Fazia tempo que eu não via nada do Xavier Beauvois. Conheci
este (então) jovem cineasta no irregular mas sedutor filme “Não Se Esqueça Que
Você Vai Morrer” (1995), visto faz muito tempo e emulado aqui. Com o passar dos
anos, soube que o Xavier Beauvois envelheceu (mal), mas a simpatia mui particular
que nutro por este filme primevo me levou a ficar bastante curioso quando soube
que “O Pequeno Tenente” (2005) estava sendo exibido numa mostra de cinema
francês local. Perdi o filme à época e nem fiquei tão chateado assim, visto que
me deixei convencer pelas pessoas que o viram no cinema e desgostaram...
Nesta noite de domingo, soube que o filme seria apresentado
num canal fechado francês e, intuitivamente, o indiquei a um sociólogo preocupado
com a investigação de questões raciais e, agora, com as motivações
profissionais de subsunção aos psicofármacos. Por mais de um motivo, soube que
o filme tinha a ver com estes temas, mesmo não tendo-o visto ainda. Assistindo
ao mesmo, fiquei impressionado com a sua qualidade, com a sua firmeza: começa
como um estudo individualizado de personagens, avança em direção a uma
investigação profissional e se revela como um interstício entre ambas as propostas.
O “pequeno tenente” do título é um jovem interiorano que se
forma no Exército e resolve trabalhar num departamento policial parisiense
enquanto sua esposa continua trabalhando como professora numa cidade
interiorana. Na metrópole, ele opta por trabalhar ao lado de uma competente
chefa de polícia que, há dois anos, vem tentando se livrar do alcoolismo. Em
menos de um mês, ele se envolve com um caso de assassinato envolvendo um
sem-teto polonês espancado e afogado por dois criminosos russos. O restante é
pura imersão trabalhista, num viés que traz à tona justamente trabalhos
anteriores do Bertrand Tavernier, com certeza uma influencia definitiva na
carreira beauvoisiana.
Impressionou-me sobremaneira no filme o fato de que, em
quase todos os cômodos onde se passam as ações, havia pôsteres de filmes
famosos, de Quentin Tarantino a Steven Spielberg, de Jean-Pierre Melville a Sergio
Leone. Além disso, a interpretação de Nathalie Baye cresce bastante à medida
que o protagonista Jailil Lespert sutilmente sai de cena, depois que é
esfaqueado por um de seus perseguidos, enquanto o parceiro ingeria cerveja num
bar vizinho. Identifiquei-me bastante com a determinação empregatícia dos
personagens e projetei positivamente a minha própria abstemia em relação ao
comportamento atormentado dos personagens. Numa cena-chave, por exemplo, o
tenente e sua superiora fumam maconha numa praça, quando um transeunte pede um “tapinha”.
Quando eles cedem o baseado, o beneficiado exclama: “vocês não têm medo de
fumar isso por aqui?! O bairro está cheio de tiras!”. Todos sorriem diante da
poderosa ironia da cena. E, se uma das cenas sutis que mais gostei no filme é
aquela em que o tenentezinho admira a sua arma enquanto se deita num quarto de
hospedaria (esta que ostenta o cartaz, aliás), a cena final provou que o cartaz
de “Os Incompreendidos” (1959, de François Truffaut) focalizado numa dada
parede de bar não fora gratuito, casual, aleatório. O mesmo sendo dito sobre o
consolo contido no título desta postagem, proferido quando a chefa do
personagem-título se embebeda com gim depois que ele é hospitalizado em estado
grave de saúde. Deduzo, portanto, que preciso ver mais filmes do Xavier
Beauvois: se o iniciático “Nord” (1991) é difícil de ser encontrado, disponho
de uma cópia de “Homens e Deuses” (2010) em minha casa faz tempo. De
terça-feira não passa...
Wesley PC>
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