quarta-feira, 28 de março de 2012

O SANGUE QUE AINDA HÁ EM MINHAS VEIAS LATINO-AMERICANAS!

Há alguns meses, o mais íntimo de meus amigos portou-se discretamente do filme peruano “Contracorrente” (2009, de Javier Fuentes-León). Confiando plenamente no julgamento dele, nunca tive muita vontade de ver o tal filme. Presumia que o mesmo seria chato, guetificado. Vi que ele seria exibido na noite de hoje, achei o anúncio televisivo bonitinho e resolvi me arriscar. Até vim para casa de ônibus, para ver o filme do comecinho!

Não me arrependi do esforço desprendido: algo na constituição essencialmente latino-americana daquela estória de amor (no sentido jamesoniano do termo, enquanto valorizador extremado do realismo mágico enquanto ferramenta de resistência estética) me fez sentir que o sangue pulsava com um fervor que foi obrigado a permanecer adormecido nos últimos dois dias. Amei o filme. Fui tomado por uma identificação potencial, utópica, transferida em segundo plano. Numa reação muito parecida com aquilo a que chamam amor, em perfeita conexão com o refrão da canção linda que é executada durante os créditos finais: quero que tu sejas feliz, mesmo que não seja comigo”!

Na trama, o pescador Miguel (Cristian Mercado) comemora a gravidez de sua esposa Mariela (Tatiana Astengo). Eventualmente, ele é convidado para encomendar os defuntos de sua vila natal ao mar. Descobrimos, aos poucos, que ele alimenta um caso passional com um fotografo que conhece desde a infância. Ele não admite que é homossexual. Talvez nem seja o caso, nem é necessário. E ele está feliz, pois sua mulher está grávida – e é um menino. Contingências fazem com que o fotógrafo se afogue e, depois de morto, seu avantesma começa a se manifestar para Miguel, apenas para Miguel, em momentos que podem ser tão inconvenientes quanto o ato de mamar no peito da esposa prenha, que se questiona acerca de sua fealdade materna imaginária. Até que descobrem um quadro em que Miguel fora pintado nu... E eu me vi transportado para a tela, completamente apaixonado pelo que via, ouvia, sentia e, principalmente, desejava.

Apesar de o desfecho do filme não ser de todo original, os caminhos que conduziram até ele me fizeram pensar num cotejo com o clássico “Barravento” (1961, de Glauber Rocha), não somente por causa de sua ambientação praiana de subsistência, mas principalmente por causa do elemento citadino emancipatório, que, se no revolucionário filme brasileiro, aparecia na forma de um treinamento sindical, no filme peruano surge invertidamente como a homossexualidade artística de um morador considerado forasteiro por seus antigos vizinhos por causa das preferências divergentes da maioria da população. Conclusão: fiquei completamente encantado pelo filme. Ele fala diretamente sobre algo que periga acontecer comigo a qualquer momento, sem contar que vai além das taxonomias restritivas que confundem discurso contra-homofóbico com imposição de tendências pré-determinadas de postura sexualista, cumprindo muito bem a pulsão contida em seu título. Além de ser um filme muito bom, veio a calhar!

Wesley PC>

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