Neste exato momento, eu estou escandalizado: não sou fã dos
filmes d’Os Trapalhões, nem devoto do Ariano Suassuna e tenho problemas com a
irregularidade (eventualmente convertida em versatilidade) do Roberto Farias. A
combinação de todos estes elementos em “Os Trapalhões no Auto da Compadecida”
(1987) me deixou chocado: não apenas gostei muito do filme como tive o
privilégio de ver o quarteto interpretando de verdade, não apenas despejando
piadas...
Tudo bem que Renato Aragão como o esperto João Grilo e Dedé
Santana como o pabuloso Chicó apenas concebem variações de seus próprios personagens,
mas o hilário Zacarias como um padeiro traído e Mussum vivificando Jesus Cristo
me surpreenderam bastante!
Muitíssimo bem dirigido, este filme utiliza-se de uma
narrativa teatral metalingüística para apresentar a sua trama, tornada
conhecida do público brasileiro por causa do filme advindo de uma produção
televisiva “O Auto da Compadecida” (2000, de Guel Arraes). Se eu já tinha
restrições – ideológicas, principalmente – a este (tele)filme recente, depois
de constatar o brilhantismo técnico e popularesco deste clássico injustiçado de
Os Trapalhões, eu dou a minha mão à palmatória risória mais uma vez. Os
diálogos envolvendo a cristandade – seja no que se refere à sua cor, “que não é
das melhores, apesar de [ele] falar bem”, à propaganda kardecista vinculada ao sobejo
de ressurreições e ao chiste sobre protestantismo vinculado ao minucioso
conhecimento do Evangelho por conta do personagem, sacro. Como o próprio Ariano
Suassuna foi co-autor do roteiro, ao lado do diretor Roberto Farias, é difícil
saber o que já estava na peça original, o que adveio exclusivamente da versão
cinematográfica e o que foi imposto pela sanha controladora exacerbada do grupo
cômico (de Renato Aragão, sobretudo), mas que eu gargalhei em mais de uma seqüência,
ah, eu gargalhei!
Por conta de uma necessidade tangencial de minha pesquisa
sobre pornochanchadas, tentarei ver a integralidade dos filmes protagonizados
pelo grupo até o final do ano, mas, desde já, confesso-me absoluta e
positivamente chocado com o que estou a descobrir em filmes que eu rejeitei
tanto tempo por pré-conceito. Não era uma filtragem espectatorial equivocada
(defendo os meus motivos, preconceituosos inclusive), mas dou a cara a tapa
neste exato instante: achei o filme espetacular, primoroso e, acima de tudo,
muito inteligente e divertido!
Wesley PC>
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