segunda-feira, 19 de julho de 2010

“RATATATÁÁÁÁÁÁÁ! PRECISO EVITAR QUE UM SAFADO FAÇA MINHA MÃE CHORAR”...

“ – Ai, Sr. João de Deus, dói muito! Estás a ir-me no cu?
- ‘Tou”


Os moradores da rua em que habito dormiram com dificuldade nesta última madrugada. Uma diabética senil que lá vive surtou entre 1h30’ e 3h15’ da manhã e gritou bastante no período de tempo descrito, aproveitando o ensejo para chutar os móveis, empurrar a porta do seu quarto com violência e empreender um verdadeiro escarcéu barulhento. Tão incômodo quanto penoso, no sentido de que até mesmo os moradores viciados em denúncias policiais não sabiam a quem denunciar: como denunciar alguém que reage apenas instintivamente a uma doença? Conclusão inicial: dormi muito pouco nesta madrugada, angustiado com aqueles gritos impotentes!

Como drama pouco é bobagem, despertei de sobressalto na manhã de hoje: enquanto minha mãe lutava no quintal para resgatar uma galinha que voou para o quintal da vizinha e lutava contra os ataques eróticos de nossa cabrita no cio, minha cadela ‘poodle’ Zhang-Ke era estuprada por nosso cão vira-latas Bogdanovich, que tem o triplo do seu tamanho. Ou seja, a cadelinha gritou bastante, apavorando-nos, a mim e à minha mãe. Sem sabermos o que fazer, cometemos o típico erro de jogar água gelada sobre o cão, que ficara engatado em sua parceira sexual forçada, mas, tal qual acontecera com meus vizinhos, cresce o dilema: como denunciar alguém que reage apenas instintivamente a uma doença? Conclusão secundária: fiquei condoído ao perceber que minha cadelinha estava a mancar e que meu cachorro (um mero seguidor dos instintos animas, tadinho) estava tremendo de frio, tamanha a quantidade de água gelada que atiramos sobre ele. Deu pena!

No caminho para a universidade, quis ouvir o famoso disco “Sobrevivendo no Inferno” (1998), do grupo de ‘rap’ paulistano Racionais MC’s, mas ouvi uma buzina automobilística quando me acocorei para amarrar o cadarço branco de meu sapato direito e ganhei carona até o trabalho. Não pude ouvir o disco hoje, portanto, mas estava impregnado com o tipo de reivindicação social irremediável que o grupo tanto proclama: contra quem reclamar? Adianta? E, não por coincidência, o maravilhoso filme português que vi anteontem [“A Comédia de Deus” (1995, de João César Monteiro)], do qual retirei o diálogo que serve de epígrafe a esse texto, contém uma situação similar, em que um ancião sorveteiro seduz garotinhas contratadas para trabalhar no mesmo lugar que ele e, logo em seguida, é acusado de estuprado e justiçado pelos pais das mesmas num desencadear de processos vingativos cujos efeitos dilaceradores vão além da honra de juízos imediatistas de valor moral. Viver em sociedade e, ao mesmo tempo, lidar com instintos naturais é algo bastante complicado!

Wesley PC>

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