Na noite de ontem comecei a leitura de “Este Mundo é um
Pandeiro”, livro capital do jornalista Sérgio Augusto sobre as chanchadas
brasileiras, que, apesar do tema supostamente popularesco, apresenta uma
linguagem bastante erudita e minuciosamente informativa no que diz respeito à
elucidação do contexto histórico que permitiu a ascensão do subgênero fílmico
brasileiro que, até então, é publicitariamente consagrado como aquele que mais
conseguiu dialogar com o público.
Particularmente, minha relação com as chanchadas é delicada:
apesar de eu amar algumas delas, no geral, temo concordar com as diatribes típicas
da crítica, que destacavam negativamente os aspectos carnavalescos
desengonçados das mesmas. Em outras palavras: não obstante conterem excelentes
números musicais e elencos bastante homogêneos, as tramas da maioria das
chanchadas não se sustentam, incomodam pela inconstância narrativa. Isso não me
impede de admirara cada vez mais os talentos de Carlos Manga, José Carlos Burle
e, principalmente, o genial Watson Macedo, de quem pretendo ver dois filmes na
tarde de hoje.
Por conta da incisividade temática das chanchadas enquanto
gérmen e meu tema de Mestrado (as ditas “pornochanchadas” da Boca do Lixo
paulistana), preciso deter-me cada vez mais sobre eles e não apenas estudá-las,
mas apreciá-las enquanto obras de arte. No sábado pela manhã, vi “Assim Era a
Atlântida” (1975), documentário clássico de Carlos Manga, em que ele reunia
trechos e participações célebres de alguns dos astros e melhores momentos da
maior produtora de chanchadas do Brasil, a Atlântida, cujos filmes foram
destruídos por conta de um incêndio e de uma enchente, na década de 1970.
Felizmente, nem todos os filmes foram perdidos, mas, mesmo assim, o documentário
apresenta um grave problema em sua primeira metade: ao invés de analisar as
glórias e títulos do período, ele detém-se demoradamente numa remontagem de
cenas de “Carnaval no Fogo” (1949) e “Aviso aos Navegantes”, ambos clássicos de
Watson Macedo.
A segunda metade de “Assim Era a Atlântida”, por sua vez,
cumpre muitíssimo bem os seus propósitos nostálgicos e, a partir de
rememorações mui pessoais de atores como Cyll Farney, Eliana Macedo, Adelaide
Chiozzo, Norma Bengell, Fada Santoro e Grande Otelo, emocionamo-nos, junto a
eles, diante de uma coleção de seqüências inesquecíveis de clássicos renegados
do nosso cinema. Os elogios ao imortal Oscarito são demorados e assaz
justificados – e, se tudo der certo, hoje mesmo eu estarei corroborando estes
panegíricos: Oscar Lorenzo Jacinto de La Imaculada Concepción Teresa Diaz
(1906-1970) é absolutamente hilário em qualquer aparição em cena! Ainda que
nem, sempre estas aparições se sustentem tramaticamente...
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