Assim exclamou o personagem do Canal Brasil Tonhão Borracha,
que apresenta alguns filmes produzidos pela Boca do Lixo paulistana nas madrugadas de
quarta para quinta-feira. Por motivos óbvios, relacionados à tese do
pesquisador Nuno César Abreu acerca da eqüidade entre as classes populares dos
realizadores destes filmes e seus espectadores, o borracheiro é fã
incondicional do cineasta Francisco Cavalcanti, ao mesmo tempo, um dos mais interessantes e medíocres do Brasil, a ponto de sempre lhe conceder um bonequinho
de pé (no sentido erétil do termo – risos). Filme em pauta: “O Cafetão” (1983).
Protagonizado pelo próprio cineasta e Zilda Mayo, este filme
difere da estrutura narrativa desgastadamente tradicional de seus filmes
moralistas por causa da demora em aparecer seu personagem: o filme aborda uma
violenta briga de gangues de financiadores de prostituição, centrada nos
vilanazes Juarez e Gaspar. Logo no começo, um personagem é baleado até ficar em
coma e ser aprisionado pela Polícia, que aguarda que o mesmo retome a consciência para
entrar em ação. Enquanto isso, os dois arqui-inimigos digladiam-se, sendo que um
deles ajunta uma enorme quantia em dinheiro para pagar um grupo de capangas
para assassinar o seu rival. Porém, uma alcaguete que trabalhava como empregada
doméstica revela os planos à cambada oposta, cujo representante é alvejado por
noventa e seis tiros numa cabine telefônica! Antes de morrer, ele havia
deixado duas malas contendo uma metralhadora e uma vasta quantia em dinheiro
nas mãos de um engraxate solícito, que aceitou cuidar das mesmas, sem saber o
que havia dentro, enquanto o mesmo disse que ia ao banheiro. Aí o filme abre
uma interessantíssima brecha narrativa...
Morando num barraco em companhia de sua esposa lúbrica (que pode até sentir fome ou fadiga, mas nunca falta de vontade de fazer sexo!), o
personagem vivificado pelo diretor, de nome Pedro, não tem sequer o que comer,
mas defende a honestidade a todo custo. Deixa cair o único ovo disponível em
sua casa, mas não perde a chance de foder com a mulher e com uma vizinha,
quando a primeira sai para o trabalho. Até que, depois de tentar em vão vender
as malas para um penhorista, arromba as mesmas, encontra o dinheiro, vive como milionário
esbanjador ao lado de sua mulher por um tempo e, ao final, estará associando a
vida a uma merda novamente, depois de ser perseguido pelos bandidos e torturado
quando o troncudo Satã (vivido pelo homônimo ator habitual do cineasta) ameaça
estuprar a sua esposa. Dentro da lógica moral da narrativa, portanto, o
desfecho é feliz... Violentíssimo, mas paradoxalmente pornográfico e moralizador,
como o diretor nos acostumou a esperar de suas obras!
Apesar de reeditar alguns dos clichês “autorais” de sua
cinematografia bastante prolífica e estilisticamente reconhecível, a demora
para que apareça o mocinho humilde que o diretor comumente encarna, a utilização de
serestas na banda sonora (uma delas, diegética, quando um homossexual afetado
pede para que um violeiro vicinal toque um chorinho) e a ausência de um filho
por parte do protagonista, que aqui é desavergonhadamente adúltero, são elementos
que diferem dos filmes de Francisco Cavalcanti anteriormente comentados neste 'blog'. “O Cafetão” não é um filme que
possa ser chamado de bom, mas está longe de merecer a pecha de indigno de
atenção. Alguns momentos são mais que pitorescos, merecedores de nossas
excitação espectatorial em mais de um quesito. Francisco Cavalcanti é realmente
um bem-intencionado (e sacana) [re]formador de machos, não posso discordar do
borracheiro!
Wesley PC>
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