domingo, 8 de agosto de 2010

“VAIS ENCONTRAR O MUNDO, DISSE-ME MEU PAI, À PORTA DO ATENEU. CORAGEM PARA A LUTA”.

Se um dia eu dispuser de qualquer possibilidade de intervenção direta entre os produtores de cinema, eis um livro que eu gostaria de ver transformado em filme: “O Ateneu” (1888), lido tardiamente esta semana, em homenagem ao vindouro aniversário de meu amigo Américo, nome de um personagem que desempenha uma função essencial no romance, para além de sua exigüidade de aparições.

Li o livro após contrárias: de um lado, alguns me impulsionavam em razão dos conflitos morais e sexuais que enriquecem as páginas do romance; de outro, alguns me assustavam, em razão de suas insatisfações com o estilo mui floreado de seu autor Raul Pompéia. Para além das várias expectativas anunciadas que me acompanhavam durante a leitura (já conhecia de antemão o final, por exemplo), encantei-me minuciosamente com o que encontrava a cada página: perfeito o tom do romance, maravilhosas lembranças o autor compartilha conosco, através de seu alter-ego Sérgio, defendendo o que seria a sua “crônica das saudades” com a seguinte réplica:

Saudades verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo – o funeral para sempre das horas”.

Perfeito! Nem boas nem más, lembranças apenas! Não obstante eu lamentar a curta extensão do livro – fiquei tão viciado nele que queria mais e mais e mais! – volta e meia me via tocado por uma encantatória descrição de afeto entre amigos (Capítulo VI: “estimei-o femininamente, porque era grande forte, bravo; porque me podia valer; porque me respeitava, quase tímido, como se não tivesse ânimo de ser amigo”), por definições pungentes e metalingüísticas (também no capítulo VI: “Qual a missão da arte? Originária da propensão erótica fora do amor, a arte é inútil, - inútil como o esplendor corado das pétalas sobre a fecundidade do ovário. Qual a missão das pétalas coradas? De que nos serve a primavera ser verde? As aves cantam. Que se aproveita do cantar das aves? A arte é uma conseqüência e não um preparativo”), por um poderoso aforismo (capítulo XI: “a educação não faz almas: exercita-as. E o exercício moral não vem das belas palavras de virtude, mas do atrito com as circunstâncias”), por vocábulos portugueses que eu não conhecia e, como tal, dependi de diversas consultas ao dicionário (anagógico, didascálico, alcatroado, esplim, facúndia, nédio, faiança)...

Não é um romance perfeito – é bastante defeituoso em seus intentos pretendidos, aliás, supondo que estes mereçam outro nome que não nossas próprias projeções – mas tornou-se um dos melhores que li em vida, o que só é realçado por eu ter sido um daqueles que, tal qual o protagonista, estudou num lugar intitulado Atheneu...

Wesley PC>

Um comentário:

A. Everton Rocha disse...

Li esse livro em 2005!Sabes que depois se suicidara com um tiro no peito? Sofrera perceguição!