terça-feira, 14 de outubro de 2014

ALÉM, MUITO ALÉM DA DECEPÇÃO FACEBOOKIANA (CONFISSÃO NACIONALISTA, OU ALGO PARECIDO)

Oficialmente, decepcionei-me bastante com a versão de Walter Lima Jr. para a obra-prima literária de José Lins do Rêgo. Infelizmente, o protagonista infantil (vivido, sem muito carisma, por Sávio Rolim) é desrespeitado pelo roteiro, relegado a uma coadjuvação distanciada, que muito me frustrou. Porém, enquanto via o filme, uma reflexão me tomava de assalto, conforme acabo de publicar em meu perfil de Facebook:

"No sábado, numa conversa informal, comentei com um amigo que acabara de voltar de uma temporada documental numa reserva indígena que, agora, eu me assumo como nacionalista, visto que a grande maioria dos filmes que vejo são brasileiros. Ele brincou: "isso é bom e ruim ao mesmo tempo". Perguntei-lhe o porquê do segundo adjetivo, e ele me explicou que, enquanto opção restritiva, o nacionalismo é uma prática perigosa (vide os antecedentes ditatoriais infames). Expliquei que essa postura atual, acentuada após a minha intensa e apaixonada pesquisa de Mestrado, advém muito mais de uma constatação de que existem muitas jóias fílmicas propositalmente obliteradas no Brasil, enquanto as estrangeiras contam com facilidades distributivas avassaladoras. Não por acaso, pouco antes de morrer, o cineasta Paulo Cézar Saraceni (1933-2012) brincou que era um dos patronos do Movimento Sem-Tela, visto que se sentia lamentavelmente desalojado nas salas de cinema de seu próprio país. Ele não era o único, afinal... 

Na manhã de hoje, precisei marcar um exame para minha mãe num hospital público. Tentei, na verdade, visto que, ao chegar no tal posto de saúde, às 6h da manhã, deparei-me com hordas e mais hordas de gente, espalhadas por todas as direções, brigando entre si por conta de espaço, prioridades e condições de atendimento. Fiquei num canto, observando tudo, quando escuto algumas pessoas conversando sobre as eleições deste ano: uma mulher explicava que jamais votaria no Aécio Neves, dado o seu mau desempenho no Estado de Minas Gerais, do qual foi Governador; outra perguntava se Marina Silva ainda tem chances de ganhar, ao que alguém prontamente lhe explicou que ela não está mais concorrendo e que, por conta disso, declarou apoio ao referido candidato rejeitado em seu próprio Estado natal. Ela sorriu, pasmada. Ao final, todos ao meu redor declararam altissonantemente que votariam em Dilma Rousseff, enquanto eu apenas esperava o horário em que seriam distribuídas as senhas... 

Às 7h, uma funcionária do hospital abriu o portão. Qualquer resquício de fila se esquivou e as hordas se espalharam com violência pela recepção. Eu fiquei à distância, tentando saber o que fazer e como me comportar naquela situação. De repente, ouvi a atendente gritando: "alguém mais para o dentista? (Na verdade, ela falou o nome de um odontólogo em particular, mas, por não conhecê-lo, fiei-me apenas em sua profissão). Eu levantei o dedo, à distância. Ela me chamou, perguntou se eu tinha prontuário e marcou uma ficha para mim, dizendo-me que eu seria o sexto a ser atendido naquela manhã. Os atendimentos começariam em meia-hora. O exame de minha mãe, que pretendia agendar inicialmente, teve que ser protelado, pois o setor responsável só funcionaria à tarde. No instante em que digito estas linhas, o meu molar inferior esquerdo está obturado, visto que o dentista achou desaconselhável que eu o extraísse. Entretanto, ele disse que eu precisarei voltar, para adiantar outros tratamentos. O problema é que talvez amanhã ele não vá trabalhar, pois, em conversa com um funcionário no interior da sala (enquanto eu estava com a boca escancarada), ele comentou - talvez brincando - que ainda não recebeu o salário deste mês. Ao voltar para casa, alguém adivinha a nacionalidade do filme que vi? E como está o meu humor neste exato instante? O mundo é bom, criaturas. O mundo é bom!"

Não reli o texto, mas concordei de imediato com o que eu próprio escrevi: por mais decepcionado que eu tenha ficado com o filme, apreciei muito tê-lo visto. Era uma trama essencialmente brasileira, afinal. E é brasileiro que eu me sinto neste exato instante!

Onde quer que esteja, que São Paulo Emílio Salles Gomes me guie...

Wesley PC>

2 comentários:

Gilberto Carlos disse...

Também sou nacionalista e 90% dos filmes que vejo são brasileiros, por isso me identifico com o seu blog. Também tenho um: www.gilbertocarlos-cinema.blogspot.com

Gomorra disse...

Obrigado pela identificação.
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