quarta-feira, 1 de abril de 2009

A PAIXÃO DESENFREADA COMO BASE PARA O CINEMA DE HORROR NACIONAL (E PARA UMA DAS POSSÍVEIS "HISTÓRIAS DE MINHA VIDA"):


Destacando-se a louvável exceção do genial José Mojica Marins, o cinema de horror no Brasil é, infelizmente, um gênero ainda muito subestaimado, o que é uma pena, visto que a extrema quantidade de crendices nacionais poderia render interessantes estorietas assutadoras. Imaginemos, por exemplo, um filme sobre as matanças do Curupira ou do Neguinho do Pastoreio. Como faria alguns espectadores tremer (dentre eles, minha mãe, supersticiosa, que hoje me sugeriu colocar um dente de alho em meu bornal a fim de livrar-me dos maus olhados).

Pois bem, ouvindo recentemente um disco do Gilliard, que me me foi dado como técnica “para lembrar Marcos” (constava assim na dedicatória), encontrei o clássico musical “Coração Materno”, do amargurado gaúcho Vicente Celestino, que, a fim de lidar com a morte acidental de sua mãe enferma (que, ao que me conta, caiu numa fogueira) compôs a obra-prima que se segue:

“Disse um campônio à sua amada:
‘Minha idolatrada, diga o que quer
Por ti vou matar, vou roubar, embora tristezas me causes, mulher
Provar quero eu que te quero, venero teus olhos, teu corpo, e teu ser
Mas diga, tua ordem espero, por ti não importa matar ou morrer’.
E ela disse ao campônio, a brincar: ‘Se é verdade tua louca paixão
Parte já e pra mim vá buscar de tua mãe inteiro o coração’.


Passo 1 da estória: os equívocos desejados e cometidos por pessoas apaixonadas. Temo entrar nesse estágio. Por isso, ouvi a música com o coração na mão (no sentido metafórico do termo). Mas a canção vai em frente:


“E a correr o campônio partiu, como um raio na estrada sumiu
E sua amada qual louca ficou, a chorar na estrada tombou
Chega à choupana o campônio
Encontra a mãezinha ajoelhada a rezar
Rasga-lhe o peito o demônio
Tombando a velhinha aos pés do altar
Tira do peito sangrando da velha mãezinha o pobre coração
E volta à correr proclamando: ‘Vitória, vitória, tens minha paixão’”


Passo 2 da estória: os erros que cometemos em nome de uma idéia patológica de amor. Tenho que me vigiar o tempo inteiro, estou enlouquecendo, enlouquecendo...


“Mas em meio da estrada caiu, e na queda uma perna partiu
E à distância saltou-lhe da mão sobre a terra o pobre coração
Nesse instante uma voz ecoou: ‘Magoou-se, pobre filho meu?
Vem buscar-me filho, aqui estou, vem buscar-me que ainda sou teu!’”


Passo 3 da estória: a vingança da mãe amada, que, por mais que o objeto de teus nobres sentimentos aja com desprezo ou malevolência, perdoa, redime, dá uma nova oportunidade redentora. Como fiquei chocado ao ouvir esta preciosidade subestimada de nosso cancioneiro nacional. De repente, lembrei que já havia visto um excelente curta-metragem que adaptou com maestria tal saga: “Amor Só de Mãe” (2003), de Dennison Ramalho, um dos filmes mais crus que já vi nesta terra tupiniquim, não à toa produzido pelo inspirado cineasta Cláudio Assis.

A trama do filme é, literalmente, a mesma da canção: cegamente obcecado por uma esquisita mulher (misto de beldade sexual com entidade do candomblé), um homem devotado à sua solitária mãe, oferece o coração da mesma como definitivo sacríficio erótico. A mulher aceita e o homem assassina cruelmente a sua genitora, que, em dado momento, volta para reivinidciar o seu amor. Recomendo demais este filme, o qual tive o orgulho de ver numa tela grande, numa sessão permeada por admoestações preventivas. Espero que eu não chegue a cometer os mesmos erros sedutores do protagonista. Amo a minha mãe Rosane e quero-a a meu lado se um dia obtiver êxito em qualquer uma de minhas frustradas ambições amorosas...

Wesley PC>

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