sábado, 13 de novembro de 2010

DE COMO COMEÇAR UM VERGONHOSO RELATO AUTOBIOGRÁFICO: ACABO DE LER O LIVRO DA BRUNA SURFISTINHA - ISTO ME FAZ UMA PESSOA MELHOR OU PIOR?

Como começar o relato avaliativo sobre o que li? Penso que talvez a melhor pedida seja uma citação direta, atirar na cara dos leitores desta resenha o que eles encontrarão se se dispuserem a ler “O Doce Veneno do Escorpião – O Diário de uma Garota de Programa”:

“Um dia, pintaram dois clientes juntos. ‘Vocês querem ir um de cada vez?’ ‘Queremos ao mesmo tempo’. Uau! Será que eu agüento? Nunca tinha feito dupla penetração (a tal DP). Dizem que a curiosidade matou o gato. No meu caso, o gato (ou a gata) tem sete vidas e continua vivendo. ‘Vamos nessa!’ No início, nem sabia para quem eu dava mais atenção. Comecei chupando um, quando o outro veio e se ajoelhou ao lado do amigo e eu passei a fazer rodízio de picolé. Beijava um, depois o outro. Fiquei pensando se ia rolar alguma coisa entre eles, como costuma rolar entre as mulheres num ménage. Mas saquei que entre eles não haveria contato nenhum. Só as cabeças dos paus encostavam uma na outra, e mesmo assim quando eu juntava e tentava chupar os dois ao mesmo tempo. Missão difícil... embora não impossível.” (páginas 42-43)

Foi um trecho selecionado com cuidado. Nestas linhas, todo o estilo e “interesse” que possa estar vinculado ao relato da autora está sintetizado. É assim que ela é, é assim que o livro é: linguagem chula, direta, sem rodeios. Vida real, oportunista, capitalizada, repleta de vaidade. Cheia de preconceitos, de senso comum, de putaria sensacionalista. É como se eu estivesse conversando com uma vizinha, no sentido mais dialógico do termo, inclusive! Se isto é ruim? Como diria a autora em várias passagens, “quem está na chuva é para se molhar”. Ou seja, se eu me atrevi a ler esta barbaridade, sabia o que iria encontrar – e encontrei. E, como não seria de todo surpreendente, me identifiquei muito com a personagem real. Para além de nossas diferenças de classe, intelectualidade ou o quer mais que seja, temos algo em comum no que tange ao tom sensacionalista das exposições sexuais, no sentido menos traumático e mais psicanalizante do termo. E basta no que diz respeito aos aspectos “positivos” do livro.

Se eu não consegui odiar de todo “O Doce Veneno do Escorpião”, a sua autora é uma pessoa desagradabilíssima. Viciada em cocaína, mimada, mentirosa, cleptomaníaca, preguiçosa (exceto para foder), desbocada... Não a teria como amiga, mas, enquanto pessoa, defendo a sua existência, defendo os seus direitos legais e, como tal, entendo o que ela quis dizer quando termina seu relato com uma frase-clichê em negrito: “o importante na vida é nunca desistir de buscar a felicidade”. OK, se ela diz...




Ao final do livro, escrito em 2005, ela alega estar feliz num relacionamento amoroso, explicita seu desejo de parir um casal de gêmeos, confessa ter largado a prostituição e as drogas. Único arrependimento: ter realizado um filme pornô, que a incomodou por ser ainda mais mecânico do que algumas das transas ruins a que teve que se submeter. E ela submeteu-se a muitas. Fodas e mais fodas são descritas em detalhes no livro, não sei com que intento... Desabafo apenas? Não sou ingênuo em pensar isso, por mais que ela tente nos convencer (e a si mesma) deste objetivo para-freudiano. Ela quer mesmo é imaginar seus leitores batendo punheta, como deixa escapar numa passagem e, se ela conseguiu sucesso no que tange à minha excitação pessoal, confesso que uma passagem é significativa neste sentido: um trecho adleriano, em que ela explica com minúcias o extremo prazer psicológico que sente quando se via induzida a “descabaçar” vários meninos de 12, 13, 14 anos que apareciam uniformizados no bordel em que ela trabalhava, não por acaso localizado perto da escola em que eles estudavam. Senti-me um tantinho irmanado com ela durante o processo de comunhão entre inexperiência sexual e desvirginização alheia. É algo que alimento enquanto fantasia pessoal. É assim que eu imagino a minha segunda (e definitiva) “primeira vez”...

De resto, sou obrigado a admitir que o livro ‘per si’ não é tão ruim quanto pintam. O que é ruim é que obras como esta recebam a visibilidade midiática que recebem, a ponto de eu ser obrigado aqui a confidenciar o porquê de eu lê-lo com tamanha avidez: um rapaz deveras inconcluso em relação à sua própria sexualidade, por quem me sinto fortemente atraído ou apaixonado ou ambos, volta e meia puxa assunto comigo acerca do lançamento da versão cinematográfica do livro, a ser lançado no ano que vem, sob o título genérico “Bruna Surfistinha”. O diretor é o desconhecido Marcus Baldini, a protagonista é Deborah Secco, a trilha sonora é da banda pretensamente alternativa Cansei de Ser Sexy e houve rumores (não-confirmados) de que o cineasta Karim Aïnouz esteve envolvido no argumento. Pressinto, desde já, coberto de razão, que o filme será de um moralismo atroz, mas não posso deixar de nutrir um ciuminho renitente em relação às expectativas do garoto que me expôs os preparativos para esta produção. Quiçá ele fantasiará diante do filme – porque sim, ele vai ver este filme, visto que ele insiste em ver filmes antecipadamente ruins na tela do cinema! – situações neo-barrocas de pecado defensivo que eu não estou autorizado a alimentar e muito menos a divulgar aqui, o que me traz de volta à estrutura do livro, no parágrafo seguinte, supostamente conclusivo.

Oscilando entre os relatos propriamente ditos das fodas (numa delas, ela faz questão de dizer que sua opção por implantar silicone nos seios é mera exigência profissional, visto que ajuda na prática da “espanhola”, ato de enfiar o pênis no meio dos peitos da mulher) e as angústias típicas do que parece ser uma garotinha adotada por uma família rica que se sente rejeitada na escola por ser gordinha, “O Doce Veneno do Escorpião – O Diário de uma Garota de Programa” consegue entreter-nos em sua primeira metade, mas descamba para uma ridícula auto-terapia ultra-midiática depois que sua autora expõe o que mudou em sua vida depois que concedeu entrevistas no rádio, na TV e viu sua imagem exibida pelo mundo afora. Ela é puta, gosta do que faz, é puta porque gosta, repete isso o livro quase inteiro e, no final das contas, deseja para si o que todo mundo deseja. OK. Direito dela. Escreveu um livro ruim. OK, direito dela também. Agora, como ela mesma diz, lê a porra do livro quem quiser. E eu quis. Por isso, deixa quieto. Assumo aqui meu constrangimento e reafirmo: identifiquei-me muito com o que li ali. Mas, com certeza, ganho mais fazendo outra coisa!

Observação final: o parágrafo acima deveria ser conclusivo, mas esqueci um detalhe fundamental. Quando eu o garoto que me inspirou sentimentos nocivos de ciúme que engendraram a necessidade espúria de ler o livro discutíamos sobre nossos pontos de vista mui diferenciados sobre prostituição, eu disse-lhe que o que mais me incomodava nesta profissão era o entreguismo pecuniário, a transformação do corpo humano (e, algumas vezes, também da alma) em mercadoria, enquanto ele se incomodava com a própria noção convencional de promiscuidade, conforme ele fora educado em sua educação familiar cristã. “Eu não gostaria de sequer imaginar a possibilidade de minha irmã dar a bunda, Wesley. Como tal, não desejo isso para ninguém, acho isso ruim”, disse-me ele. "Acho isto ruim no plano moral, enquanto tu só achas ruim porque envolve dinheiro". Ele tinha razão neste aspecto. Por outro lado, eu intuo que ele já deve ter se excitado pensando na tal da Bruna Surfistinha, apelido profissional para Raquel Pacheco, garota comum de 26 anos que agora sonha em se formar em Psicologia e aplicar na teoria e nas consultas o que já experimentou na prática. E eu acho que já deu para entender o que eu quero dizer com esta mistureba confessional de situações, não é? Sinto ciúmes, sinto inveja, sinto culpa e, mesmo que em pequena medida (ao menos em um dos dois primeiros sentimentos), sei que isto é preocupante quando começo a mergulhar na fase desesperada e terminal de amor platônico em que agora me encontro... E esta estória definitivamente não vai ter fim!

Wesley PC>

6 comentários:

Debs Cruz disse...

Pra além do pessoal, contos eróticos vendem. É lucro!
Não li o livro, mas vi muita entrevista montada dela,
naquela época do alarde.
Não gostei, não vi sinceridade, não gostei.
Ainda mais, ao lado da verdadeira meretriz,
a apresentadora do programa lá.

E ela tinha aquele jeito que eu odeio:
a pessoa se coloca como vítima,
o tempo todo, das suas próprias escolhas.
Não que a gente não erre nas escolhas, mas...
E ela não achava que tinha errado.
Ela dizia que gostava, que fazia pq gostava,
e eu não entendia pq tanta cobrança de compaixão.
E, ao mesmo tempo, uma postura de "mulher do caraleo"
que lança livro e abre a vida.
(Deve ser pra atingir dois públicos hehe)
Ainda mais, sabendo da "mudança de vida" no fim do livro,
especialmente sustentada pela aparição na mídia.
É lindo!

E acho um desperdício liberar essa verba pra fz esse filme.
Ainda mais que a protagonista não é boa atriz. Fudeu!
Provavelmente não vou assistir.
Se fosse de uma puta de verdade...
Com uma atriz de verdade...

Pseudokane3 disse...

Concordo mais do que violentamente contigo, tia! "Se fosse com uma puta de verdade"... Afinal de contas, o livro é pornográfico! No bom e no mau sentido. A autora quer nos excitar a qualquer custo, visto que, como bem frisaste, DRAMA LEGÍTIMO NÃO HÁ! Ela nunca foi espancada (e se gaba disso), gostava realmente do que fazia (vangloria-se de gozar no trabalho volta e meia e de se masturbar entre um programa e outro - pasme!) e comemora ter saído desta vida de programas porque quis, quando quis e levando como brindes alguns 'piercings' e os amigos que conhecera quando ainda eram seus clientes, e com os quais não fode mais - pois NÃO SE FODE COM AMIGOS, diz ela!

Ok... O pior: não acho que o filme tenha interesse público. A biografia pessoal dela é um lixo. Rica e sem conflitos. Cleptomaníaca e viciada porque queria (ela diz isso, não precisava), traumatizada porque era "gordinha" (ah, vai se foder, Raquel!)... No filme, não terá sexo explícito, logo, adeus qualquer interesse fugidio reflexivo mimético!

Se o livro me tocou minimamente, é porque o tom de exposição tem a ver comigo (tu sabes!), mas, fora isso, nunca tinha visto nada sobre ela, nunca vi nenhuma entrevista dela e também desgosto da Deborah Secco, mas, se cheguei até o livro (do qual, até semana passada, não conhecia sequer seu título) foi unicamente por causa do guri que te falei, por causa deste conflito neo-barroco entre falar mal de algo e, ao mesmo tempo, sentir uma atração culpada pelo assunto...

Tu e eu sabemos do que estou a falar... Sabemos sim!

De resto, é isso: a gente sobrevive!

Beijão de sobrinho safado irmanado!

WPC>

tatiana hora disse...

ela casou, não foi?
afinal de contas, o sonho de toda puta é casar?

Pseudokane3 disse...

O sonho de quase toda não-puta também...

Pelo final do livro, ela estava mesmo à beira do matrimônio e da gravidez dupla, mas não sei o que aconteceu depois... Nem quero, aliás! Já basta! (risos)

WPC>

Debs Cruz disse...

Cê vê... nós somos inteiramente diferentes
(eu e a tal aí)
kkkkkkkk
Nem preciso enumerar os porquê's, né?
Ai, ai...
kkkkkkkkkkkk

Eu dei risada com umas partes do seu comentário.
Principalmente, pq sei que nem preciso
ressaltar o que foi.
kkkkkkkkkkk

Conheci ela no programa de luciana gimenez, pense!

Eu sei sim! rs

Outro beijo igualzinho em vc!


Gomorra disse...

kkkkkkkkkkkkkkkkkk

Não, não precisa (risos)
A gente sabe, eu sei.
Não nos tornamos "parentes" à toa (risos)

E as piores partes do livro são justamente estas em que ela se gaba da fama repentina e desnecessária e indigna de comiseração, depois que participa do programa da "meretriz maior", como bem disseste (risos)

Mas, é isso: a gente sabe.

Beijos safados e sinceros e apaixonados,

WPC>