quinta-feira, 16 de agosto de 2012

“A PERGUNTA É: ‘O QUE JESUS FARIA?’”

Mesmo que eu não estivesse atravessado por duas crises entrecruzadas de consciência, “A Garota Ideal” (2007, de Craig Gillespie) me destroçaria psicologicamente. Os aspectos do filme que mais me impressionaram, para além da impressionante similaridade com eventos que me ocorreram de ontem para hoje, têm a ver com um questionamento renitente acerca de meu próprio “estar no mundo”: como fazemos para nos livrar de um trauma que, para além de nos tornar pitorescos, também nos caracteriza? Como?

No filme, o terno protagonista vivido por Ryan Gosling tem 27 anos de idade e é solitário. Não se sente necessariamente solitário porque, traumatizado por acreditar ser o assassino de sua mãe (já que ela morreu no parto), ele evita se relacionar com as outras pessoas: usa mais de três camisas – para que ninguém lhe toque – não percebe que uma colega de trabalho está apaixonada por ele e, graças a uma contingência típica dos tempos hodiernos, apaixona-se perdidamente por uma boneca inflável, “meio brasileira, meio dinamarquesa”, a quem chama de Bianca. Ao invés de uma abordagem cômica, entretanto, o diretor Craig Gillespie e a roteirista Nancy Oliver optam por um tratamento dramático, sendo inevitável a imersão pungente.

Quando apresenta a sua namorada ao irmão e à cunhada grávida, o protagonista Lars define-a como uma missionária cadeirante. Diz que a mesma é bastante religiosa e que, como tal, não aceitou dormir no mesmo quarto que ele. Atônitos, eles consentem, mas, após visitarem uma médica solitária – vivida pela grandiosa Patricia Clarkson – chegam à conclusão que a melhor forma de ajudar Lars a lidar com o seu transtorno culposo é fingir que, de fato, Bianca é uma garota de verdade, como propõe o título original do filme. E, diante deste dilema, até mesmo o pároco da região será obrigado a tomar uma decisão.

O que acontece durante o filme não apenas me surpreendeu pela leveza como me espantou pela verossimilhança: o filme não zomba, não julga, não força a barra. O filme se põe ao lado do protagonista e propõe que façamos o mesmo, de modo que não tive como não me sentir contemplado por identificação: há pouco, conversava sobre vários dos pontos abordados no roteiro com um amigo que teima em ser (ou parecer) solitário. Como exemplo contrário (ou extremamente similar?), ofereci a minha teimosia em rejeitar determinados componentes societais. Vi o filme certo no momento certo. E, para minha sorte psicanalítica, minha mãe esteve a meu lado durante a sessão, de modo que eu tive a honra de explicar-lhe a importância da morte simbólica de Bianca numa cena-chave do filme. Gostei muito do que vi, de modo que, se sou obrigado a pedir desculpas pela mediocridade desta análise, é porque não me atrevo ainda a apresentar com detalhes os dois eventos reais entrecruzados que fazem com este filme me seja tão contingentemente significativo. Fica para a próxima... Ou próximas!

Wesley PC> 

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