domingo, 19 de abril de 2009

“LA GUERRA ME AY STRUPATTO TANTO BENE”...


Desde o fim da II Guerra Mundial que a Republica Socialista Federativa da Iugoslávia era constituída pela união de seis repúblicas: Sérvia, Croácia, Montenegro, Eslovênia, Bósnia-Herzegóvina e Macedônia. No início da década de 1990, estas regiões passaram a exigir desmembramentos, em virtudes de preconceitos étnicos, o que desencadeou uma série de violentos conflitos bélicos, que se estenderam pela década seguinte, esta em que agora vivemos. Lembro que, ao consultar atlas geográficos, por volta de meus 10 anos de idade, ficava fascinado com estes países de ascendência eslava e/ou muçulmana, que me encantara por suas culturas ciganas, de maneira que, hoje, o músico Goran Bregovic e o cineasta Emir Kusturica são alguns de meus artistas favoritos, não coincidentemente advindos das regiões que antigamente compunham a sedutora Iugoslávia. Cheguei, inclusive, a torcer pela seleção da Croácia na Copa do Mundo de 1998 (eu, que detesto futebol!). Algo sem precedentes me atraía naquela seleção de jogadores que viram membros de sua família serem mortos por antigos amigos e vizinhos, que tiveram que pegar em armas para matar conhecidos por uma causa sem sentido, por causa de uma higiene étnica absurda (pretendida, dentre outros fatores, pelas idiossincrasias políticas da maioria sérvia), e, assim, em meio a conflitos, conseguiram chegar ao terceiro lugar nesta competição mundial de futebol. Como aquilo me marcou! Cheguei a gravar a execução do Hino da Croácia em VHS e possuía algumas bandeirinhas deste País coladas em meu armário de bugigangas, bem como a imagem de um cadáver bósnio em decomposição colado no meu caderno escolar...

Ansiando por bons filmes, oriundos de países exóticos, reassisti ontem ao filme iugoslavo “Bela Aldeia, Bela Chama” (1996), do diretor sérvio Srdjan Dragojevic, e, por mais que eu tenha gargalhado em diversas seqüências deste filme absolutamente cínico e capaz de fazer sarcasmo em torno de um tema tão cruel, um nó atravessou a minha garganta após a sessão, um nó que continua lá enganchado, tamanho o horror que presenciei na tela, por pouco mais de 120 minutos de duração. A trama do filme, filmado em regiões muito próximas a violentos bombardeios, é direta e simples: dois amigos de infância, um sérvio e outro muçulmano, se vêem em lados opostos de uma ridícula batalha. Encurralados num túnel, sem água e sem comida, as tropas do primeiro são oprimidas pelas bombas e chacotas do segundo. Humilhações e juras de ódio são trocadas de ambos os lados: “por que tu incendiaste a minha oficina?”, pergunta um. “Por que tu mataste a minha mãe”, pergunta o outro em resposta. Nenhum dos dois fizera o que fizera porque queriam. Foram vítimas de “um bicho-papão” que os assombrava desde meninos, ainda inocentes, quando se divertiam observando casais que transavam ao ar livre ou fugindo da escola para compararem seus pênis (circuncidado num caso e no outro não). Não obstante ser um filme extremamente violento, o senso de humor de “Bela Aldeia, Bela Chama” é intenso, nos faz engolir seco, como, por exemplo, na seca em que, ao oferecer urina a uma jornalista norte-americana tomada como refém, um soldado tenta consola-la dizendo que é Coca-Cola ‘diet’. Sinceramente, ainda estou com o tal nó apertando minha garganta...

Na foto, solados da antiga Iugoslávia, divertindo-se em meio à violência, num contexto em que piadas como esta são contadas: “uma muçulmana passeava com um macaco. Alguém chega e pergunta: ‘é teu?’. Ela responde: ‘é de um soldado da ONU’. O interlocutor contra-argumenta: ‘e por que tu não fizeste um aborto?’”. E eu ainda tive a cara-de-pau de sorrir!

Wesley PC>

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