quarta-feira, 1 de abril de 2009

“DESERTO FELIZ” (2007) Direção: Paulo Caldas.


Cena 1: uma moça é enquadrada em primeiro plano, com um olhar esperançoso, ao som de uma melodia instrumental cativante. Atrás dela, desfocado, um homem deitado sem camisa.

[Título do filme]

Cena 2: alguns homens perseguem, aprisionam e capturam um tatu.

Cena 3: filmada em câmera grande-angular, uma mulher assa algum tipo de carne, que mais tarde sabemos ser de bode.

Cena 4: mãe, filha e padrasto sentados à mesa. Prato do dia: cuscuz com carne de bode. A mãe pergunta à filha o porquê de sua expressão desenxabida. Esta apenas responde: “não agüento mais”. Torna-se prostituta.

Assim começa o filme que intitula esta postagem e, infelizmente, assim mesmo ele se desenvolve, justapondo seqüências que não se tornam efetivamente coesas, não obstante chamarem a atenção do espectador por causa da autenticidade de alguns diálogos. Porém, muitas das situações apresentadas não são desenvolvidas a contento e o roteiro se revela uma ode ao desperdício, em especial quando um grupo de turistas alemães entra em cena (de forma muito forçada, conversando sobre o impacto negativo para o turismo daquelas recorrentes placas alertando para o perigo de tubarões nas praias recifenses). Além disso, soam desperdiçadas as participações de Zezé Motta e Hermila Guedes, que, servindo de coadjuvantes para a medianamente expressiva (mas agradável) Nash Laila, pronunciam algumas frases-feitas sobre prostituição que se tornam esquecíveis não pro serem banais (ao contrário, aliás), mas justamente por causa da pletora de filmes recentes sobre o tema.

Porém, apesar de insosso, “Deserto Feliz” não se torna desagradável, salvo pela má presença dos mencionados turistas alemães (há uma cena de consumo de cocaína seguida de sexo que beira o patético, no mau sentido do termo), pela desnecessária exposição do cotidiano e posterior prisão de alguns traficantes de animais silvestres e pela supra-aludida e precipitada justaposição de técnicas cinematográficas dissonantes, que parecem suprir mais os delírios pseudo-experimentais do diretor que as necessidades específicas da trama.

Mas o filme segue em frente. A personagem principal é um tanto mimada, mas não reclama de sua vida prostituída (até porque, tem a sorte de arrumar um marido alemão e “muda de vida”, indo morar na Europa), o que faz com que, assim, ela ganhe a nossa simpatia. A trilha sonora usa muito bem temas populares de massa e, para este que agora escreve estas linhas, prazer de acompanhar o filme foi interessante por ele poder reconhecer muitos dos lugares em que esteve quando de sua recente estada na capital de Sergipe, em especial no que se refere a um dos cenários principais do filme, o Hotel Holiday, habitado prioritariamente por “mulheres da vida”, mas cuja arquitetura imensa é, no mínimo, estonteante (vide fotografia abaixo), um convite explícito à doce perdição...

Por que estou escrevendo sobre este filme aqui? Porque ele está em exibição numa sala de cinema aracajuana e, para além de seus julgamentos de valor não de todo entusiasmantes, merece ser conferido por quem se dispõe a acompanhar os caminhos e descaminhos da produção cinematográfica brasileira contemporânea. E segue a letra da simpática canção “À Deriva”, executada N vezes no filme (e que Rafael Coelho já conhecia através duma interpretação do grupo Aviões do Forró - sic), que gruda na cabeça do público após a sessão, inclusive por assemelhar-se deveras à anti-clássicos executados por criaturas como Latino e KLB, para ficar em exemplos bastante rasos:

“Nós dois estamos perdidos
Em um barco sem destino
Náufrago de amor proibido
Atracados pelos mares da paixão
Perdidos, em um barco à deriva
Alma gêmeas de uma vida
Esperando de uma vez a nossa terra prometida”


E, em virtude da magnânima condição de audiência da obra em pauta, reservo-me ao luxo de plagiar, com intentos pessoais, um dos trechos do refrão climático da canção:

“Pois todo azul do mar dei a ti
Eu sempre esperei querer esse amor
Porque contigo, eu sou feliz
Contigo, eu sou feliz”.


Repetindo: Contigo, eu sou feliz!

Wesley PC>

2 comentários:

Rafael Maurício disse...

"perdido, em um barco sem destino", muito bom, oh o prédio aí, quer dizer q vc foi fzer uma boquinha lá né?

Anônimo disse...

o holiday é um prédio residencial, não um hotel, e fica em recife, não em aracaju.