segunda-feira, 27 de julho de 2009

“EU TRABALHO PARA ESQUECER A SOLIDÃO”!


A frase acima foi proferida por uma personagem que, tal como eu, tem na baixa receptividade de relacionamentos amorosos, o seu ponto fraco. Trata-se de alguém que respira no filme “Conto de Outono” (1998, de Eric Rohmer), a que acabo de assistir. Se me permitem, antes de voltar ao quanto este assunto me perturba, gostaria de tecer alguns comentários apaixonados sobre o filme.

Vamos lá: “Conto de Outono” é o último dos “Contos das Quatro Estações” de Eric Rohmer. Ao contrário de “Conto de Inverno” (1992, quase inverossímil) e “Conto de Verão” (1996, maravilhoso), não há um personagem central facilmente detectável. A narrativa é ainda mais fluída, subdividida em múltiplas sub-tramas românticas. E, confesso: cria que eu fosse desgostar dele. Enganei-me redondamente: é lindo!

Na primeira cena, mãe e filha acertam os preparativos para o casamento desta última, que comenta sobre um desentendimento que tivera com a melhor amiga de sua mãe. “Não quero guardar rancor”, disse ela. “Se tua amiga quiser me beijar, não virarei o rosto”. A amiga em questão vive solitária num vinhedo. Tem o cabelo crespo e esvoaçante, o que me fez identificar-me com ela de supetão, mesmo que eu não seja tunisiano que nem a mesma. Ela é viúva e tem dois filhos. Uma moça, que só pensa em dinheiro e parte antes do filme começar, e um rapaz, que possui uma inteligentíssima e linda namorada, ainda encantada por um professor de Filosofia com quem teve um caso e com quem agora deseja ser apenas amiga, não obstante ele insistir por contato físico. À medida que o filme se desenrola, a nora da mulher solitária do vinhedo tenta fazer com que esta se interesse romanticamente por seu professor, ao passo em que a melhor amiga da segunda põe um anúncio de jornal em busca de um homem. O final do filme, que, adianto é ambiguamente feliz, é absolutamente surpreendente, não obstante tudo ocorrer do jeito como os personagens anteviam. Estou aqui absolutamente encantando pelo filme, que tem tudo a ver com o modo como me sinto acerca deste assunto tão recorrente em minha vida que é a necessidade de amar alguém, para além das amizades verdadeiras. Falo em amor que manifesta também através da troca de carícias mais íntimas, quiçá de sexo!

Da mesma forma que acontece nos outros filmes rohmerianos a que venho tendo acesso desde a última semana, graças a um simpaticíssimo rapaz casado, toda a “ação” do filme é centrada em seus diálogos. Em alguns momentos, parece que o diretor esqueceu a câmera ligada e pediu apenas a seus atores/personagens que conversassem, falassem, falassem e falassem. Somos conduzidos à intimidade de todas aquelas pessoas e, assim, conduzimo-nos também a nossa própria intimidade. Nesse sentido, três eventos do dia de ontem, sábado, merecem destaque comparativo no que diz respeito às minhas reflexões: um evento matinal, um vespertino e um noturno.

- O evento matinal: fui obrigado a participar de uma palestra empregatícia sobre alcoolismo. O médico-palestrante, em dado momento, compara a paixão a uma doença. Sem saber, usou-me como exemplo para um mal-estar que, segundo ele e a OMS (Organização Mundial da Saúde) é patológico. “Pensar demais numa mesma pessoa é doentio!”, concluiu. Eu pensava naquele instante!

- O evento vespertino: depois de almoçar em companhia com um senhor gaúcho de 89 anos, que não me repreendeu por comer carne, conheci um garoto representante da beleza neoclássica. Qualquer pessoa se apaixonaria pro ele no ato, mas eu preferi ignorar qualquer suposto desejo. Pessoas bonitas daquela forma me parecem tão inacessíveis. Concentrei-me no trabalho que realizava naquele instante: ajudei alguém a terminar um artigo científico de pós-graduação em Administração. De que me adiantaria sonhar com amores impossíveis?

- O evento noturno: em companhia dos amigos relatados anteriormente, descobri que um deles estava namorando. Conhecera um cara através da Internet e, para além das evidências em contrário, apaixonara-se. Ele estuda Letras/Inglês na UFS. O rapaz é um advogado formado pela UNIT. Por alguns instantes, senti o que Ferreirinha chamaria de “inveja positiva”. Quis entrar num bate-papo virtual qualquer e imaginar que conheceria alguém apaixonável pela Internet. Mas, comigo, nada dá certo neste sentido. Desisti: o filme me salvou!

Bom, cá estou eu, às vésperas de adentrar a madrugada de segunda-feira, sozinho (todos em minha casa dormem), pensando na mesma pessoa (todos sabem quem é!), pensando também noutras pessoas (algumas delas sequer existem, não passam de desejos e projeções), e reclamando que, por não me achar feio nem desinteressante, não entendo (ou aceito) o porquê de eu me sentir tão mal nesta área afetiva. Isso me deixa triste, mas parece que é uma condição já característica de meu ser. Resta-me dormir, pois vou trabalhar cedo. Ainda me falta um filme de estação do ano do Eric Rohmer para ver: “Conto de Primavera” (1990), para o qual não consegui acondicionar legendas. Vê-lo-ei com som original em francês. Periga que eu não o entenda por completo, mas tenho certeza de que sentirei o que os personagens sentem. Estou me sentindo muito triste agora, mas, ao mesmo tempo, feliz por dispor de racionalidade para perceber isso e por imaginar que, em algum lugar do mundo, talvez nesse mesmo instante, alguém me lê e se preocupa comigo. Tomara. Boa noite de sono, Wesley de Castro!

Na foto, o diretor Eric Rohmer enquadrando a atriz Béatrice Romand.

Wesley PC>

Um comentário:

Anônimo disse...

Profundo esse Eric Rohmer, né? Parece ser daqueles que nos apaixonam. Acho que está lhe fazendo bem. E vocẽ sabe que existem pessoas que se preocupam com você.


Rafael Baba.