quinta-feira, 4 de abril de 2013

“ARACAJU NÃO É VILA NEM É POVOAÇÃO! É UMAS CASINHA DE PALHA COBERTINHA DE MELÃO...”

Na noite de ontem, uma desavença pessoal violenta atravessava a minha empolgação em comparecer ao III Festival Sergipano de Teatro, atualmente em voga no Estado. Ainda assim, resolvi conferir uma peça anunciada como “Praia, 1985” no panfleto informativo com a programação do evento. Convidei vários de meus amigos, mas, por motivos diversos, apenas um esteve ao meu lado.

Ao chegar ao local do evento – o Teatro Lourival Baptista – percebi que, na verdade, o nome da peça era “Na Praia, 1855”, baseada num texto de Lina Regina Nunes, encenada pelo Grupo História EnCena e protagonizada por um amigo conhecido por suas opiniões polêmicas. Perguntei-lhe por que ele não me avisara que estaria atuando. Ele deu uma resposta evasiva, mas simpática. Aguardei que o meu companheiro chegasse e, com quase meia-hora de atraso em relação ao horário agendado,  a peça iniciou...

Dirigida por Gustavo Floriano, que adentrou o teatro de forma impressionante, gritando os versos contidos no título desta postagem da platéia, antes de subir no palco e conclamar os seus companheiros de cena a hastearem bandeiras e cantarem um hino emancipatório. Duas personagens supostamente adolescentes, Cléo e Zoé, entravam em cena, com o intuito de realizarem uma pesquisa escolar sobre os motivos que justificaram a mudança da capital sergipana de São Cristóvão para Aracaju, em 17 de março de 1855. Daí para a frente, os demais integrantes do elenco representavam figuras marcantes da História do Estado em que nasci, como o mártir João Bebe Água e o estrategista Barão de Maruim, respectivamente, opositor e entusiasta da mudança da capital.

Apesar de a peça merecer elogios pela audácia musical (os integrantes da banda que executava os temas da peça estavam situados na platéia), ela pecou pela falta de entrosamento de alguns atores com os seus personagens (o intérprete de um padre são-cristovense incomodava pelo sobejo de afetação), pelas coreografadas desengonçadas e efetuadas sem vivacidade, pela obviedade de algumas referências legitimadoras a ícones da Indústria Cultural contemporânea (no caso, a enjoativa Verônica Voz e um pseudo-‘funk’ repetitivamente insuportável), pela sobrepujação dos efeitos de sonoplastia às vozes dos atores, pelos equívocos evidentes de iluminação e pela forçação de barra no tom didático do enredo, que, ao mesmo tempo em que evidenciava os aspectos encomendados da peça, indicavam que ela talvez fosse mais bem-sucedida se tivesse sido exibida à tarde, para uma platéia infanto-juvenil. No ponto de ônibus, inclusive, ouvi de uma desconhecida: “amei a idéia de ensinar sobre a História de Sergipe com tanto humor”. Eu concordei, mas nem todas as boas idéias da peça funcionaram, ao passo em que outras ficaram incompreendidas: qual o motivo de associar o mordomo da casa onde as duas adolescentes estudavam a uma combinação fantasmática (realçada pela trilha sonora) entre o corcunda Quasímodo, o mordomo Tropeço e zumbis andantes de um seriado norte-americano recente? Por mais que eu tenha desgostado desta opção tramática, quem estava ao meu lado na platéia foi taxativo ao indicar que o intérprete deste problemático personagem humorístico era o melhor ator em cena (o que ele se apressou em destacar que não era necessariamente um elogio – risos). Assim sendo, Joel Costa, sou obrigado a concordar com ele: tu foste bravio em sua entrega caricata ao personagem!

Terminada a peça, que parecia muito ruim no começo – em especial por causa dos desempenhos fracos do elenco, que bocejavam em cena e erravam os seus movimentos – “Na Praia, 1855” destacou-se positivamente pela quantidade valorizada de boas intenções e opções audaciosas de encenação (as cenas musicais, por exemplo, eram potencialmente ótimas!). O público pareceu apreciar o resultado, ao passo em que eu insisti em apregoar que, numa encenação mais cuidadosa e ensaiada, talvez a peça atinja com mais precisão os seus intentos. Mas, de antemão, a capacidade de divertir utilizando fatos poucos destacados de nossa História já é digna de aplausos. Parabéns para o grupo História EnCena, portanto!

Wesley PC> 

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