"No
sábado, numa conversa informal, comentei com um amigo que acabara de
voltar de uma temporada documental numa reserva indígena que, agora, eu
me assumo como nacionalista, visto que a grande maioria dos filmes que
vejo são brasileiros. Ele brincou: "isso é bom e ruim ao mesmo tempo".
Perguntei-lhe o porquê do segundo adjetivo, e ele me explicou que,
enquanto opção restritiva, o nacionalismo é uma prática perigosa (vide
os antecedentes ditatoriais infames). Expliquei que essa postura atual,
acentuada após a minha intensa e apaixonada pesquisa de Mestrado, advém
muito mais de uma constatação de que existem muitas jóias fílmicas
propositalmente obliteradas no Brasil, enquanto as estrangeiras contam
com facilidades distributivas avassaladoras. Não por acaso, pouco antes
de morrer, o cineasta Paulo Cézar Saraceni (1933-2012) brincou que era
um dos patronos do Movimento Sem-Tela, visto que se sentia
lamentavelmente desalojado nas salas de cinema de seu próprio país. Ele
não era o único, afinal...
Na manhã de hoje, precisei marcar um
exame para minha mãe num hospital público. Tentei, na verdade, visto
que, ao chegar no tal posto de saúde, às 6h da manhã, deparei-me com
hordas e mais hordas de gente, espalhadas por todas as direções,
brigando entre si por conta de espaço, prioridades e condições de
atendimento. Fiquei num canto, observando tudo, quando escuto algumas
pessoas conversando sobre as eleições deste ano: uma mulher explicava
que jamais votaria no Aécio Neves, dado o seu mau desempenho no Estado
de Minas Gerais, do qual foi Governador; outra perguntava se Marina
Silva ainda tem chances de ganhar, ao que alguém prontamente lhe
explicou que ela não está mais concorrendo e que, por conta disso,
declarou apoio ao referido candidato rejeitado em seu próprio Estado
natal. Ela sorriu, pasmada. Ao final, todos ao meu redor declararam
altissonantemente que votariam em Dilma Rousseff, enquanto eu apenas
esperava o horário em que seriam distribuídas as senhas...
Às
7h, uma funcionária do hospital abriu o portão. Qualquer resquício de
fila se esquivou e as hordas se espalharam com violência pela recepção.
Eu fiquei à distância, tentando saber o que fazer e como me comportar
naquela situação. De repente, ouvi a atendente gritando: "alguém mais
para o dentista? (Na verdade, ela falou o nome de um odontólogo em
particular, mas, por não conhecê-lo, fiei-me apenas em sua profissão).
Eu levantei o dedo, à distância. Ela me chamou, perguntou se eu tinha
prontuário e marcou uma ficha para mim, dizendo-me que eu seria o sexto a
ser atendido naquela manhã. Os atendimentos começariam em meia-hora. O
exame de minha mãe, que pretendia agendar inicialmente, teve que ser
protelado, pois o setor responsável só funcionaria à tarde. No instante
em que digito estas linhas, o meu molar inferior esquerdo está obturado,
visto que o dentista achou desaconselhável que eu o extraísse.
Entretanto, ele disse que eu precisarei voltar, para adiantar outros
tratamentos. O problema é que talvez amanhã ele não vá trabalhar, pois,
em conversa com um funcionário no interior da sala (enquanto eu estava
com a boca escancarada), ele comentou - talvez brincando - que ainda não
recebeu o salário deste mês. Ao voltar para casa, alguém adivinha a
nacionalidade do filme que vi? E como está o meu humor neste exato
instante? O mundo é bom, criaturas. O mundo é bom!"
Não reli o texto, mas concordei de imediato com o que eu próprio escrevi: por mais decepcionado que eu tenha ficado com o filme, apreciei muito tê-lo visto. Era uma trama essencialmente brasileira, afinal. E é brasileiro que eu me sinto neste exato instante!
Onde quer que esteja, que São Paulo Emílio Salles Gomes me guie...
Wesley PC>
2 comentários:
Também sou nacionalista e 90% dos filmes que vejo são brasileiros, por isso me identifico com o seu blog. Também tenho um: www.gilbertocarlos-cinema.blogspot.com
Obrigado pela identificação.
Adicionando o teu 'blog' aos favoritos aqui.
WPC>
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