninos de Zhang-Ke e Bogdanovich de Castro já estão quase completando um mês e meio de existência. E, por mais que nós tenhamos nos apegado firmemente a eles, sabemos que eles partirão em breve. Um deles já foi inclusive prometido a uma amiga de trabalho e, mesmo assim, dispus-me a nomeá-los: enquanto estiverem aqui conosco, eles serão Bodrov, Sembene, Fassbinder e Mizoguchi. Lá fora, não sabe(re)mos o que os aguarda...

Nascidos no último dia 17 de setembro, estes animaizinhos encheram a nossa casa de concomitantes alegrias e preocupações. Alegrias porque, conforme cantarola os personagens de João Cabral de Melo Neto, eles “saltaram para dentro da vida” – e isto basta!; e preocupações porque a mãe dos mesmos tornou-se bastante arisca depois do parto – de maneira que minha mãe não mais confia nela, a ponto de deixar que ela fique deitada em sua cama – e porque suas necessidades instintivas de sobrevivência começa a desencadear gastos monetários acima de nossas posses. “Amar não enche barriga”, diz o senso comum. Eu me rendo diante desta triste, doce e peluda conjunção de evidências!

Graciosos que eles ficaram, não será difícil encontra donos confiáveis e amáveis para os outros três irmãozinhos ainda não acolhidos. E eu, minha mãe, meu irmão e a mãe canina deles sentiremos tantas saudades. Mas amar tem disso também: preparar-se para saber que quem amamos partirá um dia... Seja 14 de janeiro, seja 25 de julho, seja 17 de dezembro. Seja 17 de dezembro...

Jamais serão esquecidos: é a sina que manterei viva. Juro solenemente!

Wesley PC>

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

QUANDO EU LACRIMEJO NA CHUVA, É COMO SE DEUS CHORASSE AO MEU LADO...

Assim me fez pensar minha mãe, desde pequeno, quando imbuiu minha mente voluntariamente impressionável com suas explicações mitológicas para os fenômenos naturais do mundo maravilhoso que nos cerca...

E, se hoje projetos de lágrimas escorreram de meus olhos, estas se devem fundamentalmente à audiência a mais uma bela versão cinematográfica do clássico literário de Victor Hugo, “Notre-Dame de Paris”, publicado originalmente em 1831. Se eu já havia me emocionado sobremaneira com a versão dirigida em 1939 por William Dieterle (para mim, a melhor de todas até então!) e com a ousadia de Gary Trousdale & Kirk Wise em transporem esta trágica narrativa para o universo animado infantil em 1996, a versão ora vista, realizada em 1923, sob o nome de “O Corcunda de Notre-Dame", por Wallace Worsley, tocou minha sensibilidade por motivos que transcendem a narrativa. E lá fora chovia...

Existem algumas diferenças sinópticas entre este filme e as demais versões vistas (não li ainda o romance original, o que devo remediar o quanto antes!), mas o que mais apreciei aqui foram as minúcias descritivas em relação a personagens secundários, em respeito ao talento descritivo audaz do escritor Victor Hugo. Em dada seqüência do filme, por exemplo, descobrimos que a Côrte dos Milagres é assim chamada porque lá, “os ‘cegos’ voltam a enxergar e os ‘aleijados’ voltam a andar”, em menção aos falsos deficientes que mendigavam em Paris e reuniam-se às noites neste local. E é lá que se encontrava Esmeralda, filha seqüestrada de uma aristocrata agora enlouquecida, noutro detalhe suprimido nas versões posteriores. E ela dá água a Quasímodo, no momento em que ele mais precisa de alento, mas é incapaz de trazer-lhe a redenção plena... E o final aqui é diferente, mas talvez seja consolador. Talvez!

Ao final da sessão, ainda tentando recolocar minhas idéias e sentimentos no lugar, organizando as informações desta versão e comparando-as com as diferenças cabais dos filmes posteriores, sentei-me em frente à casa em que resido e enviei uma mensagem de celular, sintetizando meus pareceres elogiosos sobre o livro que ainda não li, mas que tenho certeza de que é uma obra-prima. E chovia. E gotas d’água caíam sobre a tela de meu aparelho. Se entrassem em minha garganta, eu poderia ser infectado com amebíase. E mesmo que as gotículas que caíam do céu pudessem emular lágrimas apenas pretendidas, o júbilo tomava conta de mim. Afinal de contas, Lon Chaney, intérprete apaixonado do apaixonado Quasímodo, não pronunciou o aforismo trágico que eu tanto temia e previa; “por que eu não nasci feito de pedra que nem estas estátuas?”. Mas ele não pronunciou... E júbilo é estar perto de quem se ama!

Wesley PC>

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

“WHAT IS THIS TERROR? WHAT IS THIS ECSTASY? HE THOUGHT TO HIMSELF. WHAT IS IT THAT FILLS ME WITH EXTRAORDINARY EXCITEMENT?”: ESTAS SÃO AS PERGUNTAS.

A resposta é um nome próprio!

“Terminei ‘Mrs. Dalloway’”, escreveria eu se fosse outra pessoa. “Confuso estou”, diria, com certeza, o nome próprio de outra pessoa atrelado ao pronome condicional. E, para meu próprio espanto, ainda não comentei o que este livro pungente e forte causou-me ao final. Faço-o agora, à guisa de cotejo: era quase 1h da madrugada quando virei a última página deste romance e um dado personagem perguntava a si mesmo o que era aquele êxtase, aquele terror, aquela excitação que o preenchiam. Autora, instância narrativa, personagens e leitor respondem em uníssono com o nome da protagonista. “There she was” era o motivo. “You are” é o início de uma série de conseqüências. E, se eu fosse outra pessoa – o complemento condicional me perseguindo novamente! – talvez eu pudesse apenas filiar-me ao conteúdo do romance. Mas, parafraseando a cartilha analítica de Antonio Cândido, conteúdo, forma e impacto de leitura não se separam: e “Mrs. Dalloway” instalou-me num estado reflexivo perene.

Polemistas superficiais costumam lançar por questão um falso dilema: no que tange às obras escritas por Virginia Woolf, “Mrs. Dalloway” (1925) é melhor que “Orlando – Uma Biografia” (1928) ou vice-versa? Não ouso macular-me com uma resposta. Ambas são obras-primas inquestionáveis! Com o segundo, a identificação foi pessoal. Com o primeiro, a identificação foi universal. Em ambos, a identificação foi identificada. Virginia Woolf fala a minha língua, escreve para mim! E “mim” pode ser qualquer pessoa. Por isso, esquivo-me de justificar o porquê.

Nas quase duzentas páginas de narrativa e fluxo consciencioso de “Mrs. Dalloway”, pelo menos duas dezenas de personagens aristocráticos e depressivos desfilam diante de nós, em vários estágios temporais paralelos. Ora, eles são jovens. Ora, eles são velhos. Ora, eles têm esperanças. Ora, eles sentem que suas almas estão mortas. Ora, até mesmo um repolho ao luar designa um ideal supremo de beleza. Ora, morrer parece uma solução viável para enfrentar o sofrimento inexplicável. Ora, doer dói. Ora, viver dói. Ora, viver é dor?

Desisto. Sou incapaz de criticar este livro de forma objetiva!

Wesley PC>

“CONFISSÕES DE UMA MÁSCARA”: IMPRESSÕES INICIAIS

Depois de ter me desentendido com este tal Yuri, sou obrigado novamente a atendê-lo: “e então, não vais tirar nenhuma piadinha comigo, não? Ah, já sei. Tu não podes porque estás em horário de trabalho”, disse-me ele, um tanto compungido. Respondi-lhe com um sorriso sincero, demonstrando-lhe que não sou rancoroso. E pedi-lhe um livro emprestado. Na segunda-feira última, ele atendeu ao meu pedido. E, neste exato momento, comemoro a leitura do primeiro capítulo de “Confissões de uma Máscara” (1949), primeiro romance de Yukio Mishima.

Nunca havia lido nada escrito por este autor até então, mas já era fã de sua obra desde a infância, em virtude da pungente identificação trágica que eu demonstro em relação à biografia pessoal do mesmo, graças a um filme difícil sobre ele, a que assiti na infância. Sei que ele cometeu ‘seppuku’ em 1970. Sei que ele era homossexual. E sei que ele tinha causas políticas defendidas ao extremo da martirização. Era-me suficiente e, na página 12 da edição que se encontra agora em minhas mãos, uma epifania:

“As calças justas delineavam nitidamente a metade inferior de seu corpo, que se movia com agilidade e parecia vir diretamente na minha direção. Uma adoração inexprimível por aquelas calças nasceu em mim. Não compreendi por quê. Sua ocupação... Naquele instante, do mesmo modo como outras crianças assim que atingem a faculdade da memória querem ser generais, fui invadido pela ambição de me tornar um carregador de fezes noturnas”.

Mordi a isca!

Wesley PC>
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TESE DE CINEMA DE TERROR NORTE-AMERICANO DOS ANOS 1930 A 1945: AMOR NÃO-CORRESPONDIDO ENGENDRA ZUMBIS!

Pode parecer uma descoberta precipitada, mas não o é – e três filmes bastam para provar a minha tese: “Svengali” (1931, de Archie Mayo), “Zumbi Branco” (1932, de Victor Halperin) e “Voodoo Man” (1944, de William Beaudine), sendo que o segundo destes filmes foi visto por mim na manhã de hoje, quando acordei indisposto para ir ao trabalho. Se era um mal físico ou psicológico que me afligia? Não vem ao caso deslindar aqui, mas era do trabalho que eu precisava me afastar hoje – com tudo o que isto implica!

No maravilhoso e poético “Svengali”, conforme já comentado aqui, um hipnólogo conhecedor de música, “consegue controlar a voz da mulher que ama, mas não o seu coração”, conforme diz a sinopse. Morrerá solitário. No surpreendente “Voodoo Man”, um velho feiticeiro eternamente apaixonado por sua amada falecida há muito tempo seqüestra moças bonitas e jovens, a fim de roubar-lhes a essência e deixar de ser viúvo. Morrerá solitário. No extraordinário (e intermediário) “Zumbi Branco”, o problema é mais sério: é político, é social! E eu tive que ficar em casa para não enfrentar o “trabalho”...

A trama do filme se passa no Haiti. Um casal apaixonado passeia de carroça por uma viela e testemunha um funeral vodu. “Por que eles estão enterrando esta pessoa no meio da estrada?” – “Porque, ao menos aqui, eles terão a segurança de que o defunto não será profanado”, é a resposta. Em seguida, descobriremos que um rico latifundiário é completamente obcecado pela jovem que irá se casar com outra pessoa. E ele usa trabalho escravo em seu moinho: negros falecidos, transformados em zumbis, andando em círculos, sem cobrar hora extra por seu esfolamento empregatício. Aí surge Bela Lugosi: interpretando o conselheiro místico do latifundiário, ele explica como se dá a escravidão ‘post-mortem’. E somos apresentados a uma longa seqüência onde os zumbis negros trabalham. E dói, de tão bonito e protestante!

Quando o latifundiário pede que seu conselheiro mate e, em seguida, zumbifique sua amada proibida, o noivo dela enlouqueceu. Ele chora, sofre, se embebeda, sombras e avantesmas surgem diante dele e o título do filme é magnânima e metaforicamente justificado. E eu grito: “caralho!”. Tive que usar um palavrão, pois não acreditava no que estava a presenciar. Um dos filmes de terror mais fortes que vi – é tem exatos 78 anos de idade!

Wesley PC>

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O EXERCÍCIO DA PRÁTICA POLÍTICA (DIÁLOGO)

Conforme determina o senso comum, diante da felicidade comemorada ontem, esta postagem deveria coroar o arco inferior de minha ciclotimia. Este deveria ser um texto sobre tristeza – que foi o que realmente senti por alguns minutos, entre 18h04’ e 18h45’ de hoje, para ser mais preciso! – mas, como diz uma famosa canção católica de harmonia entre congregantes, “o mundo dá tantas voltas – ooooooooh! – a gente vai se encontrar. Saiba que eu sou teu amigo e quero tua mão apertar”. Não deu para apertar a mão dele, mas, nos “esquemas” íntimos que se sucederam à sua partida, eu fui convidado pelo meu subconsciente a sentar numa cadeira de auditório e prestar atenção ao que a professora Délia Crovi, da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), falava...

Cheguei atrasado e desavisado ao evento e, portanto, precisei de alguns instantes para me situar. O tema da exposição da professora era algo que ressaltava a validade das intersecções ativas e teóricas entre o marxismo e a Comunicação Social. Citando um depoente peruano, ela destaca que, ao contrário do que acontece com outros conglomerados nacionais, o que há de mais comuns entre os países e traços culturais latino-americanos é a sua latino-americanidade essencial. Tautológico, eu sei, mas prenhe de sentido. A professora estava falando de política aplicada no âmbito mesmo da vida social mais particularizada. A professora citou Paulo Freire. A professora falava nossa língua, mesmo que estivesse se manifestando em espanhol!

Ao final de sua fala, alguns alunos de meu curso ergueram o microfone e suas críticas severas às limitações curriculares do Jornalismo conforme ensinado nas universidades. Críticas severas (e razoadas) foram endereçadas aos professores da UFS, sendo que alguns deles saíram do auditório neste instante, e, para minha surpresa, também direcionadas contra o suposto conformismo institucional de José Marques de Melo, paraninfo contemporâneo do Jornalismo brasileiro, presente no recinto. Exultei politicamente neste instante! Por mais que eu discordasse de alguns pontos ou estratagemas discursivos postos em xeque por aqueles colegas de curso, eu me senti representado enquanto reclamante naquele instante. E foi bom não ter ido para casa, me lamentar na mesmice prevista pelo ditado popular “dia de muito riso é véspera de muito choro”. Que bom que o meu choro, se vier realmente à tona, pode ser irmanado com o choro de outrem, que enfrentam problemas tão latino-americanos e universais quanto os meus. E, para além de eu ter chegado muito atrasado – e desavisado, insisto! – à palestra da tal Délia Crovi, gostei do que ela falou... Por pouco, eu não a aplaudi! E eu não era só “eu” ao pensar nisso... Eis aqui mais uma tentativa!

Wesley PC>

terça-feira, 19 de outubro de 2010

É MAIS DIFÍCIL ENCONTRAR PONTOS DE VISTA TEXTUALMENTE INTERESSANTES SOBRE ALGO QUANDO SE ESTÁ FELIZ OU MORTOS PODEM DANÇAR? (AUTO-REFLEXÃO/AJUDA)

Auto-ajuda é um gênero literário que sempre perturba os críticos: para além da má qualidade de muitos dos exemplares destinados a esta rotulação genérica serem de larga vendagem e apreciação quantitativa do público, os exemplares transpostos parta o cinema desse tipo de livro possuem um quê de hipnótico que motiva-nos a ficarmos recapitulando nossas próprias vidas após a sessão. Fui ver um destes filmes no cinema na tarde de hoje e, conforme era planejado pelos produtores, roteiristas e pelo diretor do filme, subi no ônibus de volta para casa ainda tonto, ainda tentando organizar um discurso coerente contra o repugnante discurso pró-consumismo monetário que o filme estimulava. E, quanto mais eu tentava difamar o que o filme tinha de pior, mais eu percebia a mim mesmo como feliz. Hoje eu estava feliz!

Independente de eu ter certeza da funcionalidade minuciosa do filme enquanto placebo de um mal que ele próprio ajudou a causar e disseminar entre as mulheres subsumidas à globalização hollywoodiana, o chororô depressivo que ele continha ia de encontro a algumas de minhas teorias básicas e auto-experimentadas do bem-estar romântico como sendo essencial para a assunção de um estado contrário ao que possa ser definido como tristeza. E eu estava feliz! Os ônibus em que eu subi estavam entupidos de pessoas com problemas, eu estava sentindo muita fome, queria conversar com pessoas que não tinham tempo ou disposição para falar comigo naquele instante, mas eu estava feliz! E era bom mesmo assim...

Cotejando a minha insistente felicidade com o que este tipo de filme me causa, percebi que só ficava repetindo para mim mesmo que estava feliz porque eu estava a questionar o próprio fundamento do que seria felicidade. Primeira grande charada da literatura de auto-ajuda: obrigar-nos a ficar rotulando momentos como “bons” ou “ruins”, quando, na verdade, esta dicotomia é muito primária e reducionista diante das infinitas possibilidades sentimentais que nos abatem quando reagimos aos trocentos estímulos sensoriais e fenomênicos que nos cercam neste mundo grande de Nosso Senhor. Tinha que pensar noutra coisa!

Cheguei em casa, deitei um pouco na cama de minha mãe, li mais algumas páginas decisivas do clássico literário de Virginia Woolf que ora me entristece de prazer e ouvi duas vezes seguidas o disco “Into the Labyrinth” (1993), da dupla especializada em música gótica Dead Can Dance, formado pelo sombrio Brendan Perry e pela egrégia Lisa Gerrard. E ouvir aquilo era muito melhor que auto-ajuda!

Descobri esta dupla graças às recomendações esforçadas e salvaguardadoras de meu amigo Renison, que destacou a beleza poética e medievalmente anglofílica das faixas contíguas “The Wind That Shakes the Barley” (faixa 03), “The Carnival is Over” (04) e “Ariadne” (05). Mas foram os experimentos de Lisa Gerrard com a glossolalia que mais me encantaram: a faixa inicial, “Yulunga (Spirit Dance)”, a faixa 06, “Saldek” e a faixa 10, “Emmeleia”, fazem-me rodopiar em transe pela sala, enquanto as vizinhas ficam gritando: “que música de agouro é esta, Wesley?!”. E eu bem que poderia responder, se pensasse nisso, tal qual penso de vez em quando ao me dar conta que respiro através das narinas: HOJE EU ESTAVA FELIZ!

Wesley PC>

“PROFUMO DI DONNA” (1974) OU POR QUE EU ESTOU VIVO AGORA!

Já escrevi um texto imenso e empolgado sobre este filme em meu Fotolog, mas não foi nem um pouco suficiente para aplacar o quanto “Perfume de Mulher” (1974, de Dino Risi) me fez bem, o quanto este filme é maravilhoso! Cada segundo de película esmagava de prazer meus sentidos, mostrava-me o quanto a vida pode ser – e é, efetivamente – maravilhosa em cada segundo, não importa o quanto estejamos (voluntariamente ou não) submetidos a privações como os sentidos... É um filme que merece, sem reservas, um adjetivo que eu utilizo com cuidado cada vez mais reservado: PERFEITO!

Já tinha visto a perniciosa regravação norte-americana mais de uma vez em minha vida e sempre me irritava violentamente com os aspectos que nãos constam nesta obra-prima original: em ambos os roteiros, um jovenzinho pobre e submetido ao serviço militar como fonte de renda aproveita um saldo de férias para cuidar de um capitão aposentado por invalidez: sofrera um grave acidente de trabalho, perdera uma mão e a visão, e agora está rabugento, carecendo de um pretexto semanal para tentar reviver os maiores prazeres de sua juventude. Se, no segundo filme, estes prazeres são acompanhados pela reabilitação moral (no sentido mais tacanho do termo) dos dois protagonistas, jovem e velho, e pela propaganda descarada de uma dada marca de automóveis, o primeiro não tem reservas: desce ao submundo da prostituição italiana, das canções bregas de Peppino Di Cappri, à vida cálida que tanto caracteriza o cinema daquele país. E, como se não fosse suficiente, lá estava um de meus músicos favoritos na merencória e terna trilha sonora: o companheiro climático de Ettore Scola, Armando Trovajoli. Epifania, meu Deus, epifania!

E, como se o enredo do filme não fosse suficientemente emocionante, acabo de descobrir mais um dado pungente sobre ele: o belo e ingênuo jovenzinho Alessandro Momo, que interpreta o imberbe acompanhante do austero Fausto (magnífica personificação do genial Vittorio Gassman) falecera cinco dias antes de completar 21 anos de idade, no ano mesmo em que este filme ficara pronto, em decorrência de um acidente de moto, sendo que o veículo em pauta fora empolgadamente comprado com o salário que o ator recebera por sua terna participação no filme. Glupt! Tão lindo ele... E eu que imaginava a mim mesmo morrendo virgem enquanto contemplava sua passagem pela tela!

Se o filme já era perfeito por si, dotado de mais este contributo efetivamente dramático, é soberanamente escalado como um dos melhores de minha vida, como um dos filmes que melhor me servirão de cartilha comportamental, como uma aplicação respeitosa e não onerosa do ‘carpe diem’ religioso. A cena mostrada em fotografia, infinitamente mais melancólica do que necessariamente sensual, que o diga. Vale frisar: a bela rapariga está nua e apaixonada, mas o protagonista é cego. Obra-prima!

Wesley PC>

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

CARTEIRINHA DE IMPRENSA SAINDO?

Faz um bom tempo que eu não revejo “A Montanha dos Sete Abutres” (1951), filme canônico sobre jornalismo oportunista que fora dirigido por Billy Wilder e até hoje serve de referência para quem não quer sujar suas mãos com podridão no exercício do dever. Como este filme voltou a estar em evidência depois do episódio envolvendo os mineiros soterrados no Chile, um vizinho perguntou o que eu achava desta obra-prima hollywoodiana. Duas horas foram poucas para que eu expressasse toda a minha empolgação e, como se não fosse suficiente, na madrugada de hoje, eu fui afligido por uma crise profissional de insônia, visto que precisava cobrir uma pauta comportamental que me passaram enquanto atividade avaliativa de uma disciplina da UFS. O porquê da crise: a escrita essencialmente jornalística difere bastante dos vícios acadêmico-articulistas a que estou habituado e do subjetivismo ferrenho que eu esbanjo neste ‘blog’. Algumas das pessoas que leram meu exercício disseram não reconhecer meu estilo, apesar de perceberem algumas de minhas obsessões temáticas no texto. Ofereço-me, portanto, ao escárnio público: por favor, comentem com sinceridade aqui. Uma nova faceta de meu “eu” surge!

Wesley PC>

CADA PAÍS TEM OS ELEITORES QUE MERECE!

Conforme antecipei noutra situação, este ano não sinto vontade ou motivação para votar nulo. Alguns de meus vizinhos, inclusive, são rechaçados quando dizem que desejam votar em branco. “Tu vais passar um tempão na fila para depois perder seu voto?!”: este é o argumento-padrão que ouço, no sentido mais comunal do termo, quando alguém diz que não vai optar por candidato algum, demonstrando assim sua fúria em relação à obrigação eleitoral. Antes de dormir, angustiado que estava por causa de um trabalho escolar, deparei-me com esta suposta (e pretensiosa) imagem de protesto, protagonizada pelo vocalista da banda Detonautas Roque Clube, Tico Santa Cruz, que não perde a chance de dizer em seu ‘blog’ pessoal que se masturba várias vezes por dia. A quem ele está ferindo com este ato? A quem ele deseja incomodar? O que este gesto tem de realmente reclamante? Prefiro deixar o próprio autor do protesto falar, noutro contexto, ao descrever como ele depilou o próprio corpo, por pura vontade de experimentação: Hoje estava tomando banho, pensando na vida, olhando a água escorrer quando tive uma idéia dessas que revolucionam a existência humana. Resolvi pegar um barbeador e raspar todos os pêlos do meu corpo, com exceção da barba e do cabelo. (...) O lado bom é que agora passo a mão e mim e sinto a pele macia **risos**, sexy não? Será que minha masculinidade pode ser afetada por isso?”. Acho que ano que vem ele se lança como candidato. E pensar que eu já estive abaixo de um palco em que ele esteve...

Wesley PC>

domingo, 17 de outubro de 2010

“SOMENTE DEVOTANDO-NOS AOS OUTROS É QUE PODEMOS DESENVOLVER A NÓS MESMOS”?

Recentemente, tive uma conversa demorada com um ser humano sobre as opções que motivam outros seres humanos a optarem conscientemente por ações que possam ser facilmente definidas com boas ou más. ESCOLHA, portanto, pareceu ser o termo-chave, ainda que eu pessoalmente acredite que, não só em meu caso como em muitos outros, em dado momento apurado de nossas experiências, tais escolhas passam a dar-se de forma subconsciente.

Esta minha crença, não por acaso, mas talvez por uma agradável coincidência, é o que baliza o enredo de “O Médico e o Monstro” (1920, de John S. Robertson), versão cinematográfica primeva para o clássico romance de Robert Louis Stevenson a que acabo de assistir. Não somente assistir, como também, em diversas seqüências, identificar similaridades com algumas de minhas doutrinas ativistas!

Intimamente, à medida que a trama evoluía, eu exultava com o quanto este belo filme mudo tinha a ver com assuntos que se tornam chavões positivos de meu dia-a-dia. Mais do que nunca, os questionamentos acerca dos imperativos categóricos kantianos voltam à baila: seria eu um bom homem? Agiria eu de bom tom?

No cerne da própria trama, algumas modificações formais em relação á estrutura do romance: o que é narrado em ‘flashback’ na versão escrita, é linearizado na versão cinematográfica. No começo, vemos o bondoso e filantrópico Dr. Jekyll (vivido pelo celebre e intimidador John Barrymore) ajudando alguns desabrigados a curarem-se de suas moléstias. Alguém lhe pergunta se, ao devotar-se sobremaneira a estas pessoas, ele não estaria negligenciando o seu próprio desenvolvimento. A resposta é o questionamento do título.

Amar indiscriminadamente ao próximo é algo que não é bem compreendido por todos, de maneira que a filantropia e a bondade inata do médico passam a ser questionadas por seus colegas, que o levam a um cabaré, tentando fazer com que ele “caia em tentação”. Consciente de que pode sucumbir ao mal, o Dr. Jekyll resolve criar uma formula que permite dissociar os instintos negativos e positivos de uma mesma pessoa em corpos diferentes. E assim nasce o Mr. Hyde!

Levemente semelhante ao médico na aparência física (afinal de contas, é o mesmo ator e a mesma pessoa!), Mr. Hyde distingue-se completamente dele em suas ações. Ele é perverso, adúltero, colérico e etílico. Instala o caos e a desonra por onde passa. Até alguns goles de uma dada fórmula trazem de volta o plácido e bondoso Dr. Jekyll, apaixonado e amado e retorno pela frágil Millicent, filha de um colega que discorda veementemente de seus ideais científicos.

Desastrosa e previsivelmente, torna-se cada vez mais difícil afastar a influência nociva do Mr. Hyde. E o que acontece no filme a partir de então é aquilo a que estamos acostumados nas trocentas versões desta mesma estória. Porém, o que me surpreendeu aqui foi o tom eminentemente dramático concedido à narrativa, conforme atesta o belíssimo intertítulo que escolhi como ilustração. O filme não se preocupa apenas em contar uma estória assustadora. Ele possui intentos morais bastante definidos e, por concordar em essência cm eles, fui particularmente fisgado pela beleza do filme. Era como se eu estivesse lá!

Orgulho, vaidade, luxúria, arrogância e prepotência são, portanto, os defeitos humanos mais condenados pelo filme, sendo que estes mesmos defeitos, a depender do contexto, são estimulados como designadores de hombridade clicherosa em produtos típicos de Hollywood, em especial, os atuais, dominados pela faceta mais cruel e imponente do que convencionou-se chamar de “lógica cultural do capitalismo tardio” (ou seja, pós-modernismo). Vi este filme imperfeito e bonito não apenas como um filme, mas como uma lição de moral, um gancho temático com diálogos sôfregos e recentes, que explicam o porquê de eu insistir tanto para que este texto rasteiro fosse composto por oito parágrafos: porque eu acredito que a resposta à pergunta do título seja SIM. Quanto mais eu me devoto a outrem, mais eu percebo que, antes de amá-lo, amo também a mim mesmo e ao que entendo como Deus!

Wesley PC>

CONTRADIÇÕES DO “JOGO DO CONTENTE”:

O que é “ser bom”? O quão aplicável é, hoje em dia, o princípio do “não faça com os outros aquilo que tu não gostarias que fizessem contigo mesmo” ou vice-versa? E se as pessoas para as quais endereçamos nossos bons sentimentos não souberem retribuir nossos atos, isto interfere em nossa decisão de repeti-los? Vá e não peques mais”, disse o filho do Senhor a uma mulher prestes a ser apedrejada por adultério. O que teria acontecido com ela depois?

Na manhã de hoje, imbuído deste tipo de sentimento, reflexão e saudades, assisti ao clássico “Pollyanna” (1919, de Paul Powell), baseado no famoso livro de Eleanor H. Porter, sobre a órfã feliz que promete à sua falecida mãe e ao pai moribundo que será feliz haja o que houver contigo. E há! Ela é levada para vive com uma tia solteirona e rabugenta depois que o pai morre, suporta frio, mormaço e más condições climáticas variadas, apaixona-se ainda em tenra idade e é vilipendiada por seu pretendente imaturo e é, finalmente, atropelada quando tenta salvar uma garotinha de ter o mesmo destino. Ficará ela paralítica até o final?

Para além das boas intenções inquestionáveis do filme, Pollyanna é uma criança. Interpretada pela oportunista Mary Pickford, uma falsa jovem que se tornou uma das primeiras grandes milionárias de Hollywood, a protagonista mata uma mosca com o discurso de que, assim, está adiantando a sua chegada ao Céu e, noutra cena, força um cachorro a puxar ela e um bebê num simulacro de carroça. Isto é ser boa? Isto é aplicar o “jogo do contente”? E se eu disser que ela não sabia que estava fazendo o mal ao praticar estas ações, que nem os clérigos que estimulam a matança de peixes e perus na Semana Santa e no Natal, respectivamente? Quem sou eu para julgar?! Meus valores são bem outros...

Lembro agora de um episódio do seriado televiso “House”, em que uma personagem feminina diz que a natureza é tão sabia que acrescentou o gozo mais desejado de todos ao sexo, a fim de que não percebêssemos o quanto esta atividade instintiva é repleta de nojo e violência. Eu é que não discordo disso (risos). Eis uma forma mui acessível de fazer o bem e receber o mesmo bem em retorno!

Wesley PC>

A ILUSÃO DO ARREPENDIMENTO VERSUS A CERTEZA DA CULPABILIDADE:

Minha mãe gosta do padre Fábio de Melo. Não a culpo. Tanto é que, por não ter nada a perder, adquiri um disco dele para ela. Um disco que ela gosta muito e que estava a ouvir pela enésima vez nesta tarde de sábado. E, em meio às canções, o padre enseja pequenos sermões repletos de metáforas. Num deles, ele diferencia culpa de arrependimento, atribuindo características positivas ao segundo sentimento e uma carga negativa ao primeiro, que comumente se apossa de mim, não por acaso. Estou tomado pela culpa agora. Sinto culpa até mesmo por sentir saudades de outrem!

Tomado pela culpa, vi um filme que alguns amigos de Gomorra elogiaram: “Lua Negra” (1974), do diretor francês Louis Malle. Apesar de gostar muito da inventividade e sensualidade do diretor, desgostei do filme. Achei-o enfadonho, detestei os diálogos e achei a protagonista insuportável. Mas me vi atraído pela pletora de animais no filme. Volta e meia, minha mãe perguntava: “esta cabra berrando é no filme ou em nosso quintal?”. Por vezes, era-me difícil responder...

No filme, chamado de “O Unicórnio” em Portugal – olha só! – a inexpressiva protagonista Cathryn Harrison foge de um mundo apocalíptico em guerra. Por vezes, ela pensa que está apenas a delirar. Noutras situações, ela realmente se vê compungida a crer que interage com seres mitológicos e com animais e plantas falantes. Estaria ela dopada? Estaria ela perto da morte? Só sei que, mesmo possuindo seios curtos, ela oferece suas mamas como potencial fonte de alimentação alheia em duas cenas-chave do filme. E, ao menos estas, me cativaram bastante! Mas não aliviaram a minha culpa...

Conferindo algumas críticas sobre o filme na Internet, percebo que o apelo popular elogioso sobre ele é intenso. Insisto que não gostei, tal qual Debora. E enviei uma mensagem de celular para um católico, explicando-lhe o que aprendi com o padre Fábio de Melo (risos). Não sei se acredito nele, visto que, não raro, culpa e arrependimento andam de mãos dadas comigo, ao mesmo tempo! Mas, deixe quieto: aprender a viver neste mundo é respeitar as opiniões alheias. Alguém quer mamar em meu peito?

Wesley PC>