sábado, 20 de fevereiro de 2010

QUANDO SE É QUASE UM CRIMINOSO AO DESABAFAR...

Numa das cenas mais surpreendentemente bonitas de “L.I.E. – Sem Saída” (2001, de Michael Cuesta), um velho estimula um menino a chorar quando este descobre que seu pai está preso, e que não o havia abandonado, como ele pensava. “Chore, menino. Desabafe, ponha tudo para fora”, repetia o velho, enquanto o garoto chorava. Por alguns minutos, foi esquecido que o velho era um pedófilo inveterado e que a razão de o garoto está sentado em seu sofá era uma dívida pendente em relação ao roubo de um revolver, que iria ser paga com serviços de prostituição. Por mais ilegal que tenha sido o método de aproximação entre o velho e o garoto, eles desenvolveram uma amizade sincera, apoiada no conforto mútuo. Sem querer parecer demasiado apologético a qualquer ilegalidade que se desenvolva no roteiro, senti uma forte ternura pelo personagem mais velho. Estive ao lado dele enquanto tentava consolar o garoto, por quem estava sendo seduzido minutos antes.

Assistindo ao filme, percebei o quanto o diretor e roteirista Michael Cuesta, responsável pelo ótimo seriado televisivo “Dexter” e por um ótimo filme triste de nome “12 Anos e Pouca Ilusão” (2005), é talentoso em seu apoio aos marginais juvenis e aos adultos desconsolados. Lamentei que ele seja tão injustiçado nos circuitos independentes de cinema, que talvez se preocupem com as vertentes amorais de suas tramas e releguem-no a uma posição obliterada nos elogios públicos de filmes sobre adolescentes. Sem dúvida, ele entende o quanto as ações infantis interferem no crescimento dos indivíduos. Com certeza, seus roteiros possuem reverberações biográficas. Tornei-me um fã moderado dele, de maneira que prestarei atenção cuidadosa em sua carreira evolutiva.

Enquanto o garoto chorava e o pedófilo o consolava sem segundas intenções (que fique bem claro!), eu lembrava o título do disco mais executado em minha casa esta semana: “Crying” (1962), de Roy Orbison. Além de simpatizar bastante com a canção-título e com tudo o que emula um clima lynchiano nesta obra-prima da discografia norte-americana, eu cruzei algumas informações contidas no filme e no disco com minha vida pessoal e o resultado foi a letra da faixa 3, composta por Boudleaux Bryant:

“Love hurts, love scars, love wounds and marks
Any heart not tough or strong enough
Take a lot of pain, take a lot of pain
Love is like a cloud and it holds a lot of rain
Love hurts, (ooooo) love hurts”

Wesley PC>

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