segunda-feira, 20 de agosto de 2012

“NÃO É PRECISO CHEGAR AO FUNDO DO POÇO PARA SE ADMITIR QUE PRECISA DE AJUDA” (EU TAMBÉM SOU VICIADO)!

Os conhecedores diretos ou indiretos de minha vida íntima sabem o quanto me digladio pessoalmente em relação àquilo que se entende como “drogas”. Para além da definição extensiva de algumas substâncias como “expansores do músculo cerebral”, a presença de um toxicômano violento e incontido em minha família leva-me a incorrer em julgamentos tendenciosamente moralistas acerca do assunto, de modo que, quando soube que um dos canais afiliados à HBO exibiria o documentário “Vício” (2007), interessei-me diretamente.

O filme, composto por nove segmentos distintos, dirigido por treze renomados documentaristas, inicia-se com uma exposição científica de dados sobre as alarmantes estatísticas de problemas relacionados ao consumo de drogas nos Estados Unidos da América. Alguns médicos e psiquiatras dão seus pareceres sobre o assunto e, em seguida, os segmentos isolados começam a ser apresentados. Analisarei um por um:

 • “Noite de Sábado em um Pronto-Socorro de Dallas” (Jon Alpert): neste segmento, uma câmera frenética acompanha os pacientes que dão entrada no hospital destacado no título. Vemos um rapaz que sofrera uma overdose de heroína, outro que fora esfaqueado durante uma briga por ‘crack’, um rapaz que se embebedara no aniversário de 21 anos, outro que tropeçou por causa de maconha, e, ao final, um caso fatal, relacionado a um acidente automobilístico motivado por causa de substâncias tóxicas. Um retrato cru e direto, com um saudável moralismo científico impregnando o relato hiper-realista. Muito bom;

 • “O Desespero de uma Mãe” (Susan Froemke & Albert Maysles): o currículo dramático dos diretores motivou-me a prestar atenção redobrada a este emocionante depoimento de uma mulher que emite um mandado de busca e prisão contra a sua filha viciada. Antes de a garrota ser encontrada, sua mãe mostra fotografias de diversas fases de sua vida, desde quando ele ingressara numa instituição para crianças superdotadas até o seu estágio atual. Ao final, a própria garota admite que tem um problema, que necessita conhecer novos amigos não-viciados e admite que, para não recair no vício, basta não ficar entediada. Ótimo;

“A Ciência da Recaída” (Eugene Jarecki & Susan Froemke): meu segmento favorito do filme, pois aborda algo que me instiga deveras, a noção de “gatilho”. No episódio, um viciado em cocaína explica corajosamente em que situações ele recai no vício e submete-se a ressonâncias magnéticas de seu cérebro, a fim de demonstrar como funcionam os comandos de avanço e retenção de desejos. A declaração final do protagonista – que diz “talvez eu seja um dependente para sempre, mas prefiro ser um dependente que não se droga” – me emocionou bastante. Foi o episódio em que mais me identifiquei. Extraordinário;

“O Adolescente Viciado” (Kate Davis & David Heilbroner): apesar de eu achar muito contundente que um rapazote de 15 anos se disponha a confessar diante das câmeras que já utilizou diversas drogas, o tom da entrevista e da narração é forçado. As intervenções da mãe e do padrasto do garoto acrescentam pouco ao tema, mas gostei da aparição de outro viciado, Ted, de 17 anos (vide foto), uma gracinha. Ao final, ele se reabilita e deixa a mãe orgulhosa. Por ele,valeu a pena;

• “Representação Cerebral” (Liz Garbus & Rory Kennedy): quiçá o segmento mais clínico do documentário, mostra a neurologista Nora Volkow explicando a um viciado em metanfetaminas de 45 anos como está o seu cérebro por causa da droga. Técnico, mas funcional;

• “Dependência de Opiáceos: Uma Nova Medicação” (D. A. Pennebaker & Chris Hegedus): apesar do imponente crédito directivo, é um segmento bastante convencional, sobre dois jovens viciados em barbitúricos que se submetem a um teste experimental com uma droga chamada Subuxone, mais efetiva que a Metadona. O final apelativo sobre o percentual de jovens estadunidenses que não possuem plano de saúde me desagradou, mas é leve e bem-intencionado;

• “Topiramato: uma Tentativa Clínica para o Alcoolismo” (Alan Raymond & Susan Raymond): clínico e subserviente, este segmento acompanha dois alcoólatras, um velho e um jovem, dispostos a abandonar o vício. Mediano. Não conseguiu prender a minha atenção;

• “Sindicato Local de Encanadores nº 638” (Barbara Kopple): divertido e muito simpático, mostra os esforços do sindicato do título para evitar que seus funcionários sucumbissem ao alcoolismo. Fica melhor quando termina, pois o tempo de reflexão assegura a honestidade da proposta;

• E, por fim, “Mágoas com o Plano de Saúde” (Susan Froemke): sobre as batalhas judiciais de mães que tiveram negados os direitos de cuidares de seus filhos narcodependentes em instituições médicas privadas.

Por mais irregular que seja o conjunto, achei que o documentário como um todo cumpriu muitíssimo bem o sue papel informativo e – por que não – emocionalmente apelativo. A comparação, num dado episódio, com a brecha que se abre para as drogas quando as injeções intraorgânicas de dopamina relacionadas à comida ou ao sexo não são mais efetivas foi-me particularmente importante. Dormirei pensando no assunto: era disso que eu precisava para terminar reflexivo o final de semana. Afinal de contas, tenho meus arremedos de vícios para administrar...

Wesley PC> 

2 comentários:

Jadson Teles disse...

né por nada não, mas acho que vou odiar esse filme.... mas mesmo assim quero ver!

Gomorra disse...

Enquanto eu elogiava o "moralismo cientificizado" do filme, pensei que sim, talvez tu odeies, mas, estatisticamente, o filme é bem-feito, possui bons momentos... Do segundo segmento, acho que tu gostarás... Mas é esperar para ver. Sobre este assunto, nós divergimos radicalmente, é a nossa sina! (WPC>)