terça-feira, 30 de novembro de 2010

“VIADO DOS INFERNOS”!

A tendência patológica ao exibicionismo sentimental é algo que não somente me caracteriza como, de alguma forma, me torna minimamente célebre. A intensidade espetaculosa com que eu extravaso em larga escala o que sinto (mesmo em situações de completo esmigalhamento emocional), por sua vez, é tão literariamente interessante quando é efeito de uma derruição progressiva dos valores interativos que circundam-nos, no grande processo entendido como globalização. É tanto que, quando deparei-me com meu amado cachorro Almodóvar de Castro falecido no chão, o primeiro impulso que tive foi de arrancar as pilhas do controle remoto da TV de minha casa, enfiá-las na câmera fotográfica e fotografá-lo no momento derradeiro, ainda que, por fora, eu sequer conseguisse controlar a tremedeira advinda de meu pranto altissonante. Hoje me vejo diante de uma nova situação como esta e, como tal, talvez precise moderar aqui o que posso confessar (ou não) sobre o assunto:

Às 19h30’ de ontem, recebi uma visita amistosa no trabalho: era um colega de classe pedindo de volta um DVD que ele cria ter perdido, mas que estava comigo, visto que, coincidentemente, tirei aquele dia para reproduzi-lo para mim. Ele, brincando, confessou-me que havia respondido a um teste chistoso no Facebook, perguntando que tipo de bicha ele era. A resposta: “eu sou uma bicha intelectual, Wesley”! Não era mérito meu contrariá-lo ou legitimá-lo. Devolvi seu DVD, agradeci e, na manhã de hoje, assisti a um filme de nome “Johan” (1976, de Philippe Vallois), sobre um diretor de cinema que quer realizar um filme sobre o homem que ama. Ponto.

Antes de ver este filme, porém – filme que é um verdadeiro clássico ‘gay’, apesar de eu sequer conhecê-lo até a noite de ontem! – recebi uma mensagem de celular que muito me constrangeu. Um rapaz que trabalha comigo fora quase reprovado numa disciplina e disse que “o viado dos infernos” que lhe aplicou uma nota baixa o fez “porque não havia sido comido ou fodido direito”. Argumentos homofóbicos e precipitados para externalizar uma raiva que, se é de todo compreensiva, não justifica os adjetivos ora citados. Mais uma vez, pensei que não era mérito meu (imediato, pelo menos, neste caso) contrariar ou legitimar o que quer que eu tivesse lido. Vi o tal filme um tanto mecanicamente, chateado por não coadunar com as mesmas idéias de satisfação sumamente sexual defendidas pelo protagonista-narrador (o próprio cineasta) e fiquei um tanto admirado com a coincidência da realização, muito similar a um projeto para-jornalístico que eu planejava empreender para a semana que vem, até que uma nova mensagem de celular acabou com todo e qualquer plano que eu possa ter sobre o assunto.

Num ‘e-mail’ que enviei na noite de domingo, destinei a seguinte mensagem ao emissor das mensagens de celular destacadas nesta postagem: “Ao estar apaixonado por ti, não venero apenas o seu corpo físico, mas tudo o que te rodeia. Por isso, ao inquirir acerca do que tu fazes, do que te cerca, sinto-me apto a respeitar positivamente todo um contexto egrégio que permite que tu sobrevivas, que tu sejas feliz, que tu te irrites, que tu reapareças no dia seguinte às tuas partidas com estórias para contar. E, como tal, amo tudo o que diz respeito a ti!”. Como se não fosse suficiente, eu continuei: “Mas tu insistes em te manter silencioso (por precaução?) em várias oportunidades. Não é a primeira vez que lido com isso: Deus, o “Deus invisível” a que fui apresentado por Blaise Pascal já agia assim milênios antes de teu nascimento e eu sempre O amei e sempre O amarei. Assim sendo, estás condenado ao meu fanatismo por toda a eternidade (risos). Tomara que eu disponha de forças para não te machucar ou te incomodar mais do que já faço. Te quero bem, pura e simplesmente. E não só a ti!”.

Tínhamos um compromisso trivial, no plano das relações interpessoais amistosas, agendado para o sábado, cuja resposta negativa chega-me hoje de manhã: “Esqueça o filme. Depois daquele ‘e-mail’ tosco que recebi, percebi que você está mesmo ‘surtando por mim”. Essa é minha trágica vida: meninas não se apaixonam por mim, mas homens aparecem às rumas (kkkk). Se você soubesse guardar os seus sentimentos, a gente iria tranqüilo, mas isso não acontece e não quero quebrar a cabeça com ninguém não. Principalmente com um homem apaixonado por mim... Deus me abençoe”. E, conforme se pode perceber nitidamente enquanto escrevo, definitivamente não sei guardar os meus sentimentos. Não vejo nada de errado neles para o fazê-lo, aliás!

Por este motivo, talvez por outros, talvez por nenhum, tudo o que eu planejava escrever (no plano objetivo) sobre o filme citado no segundo parágrafo foi por água abaixo. Tenho que estudar muito hoje, estou de folga, e sinto um aperto, um soco violento nalguma parte indefinível do meu corpo que me impede de sequer querer parecer objetivo. Não o sou e nem quero sê-lo. Minha mãe pediu que eu verificasse algo para meu irmão caçula na Internet e eu terminei sendo um tanto bruto com ela, receoso que a mesma percebesse minhas lágrimas irrefreáveis e perguntasse do que se tratava. E para ela, justamente para ela, eu não poderia dizer nada. Escrevo esta confissão ridícula para o mundo inteiro ler e não posso transmitir este básico sentimento à minha mãe, que tanto me ama e é amada num sentimento mútuo que, infelizmente, nem sempre acomete às pessoas.

Poderia, num golpe profissional de controle espúrio do assunto e da emoção, elogiar o uso pertinente da cena de sexo entre um rapaz branco e outro rapaz negro na fotografia em branco-e-preto do filme, mas isto cai por terra agora. Devo ser mesmo um viado dos infernos mal-fodido...

Que seja declarado luto neste ‘blog’, ao menos por hoje.
Preciso estudar...

Wesley PC>

7 comentários:

tatiana hora disse...

às vezes a gente se sente mal quando o idiota é o outro.
grosseria a dele, não deveria se culpar.

Anônimo disse...

acho de uma beleza impossível de traduzir em palavras seus sentimentos por esse rapaz.



ele vai esfriar a cabeça e ver que foi rude.
talvez pedirá desculpas, talvez não peça, mas aproxime-se de vc como se nada tivesse acontecido.


em qualquer caso, torço pela felicidade dos dois.

Michelle Henriques disse...

"Escrevo esta confissão ridícula para o mundo inteiro ler e não posso transmitir este básico sentimento à minha mãe, que tanto me ama e é amada num sentimento mútuo que, infelizmente, nem sempre acomete às pessoas."

Isso me lembra o filme que vi domingo: Eu matei minha mãe.
Chorei tanto, mas tanto, que nem sei explicar. É ruim qdo vc se identifica com certas coisas que vê na tela. Comigo, acontece constantemente. :/

Pseudokane3 disse...

Eu quero ver este filme...
Muito!
Só faltava alguém com tamanha sensibilidade para me forçar a tal...

Quanto ao menino...
É uma pessoa.
Deixa quieto.
talvez eu seja mesmo o culpado, sei lá.
Quem mandou eu nascer com esta capacidade doentia de sentir?!

WPC>

Pseudokane3 disse...

PS: para mim IDENTIFICAÇÃO é redentora, mesmo quando perigosa e/ou que nos faça chorar tanto, tanto...

WPC>

Hiran Pinel disse...

Você escreve bem demais... No Brasil dizemos: Vá escrever bem assim lá nos infernos! Seu texto emocionou-me. Parabéns... Hiran Pinel.

Gomorra disse...

Coincidentemente, reli esse texto dia desses e doeu na alma mesmo...
Era como se não tivesse sido eu quem escreveu... Comuniquei o fato ao garoto em pauta e ele pediu desculpas. Era como se fosse um consolo. Mas dói ainda!

Obrigado pelo elogio e pelo comentário, Hiran! (WPC>)