sexta-feira, 25 de junho de 2010

DE COMO EU ENTENDO O PATRIOTISMO – II:

Ao ler as embalagens dos DVDs que eu comprei faz tempo, descobri que, num deles, havia como bônus um material simplesmente precioso: o documentário integral “Demônios e Maravilhas” (1987), dirigido e protagonizado por José Mojica Marins, em que este gênio singular de nosso cinema narra as diversas agruras que sofre a fim de realizar seus filmes de terror num ambiente industrial ditatorial que não entende – e muito menos valoriza – os seus intuitos. Nesse sentido, durante os 50 minutos de duração do documentário, acompanhamos o diretor enterrar seu pai, cair de uma escada e quebrar as costelas num dia que parecia ser a solução dos seus problemas, ser preso mais de uma vez, enfrentar o alcoolismo, sofrer um enfarto e, mais importante que tudo isso, estar sempre cercado por familiares, amigos e discípulos, aos quais agradece sem reserva através de sua narração empostada, sendo que, numa das reconstituições mais bonitas do filmes, vemos o amigo-técnico do realizador, de nome Satã, abraçar com força a mãe do mesmo enquanto ele jaz numa cama de hospital. Impossível não se emocionar diante de uma estória verídica como esta!

Em razão de não haver um mercado reconhecido de produção de horror no Brasil (não obstante haver, sim, um de consumo de produtos forâneos), José Mojica Marins foi vilmente marginalizado em seu próprio País, ao passo que gradualmente obtinha o reconhecimento merecido por parte de críticos franceses e do público norte-americano. No filme, inclusive, em que ele agradece também o apoio de celebridades importantes como Jairo Ferreira, Ozualdo Candeias, Glauber Rocha e Carlos Reichenbach, entre muitos outros, vemo-no colhendo os louros da boa acolhida de seu filme “Delírios de um Anormal” (1978), ao qual assisti antes de dormir. Horrível este filme, simplesmente horrível!

Produzido a partir do que chamou de “restos dos meus restos”, este filme é, na verdade, uma colagem pornográfica de cenas de impacto de seus filmes anteriores, com um fiapo (genial) de trama metalingüística em que um psicólogo é atormentado por pesadelos envolvendo Zé do Caixão e o rapto de sua noiva, de maneira que o próprio diretor José Mojica Marins é convocado para estudar o caso, de maneira que este é também perseguido oniricamente por seu personagem, o que redunda num infarto metonímico do que acontecera na vida real. Não é mais ou menos o que Wes Craven fizera ‘a posteriori’ no ótimo “O Novo Pesadelo – O Retorno de Freddy Krueger” (1994)? Até mesmo quando erra, José Mojica Marins acerta – e muito – em sua genialidade argumentativa. Por isso, tenho coragem em dizer que a culpa dos defeitos esvaziadores do filme devem-se muito mais a problemas e sabotagens executórias do que necessariamente à inventividade cadente do diretor-roteirista.

O que me faz voltar ao título da postagem, redigida num momento em que trabalhadores brasileiros ganham folgas em suas atividades empregatícias a fim de que possam assistir ao jogo de futebol envolvendo as seleções de Brasil e Portugal: enquanto a partida poderia ser entendida como uma metáfora esportiva para a nova configuração colonizatória que circunda a contemporaneidade, os espectadores contentam-se apenas em verem mais e mais dribles que redundem em gol. E, enquanto isso, gênios intelectuais como o de José Mojica Marins chafurdam na incompreensão popularesca concebida pelos detentores ideológicos da chamada Indústria Cultural. É o preço que se paga...

Wesley PC>

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