quarta-feira, 14 de março de 2012

“NA VIDA, EXISTEM TRÊS IDADES: A JUVENTUDE, A MATURIDADE E O ‘VOCÊ ESTÁ ÓTIMO!’”

Estranho pensar que eu já tenha achado que desgostava do cineasta Domingos de Oliveira. A cada filme dele que calho de ver, me percebo arrebatado por sua consciência masculina do envelhecimento intelectual, pelos lembretes inclementes da libido cadente, pelos amores circundantes. Recentemente, vi o filme “Amores” (1998) e fiquei emocionado. Dez anos após a realização deste filme, o cineasta realizou “Juventude” (2008), e foi este o filme que acaba de me emocionar. Equivocado, estropiado, mas lindo demais, sô!

Como calha de acontecer, nos filmes dirigidos por ele, a trama de “Juventude” é demasiado simples: três amigos de infância se reúnem na mansão de um deles, o mais rico, judeu. Um deles (Aderbal Freire Filho) possui uma filha viciada em heroína que precisada ser hospitalizada. Resolve pedir dinheiro emprestado ao judeu (Paulo José), que, numa dada situação, quase consente com isso depois que o terceiro deles (interpretado pelo próprio diretor e roteirista) sofre um enfarto. E o sol nascerá novamente. Assim, pura e simplesmente!

Antes, porém, que os deliciosos e inconstantes 72 minutos de projeção do filme se passem, diálogos espirituosos, nostálgicos e, eventualmente, geniais são despejados, atirados magnanimamente sobre nós, espectadores apaixonados. Confesso que me senti tentado a redigir a maioria deles nesta resenha, mas a minha memória seletiva me aconselha a deixar alguns guardados para outras ocasiões: pretendo rever o filme, se possível, bem acompanhado! Mas sinto-me autorizado a reproduzir um dos monólogos iniciais, quando o personagem de Paulo José diz que acreditou em Sigmund Freud e na Psicanálise, de modo que, se tivesse tido coragem e inteligência suficiente, se dedicaria ao autoconhecimento e, quem sabe, poderia até ser feliz... Como eu estava lendo “Totem e tabu” (1913) diante de um amigo querido minutos antes de o filme começar, não consegui conter o encanto: este filme tornou-se especial em minha vida. Se o meu amigo estivesse desaparecido, eu sairia na chuva para procurá-lo!

E, para quem não tenha entendido de imediato a associação entre estes elogios ao filme e a imagem que lhe serve de moldura, antecipo que a mesma faz menção à peça de um único ato “A Ceia dos Cardeais” (1902), de Júlio Dantas, representada pelos amigos do filme em mais de uma situação.: “Eram três os cardeais, já idosos. Da vida, só lhes sobraram apenas alguns parcos prazeres. O poder e a bajulação já não os encantavam.A cena se passa no Vaticano. Sentavam- se à mesa. Comiam faisão, tomavam champanhe e falavam sobre o amor. A louça era Sèvre, em azul e dourado, os cristais mais puros, toalha de rendas e, enquanto a nobre ave era trinchada, em generosos nacos, suas mentes divagavam...”. Assim começa a peça. O filme já terminou, mas continua reverberando em minha mente, minha alma, meu coração...

Wesley PC>

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