segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

“EU ERA NENÉM, NÃO TINHA TALCO/ MINHA MÃE PASSOU AÇÚCAR EM MIM”: DE CONTROLADOR DAS MULTIDÕES A POSSÍVEL DEDO-DURO – E EU SÓ SEI PORQUE ME CONTARAM!

Imparcialidade e objetividade são dois termos que, no jornalismo, transitam idealisticamente entre a falácia e a utopia. No afã por noticiar o público aquilo que seria relevante, novo ou de interesse público, não raro se comete grandes pecados contra estes dois grandes ideais noticiosos, mas, agora, passadas as 2 horas da madrugada de segunda-feira, 03 de janeiro de 2011, me vejo diante de um verdadeiro dilema espectatorial: “Simonal – Ninguém Sabe o Duro que Dei” (2009), filme de Micael Langer, Calvito Leal & Cláudio Manoel, é ou não é um documentário imparcial e objetivo? Pelo sim, pelo não, adianto aqui a minha perplexidade qualitativa: o filme não somente é ótimo como me lançou de supetão a uma importante passagem da história cultural de meu país que eu, pecaminosamente, ainda não conhecia. Wilson Simonal!

Não por coincidência, no ritual de encontro de amigos do primeiro dia de ano, o namorado de uma grande companheira teceu alguns comentários breves sobre este artista polêmico, dizendo que ele conheceu o sucesso absoluto e, de repente, foi legado ao ostracismo total. Eu não lembrava de conhecer nenhuma canção interpretada pelo Wilson Simonal e perguntei a um amigo mais entrosado com as raízes musicais brasileiras e este me disse que não gostava muito do estilo desse artista. Lembrei que o meu chefe gostou tanto do referido documentário que me presenteou com uma cópia do mesmo e, assistindo-o nesta noite de domingo, fiquei embasbacado com tudo o que descobri: não somente conhecia quase nada sobre este artista (sabia que ele era pai do Wilson Simoninha, e olhe lá!) como ignorava por completo as polêmicas militares em que ele esteve envolvido e, para minha maior perplexidade, os diretores do filme obtiveram um êxito sobressalente ao ouvirem vozes concorrentes no processo de acusação/defesa do cantor, que supostamente estaria vinculado aos militares, quando estes presidiam o Brasil, entre as décadas de 1960 e 1970. Fiquei absolutamente chocado com tudo o que descobri neste documentário, juro!

Se, por um lado, o humorista Chico Anysio tacha de “débil mental” quem considerava o gingado de Wilson Simonal uma apologia ufanista e o cartunista Ziraldo explicava até que ponto sua colaboração com o jornal satírico O Pasquim contribuiu para o repúdio público do artista, por outro, os responsáveis pelo documentário atreveram-se a entrevistar, sem julgar ou questionar negativamente, o ex-contador que fora o pivô da decadência de Wilson Simonal, ex-contador este que teria sido seqüestrado e torturado por colegas militares do cantor, quando este último o acusou de ter desviado dinheiro de seus concertos. Quedei-me paralisado enquanto o tal contador, já idoso, contava a sua versão desacreditada dos fatos. E se for verdade? Do outro lado, o cantor Toni Tornado, o jogador de futebol Pelé e outros companheiros de época do artista defendiam-no, mas... Quem estaria realmente falando a verdade? Não tem como saber, as evidências são insuficientes.

Entretanto, o filme não é focado apenas neste futrico derradeiro da carreira do cantor, que morreu aos 62 anos de idade, vitimado por complicações hepáticas decorrentes do alcoolismo tardio e justificado por uma de suas esposas, mas apresenta riquíssimas imagens de arquivo da fase áurea da carreira do artista, quando ele literalmente regia multidões em seus concertos plenos de euforia e gingado. E, confesso: baixei um disco do artista para conferir o seu talento, mas o tipo de música ou de bailado que ele levava à frente não me conquistou não. Mas darei uma chance à sua voz privilegiada e ao seu carisma nato.

No filme, seus filhos, também músicos, Max de Castro e Wilson Simoninha, tornavam ainda mais pessoal a abordagem mnemônica do filme, melancólico e reverencial por excelência, sendo que eu desgostei bastante do primeiro e nutri uma simpatia benquista pelo segundo. E me senti tão renovado ao aprender mais sobre um capítulo da História do Brasil que eu simplesmente ignorava, como se eu tivesse me rendido propositalmente ao boicote violento que o artista sofreu depois que fora escarafunchado pela mídia, em que o suicídio em cima de um palco foi sugerido como único meio de conseguir obter novamente as palmas acaloradas da platéia. Como o público pode ser cruel com aquele que venerava até poucos instantes! Mesmo sem ter simpatia pela tal da “pilantragem” cantada por Wilson Simonal, negativamente citada por um crítico musical que presta um relevante depoimento ao filme, os vieses íntimos e públicos da carreira do cantor me pareceram escandalosamente dignos de um estudo mais depurado. Quero e preciso saber mais sobre o assunto, ao passo em que friso: “Simonal – Ninguém Sabe o Duro que Dei” é uma aula (bem-sucedida?) de pretensa imparcialidade documental. Dou à equipe técnica do mesmo os mais sinceros parabéns, com tudo o de suspeito que tiver relacionado à colaboração das Indústrias Globo na produção como um todo!

Wesley PC>

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