sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

EM BUSCA DA TRISTEZA PERFEITA NUM CONJUNTO DE CANÇÕES SUPRA-NATALINAS E, (IN)FELIZMENTE, NUNCA A ENCONTRANDO...

Eu queria estar trabalhando nesta noite de Natal. O trabalho liberta”: está lá, inscrito sobre as grades dos campos de concentração nazistas, hoje convertidos em zonas de turismo histórico. Num telejornal, visto há pouco, uma repórter perguntou a uma mendicante o que ela estaria fazendo durante o ‘réveillon’: “estarei nas ruas, pedindo escolas, mas os meus filhos ficarão em casa, viu?”, disse ela para a câmera. Na janela do meu quarto, um irritante pisca-pisca executava canções natalinas tradicionais. E eu imaginava se, em algum lugar do mundo, alguma mulher pobre estaria sendo infibulada com pedaços de vidro extraído de uma árvore artificial comemorativa. Tomara que não. De coração, tomara que não. “Haveria arte sem tristeza?”, perguntou-me um menino bonito, com um largo pedaço de pizza de mussarela nas mãos, na noite de terça-feira. E, como sói acontecer, ano após ano, meu irmão senta em frente a nossa casa e chora. Diz que vai parar de usar drogas degenerativas, mas... Entediado, taca fogo numa pedra de ‘crack’, depois noutra, depois noutra... Minha mãe chupa tangerinas no sofá, enquanto eu busco discos tristes na Internet. Queria ouvir algo completamente impregnado de sordidez, a fim de introduzir a catarse neste coração apertado sabe-se lá por que. O que está me incomodando, meu Deus?! Por dentro, me sinto tão bem. Estive ao lado de quem queria ontem, estou vivo, vejo, ouço e tenho o dom de falar e escrever, mas um desconforto atroz me persegue. Pus algumas faixas do disco “The Holy Bible” (1994), da banda galesa Manic Street Preachers, para serem executadas, enquanto me empanturrava de chocolate, em cima da cama de minha mãe. As letras das canções são impregnadas da tal “tristeza perfeita” citada no título perscrutador desta postagem. Uma delas menciona uma mulher que está sofrendo. Outra descreve o cotidiano de alguém que se define como um aborto ambulante. Uma terceira demonstra como um prego enferrujado é ideal para se rasgar a perna enquanto se morre no verão. O compositor das canções se suicidou. Supostamente, pulou de uma ponte. Seu corpo nunca foi encontrado. A inscrição na entrada do campo de concentração de Dauchau foi uma de suas principais inspirações compositivas. Eu acredito que é importante ter musos na arte. Minha cadela tem medo de fogos de artifício e minha mãe não pode assistir TV no quarto porque este recinto está impregnado de fumaça tóxica. Não é desta vez. Por dentro, eu me sinto bem. Aquele menino é tão bonito... Meu muso!

Wesley PC>

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