terça-feira, 23 de junho de 2009

QUANDO É IRRELEVANTE PERGUNTAR O QUE É APARÊNCIA E O QUE É ESSÊNCIA:


Acabo de ver a versão soderberghiana para o livro “Solaris”, de Stanislaw Lem, morto em 2006. O livro já havia sido adaptado para o cinema em 1972, numa obra-prima inesquecível de Andrei Tarkovsky, que beirava as três horas de duração. A versão de Steven Soderbergh, absolutamente dispensável e realizada em 2002, tem metade da duração e metade da qualidade. Por mais que seja um filme ideologicamente imperdoável, ele não é de todo ruim: não tem como se destruir a essência passional do livro!

Em termos bem gerais, a trama do livro pode ser resumida a um pretexto de ficção científica: um psicológico é enviado a uma base interplanetária, em que a tripulação parece se suicidar gradativamente depois que passam a ser alvo de queridas alucinações. Ao chegar, o psicólogo passa a sonhar com sua esposa morta, suicida, e, mesmo percebendo que ela não é “real”, insiste em ficar com ela, ao lado dela, consertar os erros do passado, começar de novo. Num resumo infinitésimo, isto é o que acontece no enredo do livro. Ao consumir entre gemidos de gozo a versão tarkovskiana, lembro que eu fiquei pensando o que levaria um cineasta tão refinado quanto ele a titubear sobre questionamentos românticos que tanto me atormentando enquanto vítima de uma adolescência sub-aproveitada. Ao consumir entre suspiros de enfado a versão soderberghiana, eu sabia que estes mesmos questionamentos tinham intentos amplamente comerciais, de maneira que me irritei deveras quando a personagem quase inverossímil, em seu comportamento de musa, de Natasha McElhone é questionada por seu amado George Clooney se o que eles estavam vivendo era real ou não, se tudo não passava de um sonho. Que diferença fazia naquele contexto? A aparência de verdade compartilhada talvez não fosse suficiente? Tal qual o personagem principal do filme original, acho que me submeteria de amável grado à ilusão.

O que me leva à foto utilizava como ilustração desta pseudo-indagação fenomenológica tola em sua emergência: no momento em pauta, um dos garotos brincava de simular cumplicidade, enquanto o outro cantarolava um trecho da canção “Black”, do Pearl Jam, que estava a ser executada naquele momento: “I know someday you'll have a beautiful life, I know you'll be a star in somebody else's sky, but... Why? Why? Why can't it be, can't it be mine?”. Em outras palavras: que diferença faz?

Wesley PC>

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