segunda-feira, 24 de outubro de 2011

PARA EVITAR AUTOPROMOÇÃO DESVIADA, SERIA MAIS SENSATO QUE EU ME CALASSE?

Acabo de participar de um evento para-fílmico anunciado de forma muito espalhafatosa através de cartazes sensacionalistas espalhados pelo campus de São Cristóvão da Universidade Federal de Sergipe: vi o média-metragem caseiro sergipano “Vida de Calouro” (2011, de Diogo Cysne), dirigido por um estudante de Direito indignado com as frustrações pragmáticas que, segundo o que se subentende da suposta narração autobiográfica do filme, limaram as suas esperanças e idealizações pós-adolescentes relacionadas ao ingresso numa Instituição de Ensino Superior. Antes de ter acesso ao filme, intuía que seu senso de humor seria demasiadamente popularesco. Não esperava, entretanto, ser bombardeado por uma edição tão similar ao “modelo Rede TV!” de provocar o riso. Mais: se, por um lado, é inevitável concordar com um ou outro aspecto genericamente denuncista do filme (e, quando escrevo aqui “genericamente”, poderia me referir a qualquer lugar do globo terrestre), por outros, é lamentável e vergonhosa a tendência do diretor/roteirista/protagonista em confundir pontos de vista e/ou focos de ataque institucional. Dedicar tempo sobressalente a reclamações sobre as condições caloríficas da UFS (desconsiderando-se as circundantes características ambientais nordestinas) e exacerbar pantins típicos de alunos provenientes do sistema particular de ensino (distância entre os locais de ensino, má qualidade da comida, acervo antiquado na biblioteca, saturação burocrática nalguns órgãos institucionais, etc.) dizimaram por quase completo as minhas chances de sentir o mínimo de simpatia por este filme comicamente presunçoso, mas... Eu tentei, juro que tentei!

Para não dizer que o filme é merecedor de uma nota 0,0 (zero), admito que fiquei surpreso com a coragem do onipotente manipulador técnico do filme em interrogar “seriamente” (termo oportunamente utilizado por Diogo Cysne em seu roteiro) o reitor e o vice-reitor da universidade em que, tal qual ele, eu também estudo.Infelizmente, este aluno obcecado pela autopromoção quase patológica de sua própria figura abandona logo este pastiche sardônico de seriedade e se deixa levar por argumentos falaciosos e radicalmente confusos, como julgar as práticas noturnas da fauna humana da UFS a partir das aglomerações de alunos provisoriamente ocupados na Reitoria, destacar negativamente o espaço físico desta mesma Reitoria como sendo marcada por um vazio arquitetonicamente esquemático, vangloriar a pleonástica necessidade de esforço físico que os estudantes precisam desencadear a fim de se locomoverem das salas de aula até a Biblioteca Central e ignorar chulamente os costumes deletérios dos seres humanos que depredam o espaço público, quando a precariedade estrutural deste mesmo espaço tem seus defeitos e má conservação atribuídos unicamente aos responsáveis pela administração do campus. Noutras palavras, para um estudante potencialmente versado em hermenêutica jurídica, a incipiência atroz de senso crítico que abunda nos quase 61 minutos de direção deste filme supera o impacto ruim de uma piada sem graça. Tanto é que, quando o diretor do filme interrompeu as condições sonoras dos créditos finais de seu filme, com a alegação de que estes “duram mais de 5 minutos”, e subiu num púlpito para receber os tomates de repúdio e/ou críticas construtivas sobre o seu filme, eu saí do auditório onde “Vida de Calouro” foi exibido e vim trabalhar. Não somente, com isso, cri que ganhava muito mais como cidadão, indivíduo e ser vivo minimamente imbuído de cultura, mas também – e principalmente – porque não queria arriscar-me a ver minhas insatisfações confundidas (ou propagandeadas) com o ‘bullying’ que ele alega estar sofrendo de alguns espectadores após a sessão do seu filme. Se ‘bullying’, no entendimento proto-jurídico dele estiver relacionado a desagrado veemente diante de um péssimo produto audiovisual, ele somará mais uma dado a seu rol chistoso e inconveniente de estatísticas, posto que, em minha apreciação, o filme é muito, muito pior do que eu suspeitava. E, definitivamente, isto não é um mero embate de egos, mas uma demonstração mínima de racionalidade avaliativa. Erca!

Wesley PC>

9 comentários:

Everlane Moraes disse...

hehehehehehe!

Everlane Moraes disse...

Essas minhas risadas acima são só pras palavras do Wesley e não para o filme, pois que ainda não assiti! quero assisti logo pois que conversei com o diretor e achei ele bem bacana e inclusive humilde, sempre me dizendo que estava começando agora e tinha muito o que aprender!

Gomorra disse...

Assisti ao final do debate com o diretor ontem à noite e sou obrigado a concordar contigo, Everlane, que, em pessoa, ele é muito menos odiável que o personagem principal de seu filme... Mas nada que me impeça de sentir muito pavor diante deste filme, mesmo assim! (WPC>)

Diogo Cysne disse...

Caro Wesley,

há muito venho procurando este seu texto, pois sou extremamente curioso com críticas ao meu trabalho e, como um crítico amador (http://cinelupinha.blogspot.com/), eu conheço o mórbido prazer de se escrever e ler críticas negativas - mesmo que elas se dirijam às minhas próprias obras. É claro que, como este meu comentário funcionará como uma espécie de contra-crítica, também seguirei uma verve mais contundente.

A função primordial de uma crítica - função que muitos, por orgulho exacerbado ou um instinto sádico, esquecem – não é apenas descarregar as frustrações por se ter visto ou lido algo desagradável; é tentar, antes de tudo, revelar ao autor da obra os seus erros e, ainda mais importante, sugerir possíveis correções. O seu texto não cumpre nenhuma destas propostas. Tanto pela precariedade da forma quanto pelos exageros injustificáveis na linguagem, este texto não pode ser considerado uma crítica. No máximo, um grito de revolta ou um post avulso para blogs; uma crítica, jamais. Entretanto, como em momento algum o senhor anuncia a intenção de construir uma crítica, deixo na hipótese que este post funcionaria apenas como um “descarrego de emoções”.

Não senti em momento algum o peso de suas exclamações, tanto porque elas jamais passaram por uma justificativa séria. Elas se resumem, basicamente, ao mesmo grito amuado: “Isto é uma porcaria, isto é uma porcaria, isto é uma porcaria...”. A começar, temos trechos que ultrapassam o conceito de “crítica construtiva” e se encalham na definição de mero “escárnio”. A citar o “parágrafo” (na verdade, trecho) inicial: “evento para-fílmico anunciado de forma espalhafatosa através de cartazes sensacionalistas”. No momento em que terminei esta linha, já soube que não iria aprender nada com esta crítica. De fato, diverti-me, mas foi mais pela forma infantil com que foi escrita.

Logo depois deste trecho, o senhor faz uma afirmação que eu não somente desmenti em quase todas as minhas apresentações como também não tem nenhum fundamento na obra: a de que eu sou um “aluno de Direito indignado com as frustrações pragmáticas que limaram as suas esperanças e idealizações pós-adolescentes relacionadas ao ingresso numa instituição de Ensino Superior”. Ora, por acaso o senhor ignorou totalmente o fato de eu, antes da exibição do filme, ter alegado que, por mais brincadeiras que eu fizesse no filme com as organizações da UFS, eu era um assíduo freqüentador delas? Que eu janto todas as noites no Resun e estudo todos os dias na Bicen sem nenhum problema? Que, no final de tudo, o filme era uma grande “tiração de onda”? De fato, eu creio ter dito isto de forma tão enfática na noite que a sua ignorância deste aviso já deixa em xeque a sua credibilidade como um avaliador de filmes.

Antes fosse esse o menor dos problemas. Como se pode perceber nos trechos que eu destaquei, o senhor tem uma tendência a se valer de um vocabulário hiperbólico e, no fim das contas, inútil. O senhor usa uma linguagem que deixaria confuso até mesmo o mais afetado dos juristas. É uma vergonha, em um ramo em que se exige tanto da clareza de linguagem, que alguém recaia nos mesmos vícios de linguagem que acometem os mais atrasados profissionais do Direito. Só para citar algumas passagens hilariamente afetadas: “onipotente manipulador técnico”, “pastiche sardônico de seriedade”, “falaciosos e radicalmente confusos”, “pleonástica necessidade”, “ignorar chulamente os costumes deletérios...” (CONTINUA)

Diogo Cysne disse...

O mais grave, contudo, é que o senhor não consegue esconder uma latente posição política que dita todos os rumos da sua “crítica” e, talvez, do seu gosto. No geral, eu pude concluir que a sua visão é que eu sou um burguês mimado reclamando de papo cheio. Essa visão fica clara seja no texto ou até mesmo nas tags do post, e uma posição tão simplista já mina muito da credibilidade do autor. Entretanto, se a minha obra tivesse alguma intenção de fazer uma crítica séria, talvez este argumento valesse. Mas, como eu deixei claro inúmeras e inúmeras vezes, este filme não passa de uma gigantesca tiração de onda. “Tiração de onda”: eu não consigo encontrar termo mais apropriado. Ou o senhor acha, sinceramente, que eu tenho algo a reclamar das “distâncias da UFS”, que não é uma universidade particularmente extensa (acredite, eu já estive na USP e sei o que é uma universidade gigantesca)? Levar a sério estes momentos claramente nonsenses não é só ter “falta de humor”; é ter uma grave falta de conexão com a realidade.

Vamos um pouco mais: existem certas críticas que, mesmo em um plano sério, o senhor desconsidera como coisas “típicas de um estudante proveniente de sistema particular de ensino”: a má conservação dos livros na Bicen, saturação burocrática dos órgão públicos e etc. Mas, diga-me uma coisa: estas não SÃO, de fato, coisas ruins? Coisas a serem criticadas, com ou sem brincadeiras? Ou o senhor acha que os vícios do sistema público são justificáveis para alunos provenientes do sistema público de ensino? O senhor, por acaso, é a favor da conformação à mediocridade? Ao trato leviano da coisa pública? O senhor também afirma que minhas críticas ao calor das salas de aula não levam em conta “as circundantes características ambientais nordestinas”. Espera um pouco: então o calor natural do Nordeste justifica a má ventilação das salas de aula? Justifica a falta de esforços de, pelo menos, acrescentar alguns ventiladores às salas?! O senhor segue a mesma linha derrotista e conformista que muitos políticos usam para justificar a própria incompetência: a culpa não é da administração; a culpa é do meio ambiente...!

Agora vamos ao humor da obra. Eu sei que existem tipos de humor que não são universais e aceito que reprovem a minha obra por simplesmente não “comprarem” o seu tipo de humor. Entretanto, o senhor gasta inúmeras linhas apenas para dizer que não gosta do tipo de humor exibido e tenta, com sua típica verborragia, diminuir o tipo de humor nela contido. Sim, há um claro humor do tipo “Pânico na TV”, mas eu não consegui notar (nem o senhor conseguiu exemplificar) onde está o “excessivamente popularesco” neste humor. Só o fato de seguir o mesmo estilo de edição do “Pânico” não significa que ele também se valha de suas baixarias típicas, que eu profundamente desprezo. O senhor também parece ignorar o fato de que o filme bebe de muitas outras influências, principalmente o “Monty Python” e o estilo falastrão de Michael Moore; todos estes tipos de humor se valem do nonsense e possuem um apelo, digamos assim, não muito “intelectual” (sabia que o Monty Python era considerado como baixaria por muitos críticos de seu tempo?). A questão aqui é sempre a mesma: não gosta do humor? Simplesmente descarte-o, pois nada passará de questão de gosto. Ora, eu odiei o filme “Borat”, mas não é por isso que tento diminuir ou difamar o seu tipo peculiar de humor, que cativou milhões de espectadores mundo afora. (CONTINUA)

Diogo Cysne disse...

Para alguém que me classifica como presunçoso e pretensioso, a humildade também parece lhe fazer falta. É estranho (para não dizer “hipócrita”) que, ao invés de participar dos debates ao fim do filme, o senhor tenha simplesmente saído do lugar, considerando-me indigno de sua palavra. Você descreve este ato como algo que o fazia “ganhar mais como cidadão, indivíduo ou ser minimamente imbuído de cultura”; eu descrevo isso como simples e pura covardia. Se não, preguiça intelectual. E justificar a sua ausência por ter medo de que suas críticas fossem tidas como “bullying”... ora, por favor! Eu sei que o Brasil não é ainda a democracia perfeita, mas não somos tão ignorantes como você leva a crer em seu discurso. Além de ter jogado no lixo a sua oportunidade de fazer a diferença e de criticar a obra (ainda por cima na frente da televisão, que daria muito mais visibilidade ao seu esforço), você simplesmente sai pela tangente e some, fazendo-se de vítima.

Não consegui levar o seu post a sério, por mais que tentasse. Semelhante a uma criança esperneando de amuo, este relativamente longa relato que você escreveu poderia ser resumido da seguinte forma: “Não gostei do filme, pois ele nunca fez o meu tipo”. Você deixa claro, nas linhas finais, que entrou na sessão com uma mentalidade formada, e eu não posso fazer nada quanto a isso. Dessa forma, nada mais posso dizer além disso: é uma pena que não tenha gostado do filme. Eu o reembolsaria, se a sessão tivesse custado alguma coisa a não ser o seu tão precioso tempo. Entretanto, eu nada aprendi com este seu grande desabafo e não consigo ver este post de forma séria.

Respondendo à pergunta do título: não. Foi muito insensato você ter se calado no momento.

Tendo dito,
Diogo Cysne.

Pseudokane3 disse...

Fico contente que o objetivo desta minha não-crítica tenha sido atingido, portanto. Fique tranqüilo que, se houvesse o que criticar ali, eu tentaria... Mas, do jeito como o filme se apresentou para mim - menos como filme e mais como "evento" (no pior sentido do termo, algo parecido com a noção debordiana de espetáculo"), não tinha como eu escrever de outra forma: era texto de defesa sim. Tu me deixaste ideologicamente apavorado, o que só se confirma com a hipocrisia consumista e tipicamente classista de algumas de suas contra-argumentações nos comentários acima...

Por outro lado, para mim, diálogo é sempre válido. Desgostei sobremaneira da obra e, tendo visto o finalzinho de tua fala na noite de quinta-feira, percebi que talvez tu não sejas tão "voluntariamente" culpado dalguns dos pavores dos quais eu me vi imputado. Talvez seja um começo, talvez noutro contexto, sei lá...

Mas, deixa quieto, prefiro não me meter nas polêmicas "falsas" que este filme vem engendrando - para além de seu controle e "autoria", aliás. Já li teu 'blog' nalgumas oportunidades, Diogo, e confesso que gostei dalguns de teus comentários sim... Mas, como insistem em te defender por aí, "tu estás começando". OK. Não que isto justifique a teu espalhafatosismo, mas...

E, só reiterando: só não fiquei para o primeiro debate porque tinha que trabalhar... mas a gente vai se encontrar por aí, eu tenho certeza! E, na ocasião, fique tranqüilo que eu separarei bem o que é insatisfação contra a tua obra - que, insisto, eu achei abominável em forma e discurso! - e despeito (ou algo que eu talvez tenha demonstrado) contra tu enquanto pessoa, visse? Todo o resto, é 'doxa'. Ponto.

WPC>

Pseudokane3 disse...

PS: quanto à comparação com o Monty Python, prefiro nem me estender muito, mas... A comparação é errônea, meu caro: estes tinham um senso minucioso de História, eles estudavam muito antes das piadas ultra-escrachadas. Tu, ao contrário (no filme em pauta, pelo menos) não estudou nada. Só cuspiu piadinhas de baixo calão burguês, que, de fato, em desagradam sobremaneira. Não compactou com aquilo nem a pau! Esconjuro! (WPC>)

Diogo Cysne disse...

É bom saber que meu texto serviu para esclarecer alguns pontos de sua visão quanto a meu filme. Fica claro que sua aversão à minha obra se trata mais de um gosto pessoal e de uma incompatibilidade de seu gênio com o dela. Da mesma forma que não consigo gostar de "Borat", por maior que sejam suas supostas qualidades, você não conseguirá gostar de minha obra. Nada mais pode ser feito aqui.

É claro que me intriga o seu estarrecimento por meus "valores ideológicos", além da acusação de "hipocrisia consumista e tipicamente classista" de algumas de minhas contra-argumentações. Acusações desse calibre deveriam ser acompanhadas de explicações e justificativas, mas você continua satisfeito em não ir além de meros impropérios.

Minha única observação é sobre o Monty Python. Minha obra jamais pretendeu SER o Monty Python, mas apenas INSPIROU-SE nele. Da mesma forma que ela ainda bebe de estilos e linhas de programas populares como "CQC", "Pânico na TV", e de alternativos como "O Estranho Mundo dos Seres Audiovisuais", e de documentaristas como Michael Moore, Morgan Spurlock e Christopher Bell, ela trás de Monty Python o espírito anárquico e nonsense, não indo muito além disso. Mais me impressiona é o espírito pythonesco que guiava seus métodos de criação: os Pythons não se preocupavam de serem chamados de "antinacionalistas", "burgueses fanfarrões" (três deles estudaram em Cambridge, dois em Oxford e Terry Gilliam veio do conceituado Occidental College) ou até mesmo de "subversivos" pelos mais puritanos de sua época, tampouco eu irei.