Antes de qualquer coisa, das citações recentes que me
perseguem: “os impulsos mais
fundamentais do homem, gerados pela necessidade de auto-identificar-se e de
situar-se no universo – impulsos que são a matriz da atividade criativa: a
reflexão filosófica, a meditação mística, a invenção artística e a pesquisa
científica básica – de uma forma ou outra forma foram subordinados ao processo
de transformação do mundo físico requerido pela acumulação. Atrofiaram-se os
vínculos da criatividade com a vida humana concebida como um fim em si mesma, e
hipertrofiaram-se suas ligações com os instrumentos que utiliza o homem para
transformar o mundo”.
Tal percepção genial da delicada situação econômica brasileira
encontra-se na página 75 de “Criatividade e Dependência na Civilização Industrial”,
livro que o economista paraibano Celso Furtado lançou em 1978 e o qual leio
angustiadamente desde ontem. Não que o livro seja ruim ou irremediavelmente
hermético, longe disso, mas condições estruturais precárias (uma reforma de marcenaria aqui em casa, a reinstalação da carência em meu coração aparentemente seguro,
etc.) dificultam a leitura. E, a fim de relaxar um pouco, vi “Sexo, Sua Única Arma”
(1981, de Geraldo Vietri) antes de dormir, na esperança que um interlocutor contemporâneo
idealizado também o tivesse visto.
No filme, uma moça cega vivida por Selma Egrei chega à
cidade rural onde vive uma família católica de ascendência italiana. O
patriarca ama igualmente os seus descendentes, mas a sua esposa desgosta
ostensivamente de sua nora viúva e do neto judeu. Na verdade, fingindo ser cega
(só descobrimos isso a posteriori), a mulher seduz gradualmente cada membro masculino
da família, incluindo um padre (de quem alega estar grávida) e dois rapazolas
loiros e adolescentemente competitivos. Quase todos morrem ao final, como parte
da consecução bem-sucedida de um plano de vingança da moçoila, que, ao som de
uma trilha sonora que emula Ennio Morricone, confessa tudo a um vinicultor
desnudado e embasbacado com o modo como sucumbiu à perfídia dela...
Dirigido por um especialista em telenovelas de época, a
maior virtude tramática de “Sexo, Sua Única Arma” é justamente este aspecto
folhetinesco, as situações de suspense e as revelações dramáticas impressionantes
que se descortinam de uma seqüência para outra. O momento em que o rapaz judeu
comemora o fato de seu pênis ser circuncidado e, portanto, parecer maior que o
do seu primo, e o desfecho pasoliniano em sua tragicidade encheram-me de
encanto. O filme é quase excelente e injustamente desconhecido, até mesmo pelos
admiradores da Boca do Lixo, como eu. Faço questão de revê-lo em grupo, assim que
possível, enquanto deixo como justificativa verdadeira para a publicação desta
foto pessoal que tem muito a ver com o que sinto neste exato momento –
inclusive ao relembrar o filme – no sentido de que, sim, as dificuldades de
consumar a referida leitura estão me angustiando e exacerbando a minha carência
erotógena. Mas tudo se resolverá até a celebração de meu aniversário, disso eu
tenho certeza!
Wesley PC>
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