terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A DIFERENÇA ENTRE RESPEITAR O PONTO DE VISTA ALHEIO E OUTRA COISA

Não responderei de imediato qual é esta outra coisa, mas sou agora pego de surpresa ao me perceber defendendo não somente um filme ruim ou um filme que não gostei, mas um filme que particularmente me enchia de repulsa comercial em virtude de tudo o que ele representa no plano capitalista. E, justamente por pensar nisso, é que eu sinto aqui a necessidade de defendê-lo: talvez ele seja mal-interpretado, talvez a sua culpa assumida pelos males do mundo atual impeça a dádiva da regeneração moral, a reabilitação significativa ou qualquer uma das impressões que tornem patente que estou aqui a tratar um filme como se fosse uma pessoa. Como um filme é o produto do trabalho de um conjunto de pessoas, talvez não seja uma prosopopéia crítica de todo negativa...

Vamos do começo: há alguns meses, atendi a um convite de minha mãe e vi os 5 filmes até então disponíveis da saga escrita pela J. K. Rowling. Detestei os filmes do Chris Columbus, abominei o capítulo conduzido pelo Mike Newell, fui seduzido pelo trabalho sensual de Alfonso Cuarón e, para minha própria surpresa, apreciei a segurança tramática no que se refere aos descaminhos da política corporativista no filme dirigido pelo até então desconhecido David Yates. Satisfeito que estava por descobrir seu talento recôndito, quis ver “Harry Potter e o Enigma do Príncipe” (2009), mesmo que minha mãe não mais insistisse para tal, e, vendo-o ontem à noite, decepcionei-me bastante com as ingenuidades proféticas do roteiro e com as indefinições tragicômicas de romances adolescentes, mas apreciei deveras a segura direção de David Yates (em quem, pelo visto, devo prestar mais atenção), a trilha sonora firme de Nicholas Hooper (que adolescentiza bem os temas de John Williams) e, principalmente, a ótima vivificação de Alan Rickman como Severus Snape, de longe o melhor personagem da série e que, conforme pude perceber através da fortuita leitura do último livro envolvendo o bruxinho-título, terá participação muito decisiva nos eventos narrativos que se seguirão ao fim anticlimático do filme ora resenhado.

Repetindo: “Harry Potter e o Enigma do Príncipe” é um filme modorrento, verborrágico e disrítmico, mas possui uma excelente equipe técnica sustentacular e, como tal, fez com que eu surpreendentemente abrandasse alguns dos conceitos negativos sobre ele impostos. O que mais me chocou, aliás, durante o acompanhamento espectatorial destes filmes e do livro que li, é que não é uma obra voltada para crianças, não obstante a autora investir em clichês tramáticos voltados a este público-alvo. Não que eu tenha me vendido à contemplação serial hollywoodiana, mas, de coração, enquanto filme, esta produção tem, para dizer o mínimo, um tantinho de alma aprisionada, conforme ficará mais patente para quem seguiu com bravura os longas-metragens antecedentes.

Em verdade, publiquei este texto noutro veículo cibernético, mas, ufa, precisava confessar. Algo está acontecendo comigo: estarei eu demasiadamente tolerante ao Capitalismo à medida que envelheço? Talvez seja tudo culpa dos sacanas que escrevem, produzem e lançam este tipo de filme e sabem que nós, eternamente atormentados por amores não-correspondidos nos identificamos com estes personagens identificados como vilões, mas que... Mas que... Temor, temor...

Wesley PC>

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