sexta-feira, 20 de agosto de 2010

TRÊS DEDOS EM CADA PÉ – MAS NÃO SÓ!

Há alguns dias que eu tencionava ver “Um Irmão Vindo de Outro Planeta” (1984), filme pouco conhecido do genial diretor militante John Sayles, mas só o consegui na manhã de hoje. Como sói acontecer nas obras deste brilhante cineasta-roteirista, o eixo central da trama do filme é um mero pretexto para que ele desencadeie seus discursos pró-igualdade entre raças, contra o racismo, contra o preconceitos aos imigrantes, contra a exploração dos sub-empregados, contra tudo que se expande de forma atroz no Capitalismo. A diferença aqui é que ele se utiliza das convenções genéricas da ficção científica para alargar o conceito de “alienígena”, entendendo o mesmo como meramente estrangeiro. O resultado, obviamente, não somente é genial como faz-nos ecoar experiências pessoais no que tange ao assunto. É o que aconteceu comigo:

Às 17h55’ de ontem, cinco minutos antes da hora de abrir o expediente externo de onde trabalho, uma estagiária do DAA veio alvoroçada à minha procura pois não estava a conseguir entender o que um dado aluno falava, dado que ele era estrangeiro – francês, para ser mais preciso. Fui em busca dele, portanto, cadastrei-o e matriculei-o, treinei algumas de minha palavras galófonas e deixei-o assustado e bem-humorado com minha avassaladora velocidade vocal, ao passo que minhas colegas de trabalho exclamavam o tempo inteiro: “que menino bonito!”. Eu estava tão impregnado de necessidade interativa lata que nem prestei atenção a isso, não obstante admitir que ele se vestia muito bem. Quando o mesmo foi embora, despedimo-nos com certo desconforto [seria ele ‘gay’? teria ele achado que eu estava dando em cima dele por estar sendo tão solícito e/ou simpático? Será que ele se irritou por eu ter repetido ‘presque’ (que significa ‘quase’, uma de minhas palavras favoritas em qualquer idioma) em várias situações responsivas?], de maneira que uma garota que trabalha comigo soltou logo o adágio: “ele deveria se comunicar mais se quisesse mesmo interagir com os habitantes daqui”... Eu e ela somos estudantes de Comunicação Social. Como tal, sorri da observação!

Vendo o filme supracitado na manhã de hoje, esta experiência positiva acompanhou-me de perto: se pareceu tão problemático inserir numa situação tão positiva (cadastrar a matrícula diante de um rapaz profissionalmente simpático como eu), imagina numa situação ainda mais conflituosa! No filme em pauta, por exemplo, há um momento brilhante em que, ao ver um rapaz deitado no chão, morto por overdose de ‘crack’ ou outra droga semelhante, o alienígena se dopa propositalmente para entender o que havia se passado com aquele rapaz negro, de maneira que, ao despertar, é conduzido por um jamaicano às agruras e prazeres da noite no Bronx, num périplo que, ao final, o levará a conhecer o sexo com uma bela e terna mulher terrena, que diz que ele deveria cortar as unhas dos pés, principal indício de que ele era alienígena. O estupor do protagonista, portanto, é bem metonimizado na imagem que acompanha esta postagem. E o meu também: belíssimo filme, inteligentíssimo discurso!

Em algumas horas, estarei de volta ao trabalho. Imagino que não atenderei a nenhum estrangeiro hoje, mas às mesmas pessoas de sempre, alunos pretensiosos e esnobes que se estrangeirizam de propósito em relação a relações sociais e burocráticas básicas e facilmente compreensíveis – para qualquer um, menos para eles! Por sorte, John Sayles deixou-me um pouco mais sabido para enfrentar isso...

Wesley PC>

Um comentário:

tatiana hora disse...

eu sou que nem índio...
j'aime estrangeiros kkkkkkkkkkkk