segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

“NÃO SE CONSTRÓI NADA EM CIMA DE NADA”


Assim diz um padre católico a uma mãe que buscava emprego para seu filho não escolarizado numa obra-prima de Pier Paolo Pasolini. Assim eu aprendi. Mas, até que eu chegasse a esse aprendizado, às 16h da tarde desta segunda-feira, um longo trajeto foi percorrido:

Depois de uma madrugada de sonhos e fantasias, oriundos de uma tarde de domingo ao lado da pessoa que mais necessitava neste mundo naquele momento, acordei. Acordei e percebi que os humores de minha família não estavam bons. Toda e qualquer frase pronunciada era motivo de briga. Motivo: incapacidade de se lidar com os problemas. Como sou eu quem pago as contas de minha casa e a porcaria de meu Seguro-Desemprego ainda não saiu, fui o bode expiatório: agora minha mãe se recusa em falar comigo.

Decidi ficar em jejum. “Quer sabe se eu não consumir nada desta casa, eles percebam a minha invisibilidade?”. Não deu certo. Minha mãe dormiu. Liguei o rádio, para ver se relaxava (apesar de toda esta complicação familiar, era o pensamento fixo em Marcos Vicente que me obsedava). CD escolhido: “O Exercício das Pequenas Coisas” (2001), do Ludov. Faixa 01, “Sério”:

“Tudo é tão difícil pra você
Quem sabe um filme antigo cairia muito bem?
Às vezes, é somente questão de sorrir
O mundo não esquece de você
Quem sabe um novo amigo lhe faria muito bem?
Às vezes é somente questão de ouvir
Os que os outros tem a dizer”


Entendi a indireta. Pus salada com macarrão num prato e liguei a tv. Resolvi ver um filme pasoliniano ao qual ainda não havia tido a graça de assistir. Coincidentemente, um filme maternalista: “Mamma Roma” (1962).

Na trama, uma prostituta invade o casamento do cafajeste que mais amara em vida e diz à nova esposa do dito cujo que não sente inveja de merda. Por dentro, ela o amava. Sempre o amará. Põe o filho pequeno nas costas e muda de cidade. Arranja uma casa nova e uma vida nova como vendedora de figos num mercado. Como sempre, o passado a perseguirá, na forma de seu antigo cafetão, agora separado da esposa e precisando de dinheiro. Paralelamente, o filho conhece o roubo, o sexo fácil e esquecível e a traição, ao passo que nós, espectadores, deliciamo-nos com músicas-tema de Antonio Vivaldi. A desgraça vence. O menino morre num hospital. Achando que ele estava apenas preso, um colega da protagonista tenta consolá-la, dizendo que “são águas que passam, são águas que passam...”. Ela tenta se jogar de uma janela. É segurada por seus companheiros. Vê um cemitério, a miséria de sua cidade e a cúpula de uma igreja, símbolo de um Deus que ela não vê, mas em que não deixa de acreditar... Tive que beber água assim que o filme terminou, a fim de não decair em lágrimas!

E, no rádio, o Ludov continua cantando, “Até o Dia em que Seremos Felizes”, até que, na faixa 05, “Esquece e Vai Sorrir”, a maravilhosa vocalista diz o que eu não tenho coragem de admitir:

“Pois se eu não consigo ser simplesmente um bom amigo, é porque nem mau amigo eu poso ser”...

Não é culpa dele, não é culpa sua...
Obrigado por tudo, Marcos Vicente!

Wesley PC>

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