terça-feira, 4 de novembro de 2008

“A MORTE É UMA INVENÇÃO DA DIREITA!”


Atendendo a pedidos, eu felizmente consegui recuperar o texto com o qual pretendi homenagear Helenilza, nossa amiga, namorada de Bruno/Danilo, que faleceu em Gomorra. Luto reivindicativo para ela:
Em 27 de outubro de 1976, o cineasta que pronunciou a provocativa frase que dá título a esta postagem soube, através do rádio, que o corpo de seu amigo Di Cavalcante estava sendo velado no Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro. Sem pestanejar, pegou uma câmera, reuniu alguns amigos de equipe e partiu para o velório, onde, sem qualquer permissão da família do pintor (ou de quem quiser que estivesse lá), fez uma grande baderna, filmou o cadáver em primeiríssimo plano, com seu rosto inchado, entupido de algodão, enquanto gritava poesias de que ambos gostavam. Algum tempo depois, este tumulto transformou-se no magistral curta-metragem “Di” (1977), que possui uma infinidade de títulos, além desta simples apelido com duas letras.

Além das polêmicas imagens do velório e do enterro, em que o referido cineasta Glauber Rocha desrespeita as convenções burguesas do luto e proclama em alto e bom som que seu amigo não deve ser lembrado como morto, mas sim como vivo e ativo, o curta-metragem “Di” também utiliza canções de Lamartine Babo, Jorge Ben e Paulinho da Viola para honrar a memória do pintor Di Cavalcante, cujas imagens cadavéricas foram captadas e mostradas em meio a uma narração futebolística de caráter radiofônico. O filme até hoje tem sua exibição pública proibida pela família do pintor, mas, para mim, é uma das mais extraordinárias demonstrações de amizade já realizadas através do cinema. Se um ia eu morrer e algum de meus amigos estiver vivo, quero que façam o mesmo em meu velório – supondo que me concedem esta execrável e comumente hipócrita cerimônia burguesa.

Trouxe esta bela evocação da amizade à tona porque, em 20 de outubro de 2008, enquanto punha potinhos repletos de fezes e urina em meu bolso, recebo um telefonema chocante, dizendo que uma jovem extremamente meiga, de apenas 28 anos, havia falecido, havia tombado em virtude de um infarto fulminante. Não pude ir ao enterro, na cidade de Moita Bonita, em virtude do exame demissional de sangue a que estava sendo submetido mas, ao invés disso, fiquei pensando na garota. Lembrei dela sorrindo, com seu jeito tímido; lembrei que ela não se esquivava de passar a noite fazendo sexo, se isso agradasse também a seu namorado militante; lembrei que, num momento de desconcentração, ela puxou uma faca para mim, na última sexta-feira, emulando os filmes de terror que eu trazia para que ela visse, quase toda quinta-feira; e lembrei que havíamos marcado sessões de dança, a partir da próxima segunda-feira, para que ela nunca mais se envergonhasse quando eu a puxasse freneticamente para dançar, ao som de “Twist and Shout”, de The Beatles. Lembrei dela VIVA!

Na foto, uma imagem anódina do velório, antes de o furacão Glauber Rocha chegar...
Wesley PC>

Um comentário:

Meryone disse...

nao conhecia o pintor cavalcante (procurarei, hoje tudo está na rede) e lamento a morte da sua amiga

lamento muito

há uma cançao dum grupo pop espanhol nao especialmente bo mas que marcou uma época, chamado mecano no que diz "el que muere no vive más". e é o peor, que já nao va estar

fermosa lembrança da sua amiga

por outra parte, você posta mais do que postava eu no meu primeiro tempo do blog

larga vida a balthus e a todos os pintores!

beijos