sábado, 7 de novembro de 2009

HÁ UM GERME CONTINUADO NO CINEMA BRASILEIRO?

Hoje eu vi o filme brasileiro mais antigo a que tive acesso: “Brasa Dormida”, belo libelo romântico dirigido em 1928 pelo cineasta mineiro que tanto mereceu a reverência dos maiores gênios do nosso cinema, Humberto Mauro. A trama é simples: um órfão que perde seus últimos centavos numa corrida de cavalos consegue um emprego de gerente de usina de açúcar numa fazenda do interior do Rio de Janeiro. Apaixona-se pela filha do patrão, mas recebe em compensação o ódio do ex-gerente da mesma usina, despedido por conduta imprópria. Sem saber a origem paterna do órfão e recebendo constantes denúncias anônimas sobre o avanço do namoro de sua filha (escandaloso para a época), o industrial muda-se para a cidade, a fim de afastá-la do ex-estróina. Ela, porém, deixou florescer uma roseira, símbolo de seu amor, planta da qual o novo gerente recolhe uma belíssima flor, que será entregue no aniversário de sua amada. Enquanto ele está fora, porém, seu ciumento rival dinamita a usina, de maneira que as reações dos personagens levarão os mesmos a um arrebatamento que, como a narrativa exige, não será diversa de um final feliz. Pode parecer uma estória trivial, mas é um ótimo filme.

Vi-o ao lado de minha mãe, que estranhou um pouco o silêncio estrondoso do filme, mas logo se rendeu ao seu charme de 81 anos. Prestamos atenção ao excesso de loções cosméticas nos cabelos dos personagens, ao modo como o roteiro evita criminalizar o vício alcoólatra (num dito bastante espirituoso, um bêbado contumaz diz que “não bebe para alimentar o vício, mas sim para afogar as saudades da patroazinha”), empolgamo-nos em clímaxes envolvendo uma cobra numa árvore e uma queda num poço de melado quente e, ao final, encantamo-nos com a singeleza da saga romântica dos personagens. O saldo geral do filme foi deveras proveitoso, repito.

Comparando o filme com outras produções nacionais que venho privilegiando nos últimos dois dias e que pretendo levar a frente neste domingo (inclusive, aparecendo em Gomorra com outra produção encantada de Humberto Mauro debaixo dos braços), fiquei a me perguntar qual seria o traço mais caro aos diferentes filmes produzidos em nosso País, que, por uma agradável conveniência, é o lugar que amamos. Em breve, espero trazer uma resposta, visto que não são poucos os especialistas críticos que reclamam que o maior defeito do cinema do Brasil é justamente a ausência de um projeto de nação, ao contrário do que ocorre em outras cinematografias nacionais. Será que encontrarei uma resposta pós-germinativa? Enquanto não posso dizer que sim, louvo mais uma vez o talento e o pioneirismo do mestre Humberto Mauro!

Wesley PC>

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