Assim propõe uma criança, não por acaso de nome Marcelo
(Pedro Coelho), em “O Anjo da Noite” (1974), um dos poucos filmes de Walter Hugo
Khouri que eu ainda não tinha visto. Acabo de sair da sessão e confesso: estou
impressionado!
Pioneiro no subgênero de terror com ameaças telefônicas a
babás, este filme é protagonizado pela magistral Selma Egrei, cujos olhos
expressivos são utilizados à exaustão dramática pelo diretor, como é freqüente em
seus filmes. Ela interpreta uma estudante de Psicologia contratada para cuidar
de duas crianças numa fazenda, enquanto seus pais riquíssimos cumprem uma obrigação
pequeno-burguesa. A mãe (Lílian Lemmertz) recebe a nova contratada nua; o pai (Fernando
Amaral) a surpreende enquanto ouve músicas de Johann Sebastian Bach. O vigia da
residência (Eliezer Gomes) a conforta: “há vinte e três anos que eu trabalho
aqui”. “Foi há vinte e três anos que eu nasci”, responde a babá, que,
acostumada aos barulhos da cidade, estranha a calmaria do campo. O vigia, por
sua vez, disse que esqueceu os ruídos urbanos e não faz a mínima questão de
lembrar. Vendo que ela não consegue dormir, ele lhe oferece café com pão,
queijo e goiabada. Ela aceita, relutantemente. Ela precisa estudar. Ele afirma
que não sente medo da noite, mas antes uma ansiedade, uma tristeza que
assombra...
No meio da noite, Marcelo acorda. Intimidado pela beleza da
lua, ele aponta a sua metralhadora de brinquedo contra ela. Em plena madrugada,
ele pede à sua babá e ao vigia que eles lhe permitam andar de motocicleta pelo
jardim. Os ruídos do veículo, em mais de um instante, confundem-se com a trilha
musical de Rogério Duprat, que também se mistura com os sons de cigarras. É um filme de terror, sem dúvidas: ao final, babá e
crianças são mortos. Não é uma situação previsível – ou talvez o seja pela
perturbadora obviedade dos fatos inesperados que se concatenam. Minha mãe não agüentou
ver o filme até o final. O achou demasiado fúnebre. De minha parte, aqui eu
entendi preciosamente o quanto o diretor é influenciado pelo Michelangelo
Antonioni: os planos gerais que demonstram o quanto a arquitetura da casa é apavorante
tem tudo a ver com o genial cineasta italiano. “O Anjo da Noite” é um filme
maravilhoso. Uma jóia brasileira clamando para ser devidamente valorizada!
Wesley PC>
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