quinta-feira, 28 de março de 2013

“QUEM TRANSA COM BICHA É BICHA TAMBÉM!”

Não obstante algumas de minhas intervenções acadêmicas hodiernas deixarem a impressão de que sou um defensor inveterado das pornochanchadas, é mister clarificar que eu desgosto de boa parte delas. O que eu defendo são os filmes que não são pornochanchadas mas são tachados como tal, por motivos oportunistas relativos ao descrédito contestatório que tal pecha induz sobre os ousados e inteligentes filmes produzidos pela Boca do Lixo paulistana.

Dentro deste espaço geográfico-cinematográfico bastante definido, o paulista José Miziara é um membro tangencial. Apesar de alguns de seus últimos filmes terem sido realizados nas imediações da Rua do Triumpho, seus filmes tendem a ser atravessados por um mau gosto conservador que vai de encontro negativo ao tipo de abordagem discursiva que eu pesquiso.

Por mais que eu nutra certa simpatia pelo humor matreiro de “O Bem Dotado – O Homem de Itu” (1978) e “Pecado Horizontal” (1982), antes de ingressar na exibição de “Embalos Alucinantes: A Troca de Casais” (1979), eu divulgava o filme com bastante desconfiança. Ao término da sessão, surpreendo-me ao considerar este o melhor filme do diretor que vi até então [vale lembrar que eu adormeci durante o enfadonho mas pitoresco “Os Rapazes da Difícil Vida Fácil” (1980), que espero ver na íntegra em breve...].

A princípio, ostensivamente pornochachadesco – tanto no que diz respeito à sua sinopse repleta de adultérios e homossexualismo ridicularizado quanto à apresentação burlesca do personagem de Nuno Leal Maia, que não tem escrúpulos nem mesmo para enganar uma criança! – o filme adquire uma impressionante carga dramática à medida que evolui, graças a um roteiro muitíssimo bem-elaborado em suas imbricações subtramáticas e a atuações convincentes e improvisadas, com destaque para a firmeza sorridente do galã Anselmo Duarte.

A canção-tema de Os Carbonos, intitulada “Eu Aproveito Tudo que a Vida me Oferecer”, indica uma qualidade produtiva acima da média em relação ao filme, confirmada na subversão da cafajestice do protagonista Ramon quando ficamos sabemos de sua dramática infância com pai presidiário e “mãe indefinida”, substituída por diversas prostitutas ao longo de sua formação: se, no início, escandalizamo-nos e irritamo-nos com a surra que Ramon aplica em seu primo homossexual (Hélber Rangel), completamente apaixonado por ele, quando flagramo-lo conversando descontraidamente com a apaixonante Valdete (Ana Maria Braga) sobre os motivos que o levaram a cursar Psicologia na faculdade, o personagem é dotado de uma densidade compositiva que vai muito além das funções meramente cômicas a que o filme parecia se prender...

A entrada em cena dos casais ricos com os quais Ramon e sua colega Cris (Lenita Leonardi), adepta do sexo grupal, se envolvem, complexifica ainda mais o ótimo roteiro do filme, que inverte as suas supostas conseqüências trágicas e/ou edificantes no desfecho benevolente com os diversos trapaceiros e mentirosos da estória, que, então, assume-se como um registro ficcional das características amorais típicas da elite aquisitiva da época. Ou seja, de aparentemente ingênua, descompromissada e (in)ofensiva comédia de costumes, o filme tornou-se um valioso retrato sócio-geracional, o qual eu faço questão de defender por seus méritos cinematográficos e narrativos elevados. Se antes da sessão eu estava reticente acerca de seu valor basilar para a minha pesquisa, agora eu empolgo-me ao dizer que, ainda que muitas passagens do filme tenham me irritado pessoalmente, enquanto espectador crítico, eu o recomendo com entusiasmo (aproveitando inclusive para indicar a ótima resenha sobre ele contida neste ‘blog’, especializado nos filmes que estudo), malgrado ainda permanecer com o pé atrás em relação às virtudes directivas do José Miziara... Que venham mais de seus filmes: terei a honra dúbia de ver “Rabo I” (1985) em breve, quem sabe?

Wesley PC> 

3 comentários:

Unknown disse...

Acabei dividindo a atenção entre o filme e uma conversa, o que me passou despercebido algumas cenas e diálogos, inclusive o desfecho do filme. Entretanto, algo que me chamou atenção foi como os personagens (com algumas exceções, como a suposta virgem)faziam discursos em favor da liberdade mas logo depois mostravam seus preconceitos e moralismos. Um exemplo é o amigo "gay" de Sérgio, que ao se travestir, diz ficar burro como as mulheres. Também o senhor rico adpeto do suingue, que prefere ver sua esposa com vários ao perdê-la para um só, sendo mais uma vontade individual do que do próprio casal. Logo logo o filme demonstra uma espécie de luta de "todos contra todos", onde os "parceiros" servem apenas para uma satisfação pessoal sem sinceridade. Talvez eu tenha que rever (sem conversar rsrs) pra entedê-lo melhor. Isso foi o mínimo que pude captar.

Leno de Andrade

Gomorra disse...

Sim, sim, sim, concordo contigo: estas observações adicionais só realçam a extrema validade sociológica do filme. Vale a pena ser revisto e discutido, sim senhor! (WPC>)

Fábio disse...

Que texto pretensioso. Empolado, cansativo e, no fim das contas, vazio. O verdadeiro pseudo-intelectualismo barato.