domingo, 19 de abril de 2009

A ARTE DE SER FÚTIL E OS JOGOS ELETRÔNICOS


Nunca gostei de jogos eletrônicos. Salvo uma ou duas exceções, sempre me incomodei com o aspecto irrestritamente competitivo destes jogos, de maneira que, desde pequeno, fugi aos padrões de homogeneidade heterossexualizante vinculados aos fliperamas e/ou casas de aluguéis de jogos [onde, fiquei sabendo a posteriori, rolava muita chantagem (homo-)sexual envolvendo dívidas de adolescentes]. Porém, um dos garotos que me consolam em momento de angústia extrema é viciado neste tipo de jogo, em especial naqueles que são gratuitamente violentos. E, a fim de agradá-lo e termos algo comunal para conversar após a esperada proto-foda de domingo à noite, assenti em ver “Max Payne” (2008, de John Moore), filme baseado num famoso ‘vídeo game’ juvenil.

Protagonizado pelo sensual e sisudo Mark Wahlberg, o filme até que não é ruim. Descontando-se as típicas invenções morais e os clichês detetivescos do roteiro, até que dá para curtir legal o filme, desde que consigamos esquecer que ele é um plagio enviesado de “Constantine” (2005, de Francis Lawrence). Mas, sigamos em frente: o protagonista do filme é um detetive especializado em casos arquivados sem resolução, desde que sua esposa e seu filho pequeno foram misteriosamente assassinados. O curioso no caso é que os assassinos da família de Max Payne não roubaram nada de sua rica casa, o que o levou a desconfiar de uma trama mais complexa, que mais tarde revelará a conexão com a indústria farmacêutica em que a esposa do detetive trabalhava, cooptada para desenvolver uma droga ultra-viciosa, de nome Valquíria, que fazia menção aos demônios nórdicos que protegiam os guerreiros gloriosamente mortos em atos de violência. Como costuma acontecer nesse tipo de trama, policiais e demais agentes públicos de caráter aparentemente incorruptível (e amigos do protagonista) revelam-se corruptos. E, evidentemente, todos serão devidamente vingados pela fúria justiceira e letal do protagonista.

Não darei muitos detalhes a trama daqui por diante, mas um detalhe cada vez mais comum neste tipo de filme me chamou particularmente a atenção, algo que batizarei de “homeopatia hipetrofiada da sagacidade inimiga”, muito comum em filmes de ficção científica contemporâneos, em que as máquinas são mostradas como inimigas dos seres humanos, mas os espectadores vão ao cinema para se divertirem justamente com as pirotecnias maquinárias destas produções [vide o sucesso de “Matrix Reloaded” (2003) em detrimento de “Matrix Revolutions” (2003), dos irmãos Andy & Larry Wachowski, em que o dilema hipnose tecnológica X sobrevivência humanitária foca mais patente]. Pois então, no filme ora comentado, o verdadeiro inimigo do protagonista é a droga Valquíria, mas, num momento em que ameaça ser morto, é ao ingerir tal droga que ele consegue sobreviver e exterminar todos os seus inimigos (e ainda ser inocentado e encontrar uma paz angélica ao final!). Para os produtores e espectadores típicos desse tipo de obra, isto não é uma contradição, mas sim um mero efeito subliminar da hipertrófica batizada acima. Não me convence, obviamente!

Mas, volto a dizer: o filme é bem narrado e, dentre outras virtudes elementares, possui o talentoso músico Marco Beltrami como responsável pelo acento nos climas de tensão, o que consegue especialmente na ótima cena em que, ao invadirem a casa de um viciado moribundo, um ‘travelling’ acompanha desde a ameaça armada de Max Payne ao desorientado viciado até o momento em que ele cai do parapeito de uma janela, puxado por uma alucinação demoníaca alada. Não sei se é o tipo de filme que eu recomendaria aqui, mas, se tu fores fazer sexo oral em alguém que viva num universo radicalmente distinto do teu (um tipificado heterossexual proletário de periferia), “Max Payne” é algo que farás bem em conferir antes...

Wesley PC>

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