segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

CONFISSÃO (SUB?-)LITERÁRIA, COM ORGULHO!

Em 2001, quando soube do lançamento de um filme baseado na sensação literária do momento, um bruxinho inglês com cicatriz em forma de raio na testa, mantive-me indiferente à badalação e vi o filme do Chris Columbus por mera obrigação profissional, quando o mesmo me apareceu em VHS depois que a mãe de uma amiga locara-o por sugestão de entretenimento. À época, achei o filme vazio e nocivo em sua apologia disfuncional à magia, que representava pouco mais do que um bibelô diferencial para seus usuários. Protestei contra o seu sucesso e mantive-me indiferente, ao longo dos anos, aos demais filmes e livros relacionados ao personagem, até que me envolvi romanticamente com um garoto obcecado pelo personagem. Trocamos algumas carícias e, por convenção proto-namoratória, acompanhei-o ao cinema, em 2005, na sessão de estréia do quarto filme da série, onde trocamos abraços na fileira da frente, após os créditos finais, aos protestos dos pais de família que estiveram presentes.

O tempo passou, o garoto hoje me odeia e, por motivos vários, submeti-me este ano a uma revisão dos cinco filmes até então disponíveis com o personagem Harry Potter. Por sugestão de minha mãe, que aparentemente gosta dele, vi os cinco filmes na mesma semana. Odiei os dois primeiros exemplares (dirigidos pelo infantilizado Chris Columbus), me surpreendi drasticamente com o ótimo terceiro filme (dirigido pelo humano, demasiado humano Alfonso Cuarón), abominei o exemplar comandado pelo pusilânime britânico Mike Newell, e gostei da variação política de roteiro comandada pelo desconhecido David Yates. Queria, inclusive, ter visto o sexto filme da série, também dirigido por este último diretor em 2009, mas vários motivos me impediram de fazê-lo. Algo, porém, estava modificado: em virtude dos conselhos e elogios de amigos sergipanos, pernambucanos e espanhóis, agora eu não tinha tanto preconceito em relação ao personagem. Continuava sem gostar dele, mas já defendia a validade de sua existência ficcional.

Neste mês de dezembro, temporada de presentes, meu fornecedor habitual de vitaminas humanas ganhou, a contragosto, o último livro da série de sua madrinha católica. Chamado “Harry Potter e as Relíquias da Morte”, este livro fora publicado em 2007 pela autora J. K. Rowling e apresentava nada mais, nada menos que 590 páginas. Ainda assim, imbuído de estranha curiosidade, decidi-me a lê-lo. Quase duas semanas depois, eis-me aqui com algumas conclusões sobre o desfecho da saga do bruxinho, que será convertido em dois filmes a partir do ano que vem, aparentemente dirigidos pelo mesmo David Yates. Fiquei com vontade de ver o filme agora. Antes, o que achei do livro (com detalhes sobre o final):

Meu personagem preferido, desde o início, era Severo Snape, interpretado magnificamente por Alan Rickman nas versões cinematográficas. Era óbvia e reiterada a vilania do personagem, mas eu sempre torci por ele, enxergava algo de positivo em seu coração. Para minha total surpresa, estava certo: na penúltima página do livro, ele é chamado de “o homem mais corajoso que existiu” pelo protagonista crescido, o que me encheu de estranho orgulho, visto que me identifiquei com os motivos que engendraram o comportamento taciturno de Severo, um amor não-correspondido que o perseguia desde a infância. Mas, até que eu chegasse a este elogio, muita coisa se desenrola nas mais de 500 páginas anteriores. Como eu suportei ler um livro tão grosso a contragosto? Por que a autora insistia em atolar seu livro com clímaxes aventurescos, quando o que me interessava mesmo era a boa construção emocional dos personagens? Por que insistem em vender a trama como infantil se sangue e violência não pára de cercar as atitudes de todos eles? Vai entender os meandros do mercado literário e cinematográfico.

Minha conclusão é que o livro não é mal-escrito como eu pensava. Até que o vocabulário e os estratagemas ficcionais da autora são bons. O que não me convencia era o tom profético e auto-anunciado da trama, os preconceitos de classe velado entre os personagens [os comentários de Rony e dos filhos de Harry Potter, ao final, sobre os trouxas (humanos não-bruxos) e a casa Sonserina (associada ao mal anunciado) me irritaram deveras, provando que pouca coisa mudou nos 19 anos de elipse na trama] e o acúmulo de ações que poderiam ser mais enxutas, mas, confesso, um tanto orgulhoso por ter enfrentado a mim mesmo, o livro é interessante! Sendo assim, estou com vontade real de ver o filme, ao passo em que já me preparei para livrar-me dos possíveis vícios inoculados por esta infindável leitura: uma das obras-primas de Lima Barreto já me espera, ansiosa, na estante...

Wesley PC>

3 comentários:

Michelle disse...

Há tempos que não tenho tempo para ler seus textos com calma, Wesley. Hj a tarde pude ler alguns e lembrei o quanto eu gosto do que você escreve.

Minha história com Harry Potter começou mais ou menos como a sua. Minha mãe era fã dele e vivia me enchendo para eu ler os livros. Ela me venceu, eu li e me apaixonei.

No final de 2007 eu li "Crime e Castigo", depois, para acalmar a alma, li esse que ilustra seu post de hoje. :)

Beijos

Pseudokane3 disse...

(risos)

E eu sigo o caminho inverso...

Vou comer hoje CLARA DOS ANJOS e NOITES BRANCAS, do Dostoievsky, é o próximo... Será que o Daniel Radcliffe gosta de autores russos? (kkkk)

WPC>

Michelle disse...

Acho que estabelecemos uma perfeita sintonia: eu, vc, Dostoievski e Harry Potter! hahaha