domingo, 21 de junho de 2009

A FALÁCIA DA GENTE SIMPLES (OU “O MUNDO DO TRABALHO TE SAÚDA”)


Ontem eu tive o privilégio de ver um filme co-produzido pelo Uruguai, mas este me causou muita raiva. Por mais que eu ficasse satisfeito em perceber mais um pólo expressivo de minha querida América Latina, o furor ideológico a que o roteiro dos diretores César Charlone e Enrique Fernández queria que aderíssemos me irritou deveras. Nome do filme: “O Banheiro do Papa” (2007).

Ainda no letreiro de abertura, lemos que os eventos mostrados na trama não foram reais por simples acaso, não obstante sua essência ser profundamente verdadeira. Estamos em 1988, na cidade de Melo, Uruguai. O papa João Paulo II visitará o local em breve. Beto (César Trancoso) é um contrabandista que mora com esposa e filha numa casa modesta. Realiza inúmeros planos para si mesmo e sua família, mas todos naufragam no mesmo impulso destrutivo capitalista que os geram. Um dia qualquer, desesperançado e percebendo que todos os seus vizinhos planejam ganhar dinheiro ao vender comida durante a passagem da comitiva papal, ele tem a idéia de construir um banheiro público, em que cobraria uma dada quantia para os fiéis que precisassem se aliviar fisiologicamente por ali. Envida esforços, dinheiro que não tem e atitudes desonestas para engendrar tal plano. Mas as pessoas que comparecem ao evento nem de longe correspondem às expectativas dos ambiciosos moradores da cidade. A voz renitente do fracasso estrebucha após os créditos finais. Não tenho pena deste tipo de personagem!

Utilizei um sinônimo corriqueiro de compaixão no parágrafo anterior porque parece ser este o sentimento que o filme quer despertar no espectador, dado que a perspectiva dominante é a do mentiroso protagonista, que, ainda assim, clama pela simpatia de quem o assiste. Não conseguiu a minha, que talvez, por outro lado, tenha me comovido com a frustração antecipada de sua filha, tadinha, que desejava ser locutora de telejornal. Mas a realidade e os elos indeléveis do comércio destruirão todo anseio que motive qualquer uma daquelas pessoas. Elas estarão sempre entregues à ciclotimia do capital desejoso, conforme podemos ver na discreta cena que surge após os créditos finais, que não descreverei em detalhes para não estragar o (des)prazer de quem talvez possa ver o filme, premiado em vários festivais de cinema sul-americano. Eu não gostei!

Coincidentemente ou não, depois de ver este filme, participei de uma festa junina com o pessoal do trabalho. Sabia que ia me incomodar com a festa (ia ter muito bicho morto torrado, músicas insuportáveis, forçação de barra integracionista), mas fui assim mesmo. Talvez fosse digno tentar. “Antes 1h15’ de atraso que a desistência”, pensava comigo mesmo, tentando me motivar, quando me irrito face à demora dos ônibus. Ao final, terminei sorrindo na festa. Dormi cedo, mas sorri. Foi bem mais que o filme resenhado conseguiu me causar!

Wesley PC>

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